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Terapia Racional Emotiva

Mar 28th, 2019
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  2. T.R.E.
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  5. Terapia Racional Emotiva
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  7. REI BEBÊ
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  9. O Dr. Harry Tiebout utilizou as palavras “Sua Majestade o Rei Bebê”, do psicanalista Sigmund Freud, para descrever uma atitude inata. O termo Rei Bebê poderia ser de uma forma igualmente adequada Rainha Bebê porque provavelmente todas nós temos este ego infantil no nosso inconsciente.
  10. Os adictos têm de estar particularmente conscientes das características do Rei Bebê, pois nossas atitudes e comportamentos podem interferir na sua recuperação.
  11. Nos nossos programas dos 12 Passos, sentimos frequentemente a necessidade da rendição e tentamos praticá-la – orientar nossa vida e nossa vontade para Deus. Temos os “slogans” que realçam a necessidade do Terceiro Passo e as suas recompensas: Entrega-te, deixa Deus. Entregar resulta.
  12. O reconhecimento da impotência é a base da rendição, mas o ato da rendição surge com a aceitação total dessa impotência. Muitos de nós, que sentem dificuldades com o Primeiro Passo, até são capazes de reconhecer a sua impotência, mas não está disposto a aceitá-la. Em outras palavras, somos capazes de vê-la e compreendê-la, mas a nossa necessidade de controle, nos impede de nos comprometer com este ato de rendição que é tão necessário. Os nossos egos interferem.
  13. A nossa mentalidade de Reis Bebês:
  14. 1 – Ficam muitas vezes irritados com as pessoas que representam a autoridade ou com receio delas, e tentam coloca-las umas contra as outras de modo a conseguirem o que querem.
  15. 2 – Procuram aprovação e frequentemente perdem a sua própria identidade no decorrer do processo.
  16. 3 – São capazes de causar uma boa primeira impressão, mas incapazes de mantê-la.
  17. 4 – Tem dificuldade em aceitar críticas pessoais e sentem-se ameaçados e irados quando são criticados.
  18. 5 – Tem personalidades adictivas e deixam-se levar a extremos.
  19. 6 – Não se aceitam ou se alienam de si próprios.
  20. 7 – Ficam muitas vezes imobilizados pela ira e frustração e raramente estão satisfeitos.
  21. 8 – Sentem-se geralmente sozinhos, mesmo quando rodeados de pessoas.
  22. 9 – Estão sempre se queixando e culpam os outros do que lhes acontece de mal na vida.
  23. 10 – Sentem que não são apreciados e que não pertencem.
  24. 11 – Veem o mundo como uma selva cheia de pessoas egoístas que não estão disponíveis para eles.
  25. 12 – Encaram tudo como catástrofe, como uma situação de vida ou de morte.
  26. 13 – Julgam a vida em termos absolutos: preto ou branco, certo ou errado.
  27. 14 – Vivem no passado, ao mesmo tempo em que receiam o futuro.
  28. 15 – Tem fortes sentimentos de dependência e um medo exagerado do abandono.
  29. 16 – Tem medo do insucesso e da rejeição e não tentam fazer coisas novas em que possam vir a falhar.
  30. 17 – Tem a obsessão do dinheiro e das coisas materiais.
  31. 18 – Sonham com planos e esquemas grandiosos e tem pouca capacidade de fazer com que eles aconteçam.
  32. 19 – Não podem tolerar a doença neles ou nas outras pessoas.
  33. 20 – Preferem agradar aos superiores e intimidar os subordinados.
  34. 21 – Acham que as regras e as leis são para os outros e não para eles próprios.
  35. 22 – Tornam-se frequentemente adictos da excitação e de uma vida de frenesi.
  36. 23 – Guardam para si as emoções dolorosas e perdem o contato com seus sentimentos.
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  51. A CRIANÇA ASSUSTADA E O REI BEBÊ
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  53. Muitos adictos têm dentro de si uma menina ou um rapaz assustado, solitário (a) ne envergonhado(a) que murmura contra si mesmo pensamentos derrotistas, baseados numa vida inteira de mensagens negativas. Constantemente se comparam aos outros e sentem que não estão à
  54. altura deles. Estes sentimentos de falta de valor próprio, de culpa, e de não pertencer, estão no núcleo central das nossas personalidades. O Rei Bebê é egoísta e exigente – emerge como reação a estes sentimentos de vergonha e inadequação.
  55. Ao lutarmos de forma infantil para sermos aceitos e agradarmos aos outros, começamos a procurar coisas exteriores para nos sentirmos melhor por dentro. Vestuário de alta costura, carros de corrida, namoradas ou namorados, giros, drogas e a excitação de uma vida frenética ajudam a acalmar o nosso sofrimento. Criamos uma aparência atrativa, magnética, encantadora para conseguirmos o que queremos. Usamos expediente como a procura do prazer, a procura do poder e a procura de atenção para encher o vazio, mas o vazio se mantém. Não há amor, status, dinheiro ou fama que cheguem para a criança assustada que existe em nós.
  56. Considerando tudo isto como uma fraqueza, a parte de nós que corresponde ao Rei Bebê tentará destruir, atacar e por de lado a nossa criancinha assustada. Ao negar estes sentimentos, o Rei Bebê encobre, em última análise, o fato de a criancinha assustada existir.
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  58. A LUTA INTERIOR
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  60. Compreender o Rei Bebê é difícil porque as coisas nunca são aquilo que apresentam ser na superfície. Existem dois fatores principais de motivação:
  61. A criança assustada, solitária, que não quer ser mais magoada.
  62. O Rei bebê que nunca está totalmente satisfeito.
  63. Quando a criança receosa que existe em nós ouve a palavra NÃO, uma mensagem interior nos diz que somos maus. Nos sentimos amados quando somos acariciados e não amados quando nos corrigem ou nos cobram mudanças. Quando somos criticados, a nossa imaturidade insiste no direito de fazermos o que entendemos e argumenta que, se somos amados, os outros devem nos deixar fazer o que queremos. Muitas vezes, as nossas manipulações aparentam que tivemos alguns “ganhos”.
  64. Ambas estas facetas, da criança medrosa e o Rei Bebê exigente, ficam temporariamente satisfeitas se criarmos a pessoa que pensamos que os outros querem que sejamos. No entanto, a base para uma recuperação duradoura será a criança assustada readquirir o sentimento do próprio valor e aprender a controlar os comportamentos do Rei Bebê.
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  66. O PROBLEMA
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  68. As pessoas em recuperação têm geralmente consciência das muitas ameaças que está sujeita para conseguir sua sobriedade. Os programas de 12 Passos são concebidos para nos ajudar a enfrentar e ultrapassar os nossos defeitos de caráter. A imaturidade, que constitui um problema para muitos de nós, é um reduto do Rei Bebê em cada um de nós. Poderá ser necessário reconhecermos este defeito e ultrapassado se quisermos continuar nossa recuperação.
  69. O Rei Bebê em nós diz que temos razão, ou seja, os outros estão errados. Muitos de nós defendemos a nossa razão em todo e qualquer lado onde nos tenhamos sentido ameaçados.
  70. Os Reis bebês atuam muitas vezes como se fossem o seu próprio Poder Superior, tomando decisões baseadas nos seus juízos em relação a si mesmo e aos outros. O Rei Bebê que existe em nós diz-nos que deveríamos ser capazes de ser bem sucedido em tudo o que empreendemos. Existe em nós o sentimento de sermos destinados a grandeza.
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  78. O MITO DO REI BEBÊ
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  80. A mentalidade de Rei Bebê é comandada por três motivações: poder, atenção e prazer. Tentamos arranjar amigos sendo excessivamente simpáticos e amáveis. Podemos nos agarrar as pessoas. Tentamos frequentemente controlar ou dominar. Colocamos condições que quase tudo que fazem, usemos como situações de dívida para conosco. Receamos que o nosso verdadeiro eu fosse
  81. rejeitado, por isso apresentamos ao mundo uma pessoa falsa e inventada. Isto nos protege de sermos magoados. Cada uma das personalidades ou jogos que inventamos tem por base uma falsa promessa ou um mito.
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  83. CONQUISTADOR
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  85. Mito – Sou irresistível para o sexo oposto. Parte da minha capacidade de atração vem da sedução agressiva e da minha carência crônica que desperta sentimentos adversos nos outros, que querem nos salvar ou cuidar de nós. Espera sempre o amor, atenção, riqueza e poder em troca do privilégio da nossa companhia.
  86. Verdade – Estamos metidos numa competição feroz para ocupar o centro do palco e somos incapazes de nos comprometer numa relação. O jogo acaba quando os outros tomam consciência da frivolidade do conquistador (a).
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  88. A PESSOA BONITA
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  90. Mito – Juventude, um corpo bonito e uma cara carente são as qualidades essenciais para eu ser amado e aceito.
  91. Verdade – Tentamos firmar apenas a custa das aparências. O jogo acaba quando os outros se fartam da criança que exige que lhe confirmem constantemente a sua capacidade de atrair.
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  93. O SIMPÁTICO
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  95. Mito – Se eu for simpático e amável para com todas as pessoas, elas gostarão de mim.
  96. Verdade – O nosso medo da rejeição nos leva a procurar a aprovação constante de todas as pessoas. O fim do jogo acontece quando verificamos que não podemos agradar a todos ou quando os outros se cansam da fraqueza das nossas atitudes.
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  98. O REBELDE
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  100. Mito – Tenho que fazer as coisas a minha vontade, senão... As regras são para as outras pessoas. Se me disser para não fazer uma coisa, é como se agitasse uma bandeira vermelha na minha cara e me desafiasse a fazê-la.
  101. Verdade – Nós os rebeldes, ficamos geralmente com as consequências ou o castigo que merecemos ou que pedimos. O fim do jogo vem, quando nos aborrecemos de pagar o preço que o fora da lei tem de pagar e somente ai abandonamos este comportamento.
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  103. O MÁRTIR
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  105. Mito – Mereço sofrer. Eu não conto com ninguém; ninguém me compreende. Pobre de mim. Considera a sua piedade como uma expressão de amor.
  106. Verdade – Confundimos amor com piedade e pensamos que sacrificando, nos protegemos do abandono. O jogo acaba quando nos cansamos de sofrer e compreendemos que merecemos mais do que isso.
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  112. A PESSOA QUE NÃO PARTICIPA
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  114. Mito – Se não jogar o mesmo jogo que eu, recuso-me a jogar.
  115. Verdade – Paralisados pelo medo de insucesso e da rejeição, não empreendemos nada e sentimos que o mundo tem uma dívida para conosco. Temos tão pouca coragem e tanto pessimismo
  116. que desistimos antes mesmo de começar. Temos tão pouca coragem e tanto pessimismo que desistimos antes mesmo de começar. O fim do jogo se dá quando os outros se cansam de não receber nada em troca.
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  118. O CÍRCULO VICIOSO
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  120. Todos estes jogos começaram com alguma esperança de sucesso, mas escorregaram para a frustração e o fracasso. Uma vida de Rei Bebê acaba por tornar-se uma situação extrema de altos e baixos. O recomeço é sempre seguido de desfechos dolorosos. Estes bebês tornam-se adictos de emoção que o sucesso traz e, mais importante ainda, adictos também à dor do insucesso.
  121. Os Reis Bebês não podem suportar o aborrecimento que advém das coisas correrem bem demais e criam situações de crise ou de confusão. Uma vida de agitação disfarça os problemas e diminui a sua responsabilidade pelos fracassos.
  122. O caos impede os mesmos de observar como a sua autoestima está em constante diminuição. O fato de ter acabado a graça destes jogos dilui-se na total ausência de quaisquer sentimentos. É previsível que a personalidade do Rei Bebê irá se tornar dependente de qualquer coisa. É só uma questão de tempo.
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  124. A COMBINAÇÃO FATAL
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  126. Agarrada a uma vida de excesso e sujeita a sentimentos de pouca autoestima, uma pessoa imatura tem uma vida frustrante e pouco compensadora, mas não necessariamente desgraçada. Mas qualquer coisa acontece a um adicto quando o estilo de vida do Rei Bebê e a pouca autoestima se combinam com a experiência de ficar em uso. Este “qualquer coisa” pode ser uma combinação fatal. Aqueles sentimentos calorosos, agradáveis e confiantes da infância, aquilo que procuramos a vida toda. É de novo alcançado. O efeito reconfortante e anulador do medo que o químico oferece, corresponde exatamente àquilo que os nossos egos de Rei Bebê têm procurado. Quando a relação de amor com o uso toma conta de nós, todos os aspectos de nossa vida escorregam progressivamente para um comportamento mais excessivo e imaturo.
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  128. O CATALISADOR
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  130. O sistema de defesa do Rei Bebê, quase negando qualquer problema, já se encontra bem definido e acelera a queda do adicto para o fundo. O inimigo está dentro de nós, e o uso da droga libera as nossas frustrações, raivas, ressentimentos, medo e dúvidas reprimidas, como um foguete que decola para a lua. Regressa a sensação maravilhosa do útero, e o bebê anda radiante por dentro e por fora, excitado e confiante com a descoberta desta euforia.
  131. O ego torna-se um doido furioso, exigindo ser constantemente alimentado através de uma série de diversões e excitações que nos atiram a alta velocidade para o aumento progressivo da adicção. Rapidamente nos tornamos adictos e atingimos o fundo em metade do tempo que levou aos que nos antecederam.
  132. Cego pela maravilhosa sensação desta euforia perfeita, o bebê que existe em nós, anula a parte daquilo que resta da sua consciência e sistema de valores. Dispondo de todo um sistema incorporado de persianas, tampões para os ouvidos e visão estrita ao serviço de um sistema de
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  139. engano e negação. Somos capazes de nos manter completamente ignorantes a respeito do estado a que chegamos.
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  141. FARTO DE ESTAR FARTO
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  143. Exausto devido a um estilo de vida que exige tudo às pressas, planejado para ganhar, tentando freneticamente levar a melhor, temendo as consequências e os desfechos e pretendendo ser tudo, para todos; o Rei bebê que existe em nós acaba muitas vezes por fazer uma travagem brusca.
  144. Quando o enjoo e o pânico provocados pela sensação de se ter um nó no estômago se tornam num medo devastador e num terror que nos consome totalmente, batemos no fundo. O bebê não pode imaginar a vida sem químicos e tem medo de continuar indefinidamente nesta corrida feroz que nunca mais acaba. Amarrado ao modelo deste comportamento que se repete e não tentando nunca qualquer coisa diferente, o Rei Bebê está demasiadamente paralisado pelo medo para que possa enfrentar o dia seguinte. A recuperação pode ser adiada pelo ego imaturo que continua a insistir que tem razão.
  145. - “Posso fazer seja o que for. Não preciso de ajuda”. O “tempo certo” é muito importante, porque agora o bebê está vulnerável e pode ser ajudado.
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  147. ADMITIR A DERROTA, ENCARAR A REALIDADE
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  149. Admitir que à nossa maneira não resultasse em enfrentar o fracasso, abrirá as portas a um mundo de sofrimento. No espaço de um instante, o nosso Rei Bebê passará da necessidade de ajuda, ao sentimento de desespero, de ser otimista a achar que não podemos mudar. Ficaremos atolados no pântano do nosso desespero esperando ser salvos, enquanto exigimos um certificado de garantia para o sucesso antes de enfrentarmos os nossos medos começamos a abrir. Nesta altura, podemos aceitar a mão dos AA ou NA vindos ao nosso encontro através de outro Rei Bebê alcoólico ou drogado, que nos assegura que os 12 passos funcionam. Antes de fazer o 1º Passo, o Rei Bebê precisa confiar em que “se os outros são capazes, eu também sou”.
  150. A forma de escapar à ratoeira do Rei Bebê pensa: “Eu não sou capaz, nós somos capazes”. Render-se ao estilo de vida do chamado 12 Passos pode dominar o poder do Rei Bebê e pode nos ajudar a encontrar um Poder Superior que trabalhe para nós.
  151. Podemos aprender o verdadeiro sentido do perdão, da humildade e da gratidão. Podemos aprender a evitar as armadilhas do Rei Bebê e a sintonizar nossos pensamentos para a realização dos 12 Passos. Podemos aprender a nos divertir outra vez, ao mesmo tempo em que adquirimos uma compreensão nova e mais profunda da vida.
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  153. CURAR A NOSSA CRIANCINHA ASSUSTADA
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  155. Servindo-nos de todo amor e apoio do nosso grupo dos 12 Passos, teremos de empreender uma viagem interior a fim de encontrar aquela parte de nós, o “mau” rapazinho assustado ou a “má” menina assustada, que tanto tempo ignoramos. Podemos imaginar nos entrando no quarto dele ou dela e vendo a criança agachada a chorar num canto. Podemos tornar-nos pais amorosos e carinhosos dessa criança que existe dentro de cada um de nós. Como qualquer pai faria, encorajamos a criança a aproximar-se, sentar perto de nós e explicar o que está acontecendo de mal. Então, ao pegarmos essa criancinha e dizer “está tudo bem” e, carinhosamente, limparmos suas lágrimas, faz com que esta saiba que é amada, que é um belo ser humano e que está em segurança.
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  165. OS CUIDADOS DENTRO DOS AA NA
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  167. Existe dentro do grupo dos 12 Passos, um sentimento de ternura, calor e segurança que vai ao encontro dos recém-chegados com a mensagem “é amado só porque existe, e eu vou gostar de você antes mesmo de se tornar merecedor de seres amado”. Esta é a promessa dos AA e NA, amor incondicional, a única coisa que se espera é um desejo sincero de parar de beber ou de usar. Isto
  168. corresponde ao ventre acolhedor e aconchegado que atenda os 12 Passos. É uma genuína e está em nítido contraste com a falsa segurança do álcool ou da droga.
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  170. AMAR A SI PRÓPRIO
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  172. Lentamente, o bebê em recuperação começa a adquirir o respeito por si próprio através dos 12 Passos. É um trabalho difícil de mudar completamente a vida da pessoa, mas os AA ou NA estão sempre presentes como guias. Através destes programas, começa a florescer e a consciência da dignidade pessoa. Nasce através da descoberta, disciplina, perdão e aceitação da própria pessoa. Gradualmente, a criancinha medrosa aproveita a oportunidade de desenvolver amor por si.
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  174. AMAR DE SER AMADO
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  176. Não faz mal se as pessoas no nosso grupo dos 12 Passos não gostarem de nós antes de nós gostarmos mais de nós próprios. O que importa é que agora gostamos mais de nós. Gradualmente, haveremos de explorar e descobrir todas as qualidades maravilhosas que possuímos.
  177. Para um padrinho é muito gratificante observar o afilhado descobrindo os seus talentos maravilhosos e únicos. Cada um aprende com o outro, enquanto atravessam as provas do começo da sobriedade. Os padrinhos fazem isto para conseguirem ficar sóbrios, mas, ao fazerem isto, reforçam tudo o que aprenderam. Observar o recém-chegado a regressar a vida é uma emoção que constitui recompensas suficientes.
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  179. LIBERDADE
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  181. Voltar à vida com o sentimento de nossa dignidade e ficar ligados a um padrinho, preparando-nos para a próxima fase.
  182. A nossa imaturidade obriga-nos a passar a vida buscando no exterior uma satisfação para nos sentirmos bem por dentro. Para recuperar o poder para nos tornarmos PESSOA, o primeiro passo é admitir nossa impotência em relação aos outros. Todos nós precisamos assumir a responsabilidade pelo nosso próprio valor e dignidade, o nosso valor próprio não depende do que os outros dizem ou fazem, mas como reagimos diante daquilo que os outros dizem ou fazem. Existem escolhas quanto à forma de como reagir. Reagir com medo, raiva ou ressentimento leva a pessoa a sentir que não tem valor. Aceitar o fato de que nem todos irão estar de acordo conosco, e talvez nem mesmo gostar de nós, é realista.
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  184. RENDIÇÃO: SER DEUS OU ACREDITAR EM DEUS
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  186. É um grande alívio já não nos sentirmos obrigados e tentar governar todo o universo. Na rendição, devolvemos essa tarefa a um Poder Superior que, por seu turno, enche as nossas almas com o calor, o conforto e a serenidade que há tempo procuramos. Uma vez mais, isto é semelhante ao que sentimos no útero.
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  195. ANTES DA RENDIÇÃO DEPOIS DA RENDIÇÃO
  196. Frustrado Em segurança
  197. Zangado Protegido
  198. Tenso Descontraído
  199. Nervoso Grato
  200. Sem saída Aberto
  201. Em pânico Capaz de ser ensinado
  202. Com medo Com boa vontade
  203. Culpado Honesto
  204. Envergonhado Esperançoso
  205. Com dúvidas Em paz
  206. Derrotado Sereno
  207. Ressentido Tolerante
  208. Vazio Realizado
  209.  
  210. PERDÃO
  211.  
  212. Deus não faz coisas mal feitas. Cada um de nós é uma pessoa única – um alguém, não um ninguém. Em todo o mundo não há mais ninguém igual a nós. Temos de nos deixar fascinar por nós mesmo e tomar consciência de como somos fortes. O Rei Bebê que existe dentro de nós, desenvolveu uma larga variedade de energias associadas aos talentos que Deus nos deu e devemos aprender a apreciar essas energias. Podemos aprender com o passado e entrega-lo. Podemos deixar de ser o juiz e o carrasco que nos condena. Sabemos que nosso Poder Superior nos perdoa. Agora é altura de lhe darmos espaço. Temos de para de nos julgar e sair do seu caminho.
  213.  
  214. HUMILDADE
  215.  
  216. “Meu Deus, como é difícil ser humilde quando se é perfeito em tudo”. Quando Mac Davis cantou essa canção, por toda parte, cada Rei Bebê tinha certeza que ele estava falando de mim. Já sabemos agora, que o orgulho constitui grande parte do problema do Rei Bebê. O que precisamos aprender é que o orgulho pode ser positivo. A humildade é uma aceitação de ser igual, nem melhor ou pior. Ser igual é também ser honesto, aberto e vulnerável, o que é difícil, mas possível. Sentindo-nos livres de sermos nós, podemos enfrentar a realidade. A humildade nos ensina a capacidade de aprender e de sermos flexíveis. Para continuarmos a crescer e evitarmos recaídas, a humildade tem de ser constantemente mantida.
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  218. CULPA
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  220. A máquina da culpa, ou seja, a consciência do Rei Bebê está avariada. Os Reis Bebês “bloqueiam” os seus comportamentos e perdem os seus sistemas de valor durante o processo. Tendo consciência disto, reagem exageradamente e castigam-se constantemente por serem humanos. Até que o Rei Bebê que existe em nós encontre equilíbrio e um novo conjunto de valores, teremos que contar muitíssimo com os nossos padrinhos. Uma boa regra de conduta se nos sentirmos culpados, será não procedermos assim. Temos de descobrir em que é que acreditamos e viver de acordo com isso.
  221.  
  222. USAR AS NOSSAS PERSONALIDADES ADICTIVAS
  223.  
  224. Sabemos que temos personalidades adictivas. Por que não havemos de tentar ser dependentes em relação a qualquer coisa que seja positiva para nós? Podemos escolher alguns mini
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  230. objetos ou coisas que possamos fazer todos os dias. Podemos criar uma divertida, positiva e até apaixonada ligação amorosa com determinado programa de exercícios. Se quisermos, podemos voltar para a escola.
  231.  
  232. DESENVOLVER UMA RELAÇÃO PESSOAL COM O NOSSO PODER SUPERIOR
  233.  
  234. Devíamos nos perguntar: ”Que gênero de Poder Superior existe e como vamos contatar com Ele ao lermos as nossas meditações diárias?” Podemos escolher um tema segundo o qual viver o dia-a-dia, lembrando-nos que uma atitude positiva não é automática, mas vem com a prática e um trabalho incessante. Quanto mais as nossas expectativas diminuírem, mais a nossa serenidade aumenta. Podemos praticar a aceitação em relação a nós próprios e aos outros.
  235.  
  236. INVENTÁRIO DIÁRIO
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  238. Cada noite nós devemos registrar as coisas positivas que fizemos e as coisas que nos aconteceram. Isto põe em evidência que devemos a nós mesmos algum crédito por aquilo que realizamos. Podemos rever calmamente os nossos erros e admitir aquilo que éramos.
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  240. RELAÇÕES COM O SEXO OPOSTO
  241.  
  242. A nossa recuperação é seriamente colocada em risco ao começarmos uma relação cedo demais. Ao experimentar o sofrimento que a recuperação causa o Rei Bebê em nós procura muitas vezes novas relações para aliviar a dor do crescimento. Permitir que isto aconteça conosco é semelhante a um inseto que se deixa atrair pela chama. O Rei Bebê muitas vezes cria uma relação de dependência e usa essa relação como uma droga para ficar eufórico. Isto põe a nossa recuperação em suspenso, ou ainda pior, pode provocar a recaída. A nossa imaturidade pode ter nos impedido de saber o que é ou como ter uma relação saudável. Tudo o que sabemos é possuir, invadir, exigir, atacar e conquistar. Adoramos a lua de mel, mas fomos incapazes de aguentar os altos e baixos de uma relação. As emoções intensas de uma relação nova poderiam causar a perda da nossa sobriedade recém-encontrada.
  243.  
  244. TEM QUE MUDAR TODA A SUA VIDA, DISSE O ORADOR
  245.  
  246. Imagine por momentos, um fone de ouvidos ligado sempre, onde um lado se ouve os discursos confusos Rei Bebê e outro ouve os princípios de AA, ou seja, de recuperação. Os nossos códigos de chamado serão RBB e NAA (N para o “nós” dos AA ). Temos a escolha de ligar quer para o RBB quer para NAA. RBB representa os pensamentos negativos, ou seja, os pensamentos que vão nos levar a recaída, enquanto o NAA representa a recuperação. Se desafinarmos a forma de pensar a RBB e sintonizarmos a NAA, poderemos começar mudar os nossos pensamentos.
  247. Pensamentos Negativos (velhas crenças ) x Novas crenças ( AA e NA )
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  250. Pensamentos negativos Rei Bebê
  251. Slogans AA e NA
  252. Viver no passado e preocupar-me com o futuro.
  253. Um dia de cada vez.
  254. Tentar fazer as coisas a minha maneira.
  255. Entrega. Deixar nas mãos de Deus.
  256. Reagir exageradamente quando as coisas não acontecem como penso que deveriam acontecer.
  257. Acreditar que é o melhor.
  258. Fazer o inventário dos outros, salientando quando estão errados.
  259. Fazer o seu próprio inventário.
  260. As pequenas mentiras não têm importância.
  261. É um programa de honestidade.
  262. Justificar os rancores e agarrar-me a eles. Dizer às pessoas o que penso que elas querem ouvir.
  263. Não guardar ressentimentos. Ser assertivo.
  264.  
  265.  
  266.  
  267.  
  268.  
  269. Sintomas de recaída do RBB
  270.  
  271. Desonestidade
  272. Dúvida
  273. Adiamento
  274. Medo
  275. Escolher a facilidade
  276. Arrogância
  277. Afrouxar a disciplina
  278. Os princípios de Anônimos
  279.  
  280. Honestidade
  281. Esperança
  282. Ação
  283. Coragem
  284. Perseverar
  285. Humildade
  286. Autodisciplina
  287.  
  288. ATITUDE É DE GRATIDÃO
  289.  
  290. Aprendemos finalmente a ocupar-nos em apoiar, alimentar e acariciar a nossa criancinha receosa. Decretamos mesmo tréguas com o nosso lado de Rei Bebê e nos tornamos capazes de controlar o que se passa dentro de nós. Nunca ocorreu ao RB que uma pessoa pudesse ser autodisciplinada e viver uma vida normal, apesar disso, estar realmente “na onda” e ter vida, podemos agora desenvolver uma serenidade interior que o RB nunca pensou ser possível.
  291. Existe um poema lindo chamado “O pedido e a Resposta” que descreve os sentimentos que o Rei Bebê tem quando toma consciência que através de todo esse sofrimento recebeu grandes bênçãos.
  292.  
  293. O PEDIDO E A RESPOSTA
  294.  
  295. Pedi à Deus para me dar forças para poder realizar,
  296. Assim nasci fraco, de forma a ser capaz de aprender e obedecer humildemente.
  297. Pedi saúde de forma a poder atingir coisas maiores,
  298. Recebi enfermidades para conseguir fazer coisas melhores.
  299. Pedi riqueza para poder ser feliz,
  300. Recebi pobreza para poder ser sensato.
  301. Pedi poder, de forma a receber os louvores dos Homens,
  302. Recebi fraqueza de forma a sentir a necessidade de Deus.
  303. Pedi toda a espécie de coisas para poder gozar a vida,
  304. Recebi a vida para poder gozar todos os tipos de coisas.
  305. Não recebi nada do que tinha pedido, mas tudo o que tinha desejado.
  306. Quase que à revelia de mim mesmo, as orações que não pronunciei foram ouvidas. Sou, entre todos os Homens, profundamente abençoado.
  307.  
  308.  
  309.  
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  347. NEGAÇÃO
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  368.  
  369. Com alguns anos no seu programa de recuperação do alcoolismo, Kelly conheceu e casou-se com um homem. Após sete anos, caóticos, Kelly percebeu que seu marido era – e tinha sido desde que se casaram – um alcoólico, e que ela estava tendo problemas com seu próprio comportamento compulsivo e agora co-dependente. Ela estava de novo a ser afetada pelo alcoolismo, desta vez de um modo diferente.
  370. Esta consciência veio de repente, disse ela, como se alguém tivesse acendido uma lâmpada dentro da sua cabeça, passou então os meses seguintes em depressão, com raiva e cansada de si mesma.
  371. “Não posso acreditar que demorei sete anos para ver a verdade. Eu sabia tudo sobre alcoolismo. Como é que eu pude negar isto tanto tempo?” perguntou ela. “O que há de errado comigo?”
  372. Você pode ter tido uma experiência semelhante. Ter vivido inconsciente com um problema por uns tempos e de repente uma luz ter se acendido na sua cabeça. Tudo ficou claro – tão claro que você se pergunta como e por que não viu antes. Ou pode conhecer alguém como a Kelly que simplesmente se recusa a admitir ou aceitar a realidade. Ela parece não ver algo que esteja na frente dos seus olhos. E não há insistência, discussão ou que lhe tirem a venda. “As pessoas tentaram me dizer” diz Kelly. “Avisaram-me, mas eu não as ouvia. O que elas diziam não ficava registrado”.
  373. Você pode estar passando por uma experiência como a de Kelly. Pode sentir-se pouco a vontade, ansioso, com medo ou mesmo desesperado. Alguma coisa não está bem, mas não consegue distinguir o que é. Pode ter uma vaga consciência do que o problema envolve; por vezes pode até dizê-lo em voz alta. Outras pessoas podem observar em termos específicos. Mas você não se ouve nem os ouve. Não pode acreditar nisso!
  374. Quer seja você ou alguém que conhece que esteja afetado pela negação, isto pode ser uma experiência que traz confusão e frustração. Você pode gostar muito de alguém que parece desesperadamente ocupado em recusar a realidade. Você pode interpretar essa rejeição da realidade como estupidez, absurdo ou insanidade. Pode levar isso pessoalmente, como uma rejeição da sua clarividência e vontade de ajudar. Pode chamar a isso mentir. Pode pensar como o fez Kelly, o que há de errado com ele ou com ela, ou até consigo mesmo por não ver a realidade claramente.
  375. Apesar de todas as pessoas poderem ter problemas que precisam ser resolvidos, não há nada de errado com ele ou ela por usarem a negação. É um mecanismo que as pessoas usam para lidar com a perda e a dor.
  376. Esta apostila vai procurar ajudar a perceber e aceitar a negação como uma ferramenta legítima e uma fase válida do processo de aceitação ou de luto. É aquilo que vamos ver e como eliminar a negação, mas como encontrar maneiras que nos ajudem, assim como aos outros, a reduzir a necessidade de usar.
  377.  
  378. FERRAMENTA OU ARMA?
  379.  
  380. Rebuscando o sótão, Carol, de sete anos, encontrou uma antiga roupa de ballet que já não lhe cabia. Apesar dos protestos da mãe, Carol espremeu-se para entrar em sua roupa e usou-o o dia todo indiferente a sua aparência absurda.
  381. A filha mais velha de Mariana, de catorze anos, começou subitamente a ter maus resultados na escola, agindo de forma desafiadora e arredia em casa, e escolhendo amigos que se comportavam da mesma maneira. Por diversas vezes, Mariana encontrou garrafas no quarto da criança. Duas vezes, esta chegou em casa tropeçando e com o discurso confuso da bebedeira. Quando um vizinho sugeriu à Mariana que a sua filha poderia ser dependente química, Mariana encolheu os ombros e disse: “A minha filha não”.
  382.  
  383.  
  384. Por beber demasiadamente, Daniel ficou sem carta e perdeu o trabalho. Após várias ameaças de divórcio por parte da sua mulher, ele relutantemente, entrou em tratamento. “Não consigo perceber a razão de todo esse barulho”, disse Daniel ao seu conselheiro. “O que eu bebo não é tanto assim. Eu consigo controlar. Não sou um adicto.”
  385. Que nevoeiro é este que encobre as pessoas, apagando a sua sensibilidade e cegando-as em relação à realidade? Que tipo de mudança acontece que faz com que pessoas razoáveis se transformem em seres irracionais? Como podem eles estar ali e dizer “Isso não é assim”. ”Quando é?” Este nevoeiro é chamado de negação. E não é que eles não acreditem na realidade: eles estão envolvidos num processo que os impede de acreditar nela.
  386. “Em momentos de muito stress, nos fechamos a nossa consciência emocionalmente, por vezes intelectualmente, e em certas ocasiões fisicamente”, explicou Claudia L. Jewett em Helping Children Cope With Separation And Loss. “Um mecanismo embutido em nós, funciona como uma cerca que separa as informações e que nos evita uma sobrecarga de informações devastadoras. Os psicólogos dizem-nos que a negação é uma defesa consciente ou inconsciente que todos nós usamos para evitar, reduzir ou prevenir a ansiedade quando somo ameaçados.” Jewel diz ainda: “Usamos a negação para fechar a nossa consciência de coisas que seriam dolorosas demais para sabermos.”. Quando a usamos, entramos em curto-circuito, ficamos entorpecidos. A pessoa que está em negação pode começar a mentir, recusando-se a admitir a verdade de alguma coisa fazendo ginástica mental para transformar algo de ilógico, e defendendo isso com a energia e vigor de um guerreiro exercitando e protegendo território tribal. Mas esta pessoa não está a fazer isto só para os outros. Está negando para si própria também.
  387. Noel Larson, uma psicóloga licenciada, definiu negação numa conferência sobre o abuso sexual em Minnesota. “Negação não é mentir”, disse ela. “É não reconhecer o que é realidade”.
  388. A negação trabalha a um nível muito profundo. Dizemos mentiras a nós mesmos. Quando alguma consciência, alguma realidade ameaça magoar-nos, enganamo-nos de modo a acreditar que “não é verdade”.
  389. Que arestas da vida são estas que nos atiram para esta auto ilusão temporária? As pessoas podem negar sentimentos, pensamentos, acontecimentos, mudanças, situações, problemas, doenças e até a própria morte. Negamos o tangível e o intangível. As pessoas negam mais ou menos tudo o que pode ser negado – mas o que normalmente negamos são as nossas perdas, o que perdemos ou suspeitamos que fosse perder algo de importante para nós.
  390. Esta perda pode ser tão pequena como uma nota de cinco dólares ou tão grande como a nossa saúde. As pessoas perdem todo o tipo de coisas importantes – amor, seres amados, autoestima, fé em Deus, confiança, sonhos, trabalhos, saúde, dinheiro, posses, independência e até dependência. As pessoas podem perder coisas que se tornaram importantes para si, mas que os outros dificilmente veem como perdas – como relações pouco saudáveis com pessoas ou químicos.
  391. Todo o tipo de perda obriga as pessoas a usar a negação. Quanto tempo e até que ponto usará a negação, varia. Podemos ter um segundo de espanto e descrédito. Podemos resistir à realidade por minutos, horas, dias ou meses. Ou podemos passar anos a tropeçar numa nuvem negra.
  392. Por vezes, a negação pode ser usada para fazer o que alguns consideram como algo de heroico e positivo. Inconscientes a sua dor, alguns jogadores profissionais de futebol tem – ossos partidos – atravessando campos correndo e marcando gols. Mães doentes se esquecem da sua doença para poderem tomar conta dos filhos pequenos. Podem lembrar-se da história daquele homem de negócios que, tendo ficado ferido num acidente aéreo, não parou de mergulhar num rio gelado para salvar passageiros até que finalmente morreu das suas feridas de exaustão.
  393. A negação é uma coisa séria. Quando os dependentes químicos negam a sua doença, continuam usando até a morte. Os dependentes químicos negam o seu problema, e ficam mais doentes. Os co-dependentes de alcoólicos e de outros dependentes químicos negam que tenham sido afetados pela doença e podem continuar a sofrer e a fazer os outros sofrerem enquanto estão em negação.
  394. O problema aqui é doloroso e óbvio. Uma pessoa que nega a realidade não está admitindo e nem resolvendo o problema. A negação, enquanto usada, elimina a possibilidade de mudança.
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  400. Independentemente de estarmos negando um problema com o carro, um defeito de caráter, ou um problema com álcool ou drogas, não vamos conseguir remediá-lo só por dizermos que não está acontecendo.
  401. Somos ao mesmo tempo seres fortes e fracos. Temos uma grande capacidade de tolerar e de suportar a mudança, a dor e a perda. Surpreendentemente, pudemos até crescer através destas experiências e tornamo-nos seres mais maduros, sensíveis e carinhosos. Mas em princípio, quando enfrentamos uma perda, muitos de nós precisamos dizer: “Não. Isto não pode ser verdade. Isto não pode estar me acontecendo.” A negação é o amortecedor da alma.
  402. Isto é uma reação normal, natural e instintiva a perda. É uma ferramenta, alguns dizem que dada por Deus, que usamos para lidar com a dor. Negamos porque temos necessidade dela. Negamos para lidar com a dor ou com os problemas, não lidando com os problemas e fatos, até estarmos prontos e preparados para lidar com eles. Alguns de nós precisamos de um pouco mais de tempo e um pouco mais de ajuda do que o outro até estarem “prontos”. “Não será aceitação melhor?”, podemos perguntar. “Não seria melhor uma pessoa ser obrigada a ver as coisas realisticamente? “ Estas perguntas tem razão de ser. Sim, a aceitação é melhor e a confrontação assim como a intervenção, quando são usadas apropriadamente e com cainho, se tornam boas ferramentas terapêuticas. Isto não é dito para encorajar as pessoas a escolher ou a continuarem a estar em negação, mas podemos querer nos lembrar de que paradoxalmente a negação pode ser frequente o primeiro passo em direção a aceitação.
  403.  
  404. É PARTE DE UM PROCESSO
  405.  
  406. As pessoas confundem frequentemente a aceitação. “Só tem que aceitar isso“ dizem elas, como se aceitar fosse um ato simples como fechar a porta de um frigorífico. Para mim aceitação não é fácil. Eu não reajo imediatamente com serenidade a dor ou aos problemas. Agora, normalmente, estou grata e contente por ser uma alcoólica e uma adicta em recuperação. Acho ótimo serem ambas as coisas.
  407. Em 1973, quando pela primeira vez me disseram que eu era uma alcoólica e uma adicta e que tinha que parar de usar químicos se quisesse viver, não reagi às notícias com êxtase. Não achei que estava bem. Tive de atravessar um processo de aceitação. A maioria de nós precisa lutar com aquilo que acredita e com aquilo que sente, antes de poder aceitar uma perda. Temos de atravessar um processo.
  408. Elizabeth Kubler-Ross observou e documentou pela primeira vez este processo de cinco fases, o processo de dor/luto, adequando do seu trabalho com doentes terminais no hospital. Ela identificou-o pela maneira como a maioria dos doentes terminais reage e chega à aceitação da sua morte prevista. Em anos passados, muitos profissionais viram que as pessoas atravessam estas fases a caminho da aceitação das suas perdas. Alguns centros de tratamento acreditam que este processo de dor/luto está intimamente ligado a recuperação de doenças compulsivas como a dependência química em geral, da adicção comportamental, como da bulimia e os problemas de jogo, dado que estas doenças produzem tantas perdas. Podemos nos ver atravessando estas fases, com diferentes velocidades e níveis de emoção, quando não recebemos uma ligação importante, temos um corte de cabelo que nos desagrada, perdemos o nosso trabalho, ou nos divorciamos. Podemos sofrer sempre que experimentamos uma mudança – mesmo uma mudança desejada – porque qualquer mudança significa que tivemos de deixar algo para trás para abrir espaço para o novo. “Não importa o trivial que uma perda possa parecer, o mesmo processo tem de ser atravessado de cada vez, apesar de o comprimento e a intensidade das experiências serem diferentes. Pode levar anos para se recuperar de uma perda, mas os sintomas de dor e de recuperação podem também ser completamente vividos num espaço tão pequeno como dez segundos”.
  409. Não existe regra que determine quanto tempo leva cada fase; não existe regra que determine quanto tempo todo o processo leva. Isto vai depender da natureza da perda, até que ponto está
  410.  
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  413.  
  414.  
  415. equipado para lidar com ela, como lidamos com outras perdas, e do tempo de Deus. As pessoas vão levar o tempo que precisam para atravessar este processo. Fazer crescer pessoas e mais complicado do que fazer crescer vegetais ou flores.
  416. Apesar de se poderem delinear cinco fases no papel, a nossa passagem por elas pode não ser tão linear. As fases podem sobrepor-se, podemos viver várias fases ao mesmo tempo. Podemos voltar a fases antigas. Podemos estar em diferentes fases do processo por duas ou mais perdas simultâneas. Podemos atravessá-las a correr três vezes no mesmo dia.
  417. Por vezes, no caso de perdas contínuas, podemos nunca chegar a atingir a aceitação permanente. Isto é verdade quando a perda continua a afetar o nosso dia-a-dia. Os pais de uma criança deficiente podem viver fases do processo dor/luto toda a sua vida – especialmente à medida que se desenvolvem novas implicações do crescimento da criança deficiente. Porque a dependência química é uma adicção, assim como uma doença crônica, manhosa e enganosa, os adictos não podem nunca assumir que tem uma aceitação total da sua doença. Estão em grande risco de reverterem à negação – uma das razões pelas quais e tão importante para os adictos tratarem a sua doença, indo às reuniões de anônimos. Aceitação permanente pode requerer atenção permanente. Este processo de aceitação é um processo espiritual. É uma experiência que somente a vivência pode trazer e da qual é preciso abrir mão de outras motivações.
  418. Eu ouvi pessoas chamarem o processo de dor, perdão, luto ou de cura. Esther Olson, conselheira e autora, deram a minha descrição favorita: “É o modo como Deus trabalha conosco” disse ela.
  419. A seguir vamos ver cada fase.
  420.  
  421. *NEGAÇÃO
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  423. A negação é a primeira reação à perda. Do mesmo modo como uma dor física muito forte ou uma ferida pode por os nossos corpos em choque, a dor emocional ou mental pode causar uma reação semelhante ao nosso sentimento, intelecto, e por vezes ao nosso físico. Ficamos entorpecidos, entramos em curto-circuito. Alguns terapeutas chamam a isto um “bloqueio”. A maioria dos profissionais concorda que normalmente não é um bloqueio total. Parte de nós sabe ou suspeita da verdade. Só que ainda não estamos prontos ou capazes de lidar com ela.
  424. De novo, não há regra quanto ao tempo que dura a negação. Cada pessoa a cada situação é única. As pessoas negam até se sentirem suficientemente seguras para lidar com a perda de outra maneira.
  425. Uma vez que a pessoa ultrapassa a negação, no entanto, não é ainda a altura para atingir a aceitação. Cuidado, não há no inferno fúria tão grande como aquela que vem na fase seguinte.
  426.  
  427. *RAIVA
  428.  
  429. Esta fase é caracterizada pela inveja, culpar os outros, ressentimento e, por vezes fúria. A nossa raiva pode ser específica e direcionada, ou pode ser geral, atirada a nossa volta ao acaso. Pode ser racional ou irracional, justificada ou injustificada, sensata ou sem sentido. Podemos dar pontapés no gato e berrar com as crianças, mas no fundo não estar furiosos com nenhum deles. Estamos com raiva da nossa perda. Podemos culpar os outros e nós mesmos pela situação em que nos encontramos. Podemos ter inveja daqueles que tem o que nós perdemos.
  430. “Por que é que eu não posso beber um cocktail antes do jantar sem acabar bêbado e sem sentidos à meia-noite? Ou Por que não posso fumar apenas um baseado, sem ir logo depois para cheirar cocaína ou fumar crack?” Podemos manter esse lengalenga interminavelmente, assumir maus sentimentos ou mesmo explodir num grande abuso verbal. Esta raiva pode por vezes ser perigosa, tanto para a pessoa que a sente como para a pessoa que é objeto dela.
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  432.  
  433.  
  434.  
  435.  
  436.  
  437. Trocamos, nesta fase, o “Eu não!” para “Por que eu?”, “É culpa sua” e “Não é justo”. Estamos loucos. Normalmente por trás da raiva está o medo, a culpa e a vergonha. Tal como precisamos da negação, precisamos agora da raiva.
  438. “Não há problema em atravessar esta fase” diz Olson. “A raiva é um combustível se não for trabalhada. Mas precisamos lidar com ela de maneira apropriada”.
  439.  
  440. *NEGOCIAR
  441.  
  442. Após ventilarmos a nossa fúria, podemos tentar adiar de modo a evitar ou adiar a perda. Estas negociações podem ser feitas com Deus ou vagamente com a vida. De acordo com Olson, esta fase é normalmente caracterizada por SE... ENTÃO... Frases que medem o que damos conta daquilo que recebemos. Algumas vezes os nossos acordos são construtivos, realistas e obtém o resultado pretendido. “Se recebermos ajuda para o nosso casamento, então não teremos de nos divorciar”. “Se eu for buscar ajuda para o meu problema de bebida, então não vou ter de morrer”.
  443. No entanto, normalmente, as nossas negociações não são realistas. O alcoólico vai tentar um acordo em que apenas bebe cerveja, ou em que só bebe em fim-de-semana por mês. “Eu só pensava: Se eu limpar a casa mesmo bem desta vez, então ele não vai ficar furioso e beber” dizia a mulher de um alcoólico. Nestes casos, quando já não podemos adiar o inevitável, temos de o viver.
  444.  
  445. “DEPRESSÃO
  446.  
  447. Avançamos agora para um período de tristeza. Desde que pela primeira vez dissemos: “Isto não pode ser verdade”, que fomos empurrados para este momento. É talvez a essência da dor – estando de luto completamente. É o ponto mais alto do processo de aceitação e da dor emocional na sua forma mais pura. Choramos pelo que perdemos e sobre o que vamos perder no futuro. Chegou a hora de chorar.
  448. Esta tristeza pode levar horas, dias, semanas, ou meses. “Quando humildemente nos rendemos, este processo começa”. Diz Olson: “Esta depressão só desaparecerá quando o processo for ultrapassado”.
  449.  
  450. *ACEITAÇÃO
  451.  
  452. Quando já não precisamos bloquear, sentir raiva ou fazer acordos depois de ter lidado com a tristeza, vamos chegar a uma fase de aceitação. Não é a resignação e nem o desespero de “desistir” é uma sensação de “para que?” ou de “estou farto de lutar”, apesar de também ouvirmos estas frases escreve Kubler-Ross em On Death and Dying. Elas também indicam o início do fim da luta, apesar de as últimas não serem indícios de aceitação. A aceitação não deve ser confundida com uma fase feliz.
  453. É praticamente vazia de sentimentos. “É como que se a dor tivesse ido embora, a luta acabou...”
  454. Estamos em paz com o que é e livremente admitimos a nossa impotência sobre as adicções. Deus nos deu a serenidade de aceitar o que podemos modificar.
  455. A seguir a aceitação cresceu. Isto implica que não nos limitamos a sobreviver a experiência, mas que mudamos ou fomos melhorados por ela. De algum modo, consideramo-nos mais ricos. Se não podemos ver como isso nos beneficiou, temos pelo menos a confiança de que está certo tudo está bem, e que algum dia poderemos perceber o propósito. Podemos aceitar a perda e crescer, mas o caminho não é fácil, nem particularmente confortável. Pode ser estranho e por vezes parecer que vai nos destruir. No momento em que começa, podemos nos sentir em choque e em pânico. Enquanto o vivemos podemos nos sentir confusos, vulneráveis, sozinhos e isolados. Podemos ter uma sensação de falta de controle. Temos de confiar na graça de um Poder Superior; precisamos nos agarrar a esperança. Em todas as fases exceto na negação, a esperança é uma linha de vida.
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  462. É importante compreender e fazer um compromisso a este processo. Isto é válido, benéfico e necessário para a aceitação.
  463. Através deste processo é também importante para a nossa saúde. Chorar a dor não é novidade nem desta nem deste século. Jesus mencionou nas bem aventuranças: “Abençoados os que
  464. choram, pois serão consolados”. Numa procura para descobrir o que “abençoados” quer dizer, Donald D. Anderson um padre e psicólogo, retrasei-a aquele verso de Better than Blessed. “Saudáveis são aqueles que choram”, escreve ele. “Apesar muito recentemente começamos a realizar que negar a dor e negar uma função humana natural e que tal negação produz consequências graves”, continua ele. “A dor, como qualquer emoção genuína, e acompanhada por certas mudanças físicas e a libertação de certa forma de energia psíquica. Se essa energia não é gasta no processo de luto mal trabalhado, qualquer conhecimento que contenha uma sensação de perda para si, tem de, e deve ser lidado. Isto não significa uma vida de tristeza permanente. Significa estar capaz de aceitar honestamente um sentimento em vez de ter sempre de rir da dor. “Não só é aceitável admitir a tristeza que acompanha qualquer perda como é a opção saudável”.
  465. É positivo compreender o luto. As pessoas que sofrem estão vivendo esse processo. Precisamos nos permitir a nós mesmos e aos outros, a liberdade de lutar, sentir e falar sobre este processo se quiserem.
  466. Lembram-se da Kelly na primeira parte desta apostila?
  467. Ela é aquela alcoólica em recuperação que passou anos a negar que o seu marido era um alcoólico. Após ter parado de negar, ela atravessou um grande período de raiva e depressão. Durante este período ficou com medo e confusa. “Parece que estou ficando maluca”. Confessou ela. “Não estava assim tão confusa desde o meu próprio tratamento para alcoolismo”.
  468. Quando Kelly percebeu que não estava ficando maluca, mas que estava experimentando uma dor sentiu-se melhor. Continuava a sentir-se triste, mas percebendo o porque. Tudo estava bem. Ela estava bem.
  469. Compreender o processo não vai eliminar a necessidade de atravessá-lo, mas vai ajudar-nos a relaxar, ter menos medo, e lidar com ele, em vez de lutar contra ele. E podemos ser uma boa ajuda para os outros.
  470. Agora que examinamos o lugar da negação no esquema da aceitação, vamos ver com o que se parece à negação, tanto do interior como do exterior.
  471.  
  472. COMO PARECE/COMO SE SENTE/COMO SOA
  473.  
  474. Como podemos nos reconhecer quando estamos em negação? Será tão fácil como descobrir um elefante sentado no meio da sala?
  475. Seria conveniente se reconhecer a negação fosse assim tão simples. O que nós negamos é um problema, uma perda, um sentimento no meio das nossas vidas. É algo que evitamos, andamos à volta, e do qual fugimos. Apesar dos nossos esforços, é algo contra o qual estamos sempre tropeçando.
  476. Apesar das lutas permanentes com o objeto da nossa negação, pode ser difícil reconhecer quando nós ou outra pessoa está imersa nela. Podemos estar tão perto de uma situação que não a vemos claramente. Podemos sentir-nos tão provocados com o comportamento escandaloso de alguém que não pensamos claramente. Podemos estar tão ocupados a responder aos sintomas da indignação, do absurdo, ou da mentira – que não tomamos o tempo necessário para identificar o problema. Não olhamos para o nevoeiro, nos focamos na primeira pessoa a nossa volta.
  477. Podemos também ficar apanhados pelo nevoeiro. Podemos ter necessidade de negar seja o que for que a outra pessoa está nos dizendo. Por razões puramente pessoais, podemos sentir a necessidade de que os nossos cônjuges não sejam alcoólicos (as) ou os únicos filhos (as) não sejam adictos. Por isso quando eles dizem “isso não é assim”, estamos cheios de vontade de concordar.
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  484. Outro problema é aceitar que estamos em negação, é como estar dormindo. Pensamos quando acabou no que estivemos fazendo, mas não pensamos muito no assunto quando o fazemos.
  485. Apesar da dificuldade em reconhecer a negação, podemos aprender e ficar sensíveis às suas presenças. Cada pessoa é única; cada sistema de negação vai ser único. Mais especialistas, identificaram certos padrões emocionais, comportamentais e mentais que lhe são comuns.
  486. Algumas pistas podem indicar que uma pessoa está usando a negação. A pessoa pode usar mais do que uma ao mesmo tempo, ou pode andar para frente e para trás, conforme a ocasião o exigir. Um bom negador (sim, adictos estou referindo a nós mesmos) pode usar muito dos sistemas ao mesmo tempo numa orquestração fantástica, impressionante.
  487. Antes de agarrar o lápis e escrever as próximas páginas com uma lista de sintomas defeitos e culpas de sua família e os vizinhos sugerem que comece por se estudar a si mesmo. E quando tiver acabado consigo, lembre-se de usar a informação, não para julgar os outros, mas para se comportar de uma maneira mais saudável e prestativa para com eles.
  488. Não se preocupe como descobrir todos os sistemas de negação na sua vida. Foi-me dito por membros de AA que não precisamos estar conscientes de todos os nossos problemas ao mesmo tempo. Se estivermos trabalhando o nosso programa e vivendo como devemos, vamos ficar conscientes das coisas nas quais temos de trabalhar quando for a hora certa. Enfrentaremos os nossos problemas quando for claro que os enfrentamos.
  489. Cuidado: A presença de algum dos traços seguintes não é e nunca prova segura de que se está em negação.
  490.  
  491. Como parece...
  492. As quatro maneiras principais que as pessoas usam para negar. Segundo Jewett, são: Recusar-se a aceitar a realidade. “Aqui” a característica são frases como: “Não acredito”, “não pode ser verdade”, “isto não pode estar acontecendo”. Começamos então a nos comportar como se o acontecimento, problema, mas somente estamos a adaptar sob pressão. Bem no fundo estamos sussurrando. “Não. Eu não”.
  493.  
  494. Negar ou minimizar a importância da perda. Aqui, “dizemos que seja o que for que aconteceu não tem importância”. Admitimos a realidade do que se passou, mas insistimos em que não é tão importante como as pessoas dizem; podemos até acusa-los de estarem enxergando. Comportamo-nos como se não considerássemos o problema importante.
  495.  
  496. Negamos quaisquer sentimentos sobre a perda. Isto é repressão emocional. “Aconteceu – está acontecendo – mas eu não me importo”, dizemos a nós mesmos e aos outros. Podemos agir e parecer como se não nos importássemos, aparentou estar emocionalmente vazios.
  497.  
  498. Fuga mental. Evitamos os acontecimentos, mentalmente, de várias maneiras. Podemos dormir excessivamente para escapar (sentindo-nos de fato cansados). Podemos ficar hiperativos – saltando de uma atividade para outra, não diminuindo até a noite, podendo continuar mentalmente durante o sono. Podemos ficar obsessivos e compulsivos. Podemos perder-nos em frente da televisão por horas, ou em material de leitura. Demonstramos estar correndo, driblando, evitando ou escapando. E estamos mesmo!
  499. As pessoas que estão evitando a realidade podem ir muito longe para evitarem situações que confrontam o seu sistema de negação poderão ter suficiente trabalho em reprimir a verdade – não precisam de se por numa situação que vai se tornar isto mais difícil. Em vez disso vão procurar situações que reforcem a sua negação. Amigos, acontecimentos sociais, às vezes até a escolha de uma carreira, serão tomados nestas considerações. Os alcoólicos e os adictos são conhecidos por estruturarem as suas vidas de maneira a que seja um suporte da sua negação.
  500.  
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  506. Como se sente...
  507. Uma pessoa que está usando da negação pode sentir-se desesperada, sozinha, confusa, pouco a vontade, ansiosa, assustada, culpada, vulnerável ou fora de controle. Ao contrário, pode não sentir nada: as emoções estão em baixa, fechadas, frias ou reprimidas.
  508. As respostas às situações podem ser inapropriadas: a inconstância quanto ao grau de tristeza, infelicidade ou raiva quando a felicidade seria apropriada. Por vezes ficamos espantados ao bem que uma pessoa reage à tragédia. “Ele não chora, não se desestrutura.” Poderíamos nós lidar com as coisas de uma maneira tão eficiente? Provavelmente, se estivermos em negação.
  509. Sentimo-nos cansados por causa disso, a grande fuga é o sono, a pessoa que nega pode sentir um cansaço fora do comum por estar em negação. “Evitar que a realidade suba à superfície é como tentar manter debaixo da água uma bola de basquete”. Escreve Anderson. “Pode ser feito – mas exige concentração e energia.”
  510. Quando estamos em negação, nos sentimos por vezes defensivos acerca daquilo que estamos negando. Os outros podem sentir isto, que tenha sido verbalizado ou não, e pensarem: “O melhor é não falar sobre isto, ou vai haver uma cena”. Portanto, o problema não pode ser discutido.
  511. Um sentimento de estar desligado ou fora de contato consigo mesmo é muitas vezes sinal de negação. Podemos reparar que nos sentimos desligados de nós mesmos e da nossa capacidade de sentir e pensar. Por vezes, em incidentes traumáticos, podemos até ter a sensação de estarmos fora de nós, olhando: “Era como se não tivesse sido comigo. Eu estava ali, vendo outra pessoa vivendo este acontecimento, só que a outra pessoa não era eu”, disse alguém após uma crise muito grave. Podemos sentir esta falta de ligação e não ter intimidade com a pessoa que está em negação. Pode parecer que ela foi embora e não consegue voltar e entrar em contato.
  512. Negação durante muito tempo pode fazer com que uma pessoa se sinta doente e até possa ficar doente, mental ou fisicamente. Uma pessoa pode ter dores de cabeça, dores de estômago, dores nas costas ou disfunções sexuais. Uma pessoa que usa a negação pode ser menos resistente a todas as doenças, e ficar doente mais vezes que o habitual.
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  514. Como soa...
  515. As pessoas que estão em negação podem dizer a elas mesmas e aos outros que:
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  517. Não é assim tão mau, tanto, ou tantas vezes (minimização).
  518. Não tem importância.
  519. Não é assim. Não podia ser.
  520. Não me importo.
  521. Estou demasiado ocupado ou cansado para pensar nisso, muito menos para discutir.
  522. Amanhã tudo vai ser melhor.
  523. Não sou tão mau como o Harry. A minha situação não é tão má como a do Harry (comparação).
  524. Foi muito excitante e divertido – quando na verdade não foi (lembrança eufórica).
  525. Eu fiz, mas... (ou por que...). Era sensato (racionalização).
  526. Eu não tenho esse problema, mas muitas pessoas à minha volta sim (projeção).
  527. Eu não poderia ser dessa maneira porque sempre fui o oposto (compensação).
  528. E muitas outras citações criativas das que acima mencionamos.
  529. Esta lista não tem a pretensão de ser completa, mas apenas dar uma idéia da comunicação que acompanha a negação. A análise racional soa bem, quase lógica (se não o olharmos demasiado perto) e convincente. Afinal de contas, eles estão tentando convencer a eles próprios. Podemos acenar com a cabeça em concordância, enquanto a pessoa em negação está falando, e depois nos perguntar o que aconteceu. Fomos enganados, mas não sabemos bem como e nem porque.
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  538. SUAVEMENTE: SERES HUMANOS A PROCESSAR
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  540. A primeira vez que vi um profissional trabalhando com uma pessoa em negação, julguei que estava vendo uma magia. Também achei que o terapeuta estava entendendo mal a outra pessoa.
  541. Se o seu coração não está sintonizado pela aceitação do outro e certo em relação à necessidade desta pessoa, ele ou ela vai se sentir ameaçado (a) e não vai se revelar mantendo-se em negação.
  542. Mantenha-se saudável. Saúde gera saúde; a doença se pega. Se em determinada altura decidir que precisa de AA, ALANON, ou qualquer outro dos programas de Doze Passos, vá às suas reuniões regularmente e trabalhe o seu programa. Se você teve uma doença terminal, crônica e incurável o ano passado ou há dez anos, ainda a tem.
  543. Tratá-la vai minimizar a sua necessidade de usar da negação e o programa de Doze Passos vai ajuda-lo(a) a lidar com as outras pessoas.
  544. Dê autorizações saudáveis. Permita-se a si e aos outros pensar, sentir, resolver problemas, ser quem é, e estar onde estão no seu processo de crescimento. Estas autorizações dão força, energia, e são de muita ajuda, porque a negação faz entrar em curto-circuito os processos de pensamento e as emoções de uma pessoa, dar estas autorizações pode encorajar alguém a recomeçar a trabalhar. Dar às pessoas a autorização para serem quem são – lutadores imperfeitos numa viagem – pode reduzir a sua necessidade de usarem a negação. Não há problema em ter problemas. Não há problema em resolver problemas, também. Uma autorização contrária que eu dou às pessoas – especialmente a crianças pequenas que precisam aprender e à pessoas que tem tendências destrutivas e: “Não é aceitável magoar-se a si próprio ou aos outros”. Isto pode ser claro para nós, mas não ser para eles.
  545. Ouça – se quiser. Deixe as pessoas saberem que está disponível se elas quiserem falar. Falar ajuda as pessoas. Tiram coisas da cabeça e nos areja. É saudável ser ouvido, realmente ouvido – cria aceitação. Lembre-se que ajuda ouvir com o coração, assim como com os ouvidos. O que está ouvindo pode ser outra maneira de dizer, “tenho medo” “estou sofrendo” “estou confuso”.
  546. Fale de si, das suas emoções, e das suas experiências. Falar dos seus sentimentos é sempre uma boa maneira de lidar com eles. Vai ajuda-lo. E, partilhar honestamente as suas emoções e experiências pode ajudar outras pessoas, também. Pode dar-lhes coragem para fazer o mesmo; as suas vitórias podem dar-lhes esperança. Não seja demasiado intenso nem paternalista. Se sente que tem de falar de outra pessoa em vez de si, seja gentil. As pessoas que estão sofrendo reagem bem a gentileza, dizer que: “Sinto que parece ter um problema” ajuda mais do que “você está perdido”. Melhor ainda, encontre algo de bom nessa pessoa – uma qualidade, algo que ele ou ela tenha e que você gosta e aprecia – e ofereça esse elogio. Isso pode ajudar essa pessoa mais do que imagina, e você desenvolve um traço de caráter. O que você deve dizer a alguém que lhe pede que suporte ou concorde com sua negação? Se alguém lhe fizer essa importante pergunta: “Diga-me que não é assim” – verbalmente ou com um silêncio desconfortável – aqui SP há uma resposta possível: “Eu não posso tomar essa decisão por você. Vai ter de pensar sobre o assunto e tomar essa decisão sozinho (a)”. Isto não deve ser somente uma resposta; deveria ser uma atitude muito profunda.
  547. Ofereça informação, literatura e referências. Isto quer dizer pergunte a pessoa se ele ou ela querem ficar com o livro, a brochura, ou o artigo. Se a resposta for não, então não insista. Lembre-se que há uma grande diferença entre informação e conselho. Não dê nem ofereça conselhos. Não ajuda, serve para pôr todas as pessoas resistentes. Mesmo se, lhe for pedido, não dê conselhos. Uma boa resposta é: “O que acha que devia fazer?” Isso ajuda, e ninguém leva a mal. Leia o Big Book (Alcoólicos Anônimos, publicado pelo AA World Service). Contém sabedoria que ainda não está fora de moda.
  548. Demonstre empatia. Isto é uma palavra bonita que significa se colocar no lugar da outra pessoa. Quer dizer, lembrar-se o que significa enfrentar uma perda tão grande que precisa negá-la. Se não consegue lembrar-se de ter sofrido ou negado, e se não consegue ter empatia veja o número um acima mencionado. Se ainda assim não consegue lembrar-se, talvez você não seja a pessoa certa para
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  554. estar lidando com a pessoa que sofre. Empatia ajuda, e pode ajudar muito a reduzir a necessidade de negar.
  555. Evite julgar. As pessoas têm problemas. A pessoa não é o problema. Dizer ou acreditar que uma pessoa é má, inferior, sem esperança, horrível ou uma vergonha, não vai ajudar. Mesmo que sinta isso no seu coração, se não o disser, não vai ser ouvido. Especialistas acreditam que o medo, a culpa e a vergonha se uma pessoa – se lhe dissermos que os seus piores receios são verdade – isso não vai ajudar. Pode em alguns casos aumentar a necessidade de usar a negação.
  556. Não discuta. Raramente isso ajuda uma pessoa a parar de negar. Desvia a atenção e faz perder tempo e energia. Você não deve apoiar ou concordar com a negação, mas também não deve forçar uma pessoa a ver a realidade. Por vezes ajuda dizer: “Está bem, pode ser que tenha razão”. E deixa ir. Isto levanta a pressão de si e põe na outra pessoa uma maneira positiva, e que ajuda. Deixe as pessoas lutarem com elas mesmas e decidirem se tem razão. A sua batalha com a verdade e a realidade é muito mais dura de vencer do que uma batalha consigo mesmo. E quando essa batalha acabar vão ter ganhado algo. Isto não quer dizer que não possa ter raiva de quem está em negação. Você tem direito aos seus sentimentos, e precisa senti-los e por vezes se comunicar. Mas gritar não é normal e nem a melhor maneira de fazê-lo. Respeite as pessoas. Não tem de respeitar comportamentos pouco saudáveis – respeite a pessoa. Isto inclui acreditar que elas são pessoas boas (mesmo que tenham problemas). Elas podem pensar, e podem resolver os seus problemas. Isto quer dizer que lhes permitimos que fizessem estas coisas elas próprias.. Pergunte-lhes como querem resolver. Não temos que curá-las, fazê-las ficar melhor, controlar ou salvar. Não temos que lhes dar conselhos, nem fazer com que os seus sentimentos desapareçam. Não temos que, e não devemos nos envolver com as suas crises e consequências. As consequências são uma das maneiras em que a realidade fala alto para aqueles que estão em negação. Pare se salvá-los! Vai fazer a eles e a si mesmo um grande favor.
  557. Respeite-se. Ponha limites – Para a sua saúde e bem-estar. Não faça coisas pelos outros que realmente não quer fazer, que não sejam boas para si, ou que não sejam boas para eles. Não deixe que uma pessoa que está em negação lhe faça coisas que lhe fazem mal. Isto não quer dizer ultimatos ou jogos de poder (fazer algo para obrigar outra pessoa a ter um comportamento qualquer ou para “mostrar quem manda”). Isto quer dizer, calmamente descubra o que precisa fazer para tomar conta de si e o faça. Marque os limites.
  558. Confronte com cuidado. Isto não é um livro sobre confrontação ou intervenção. Ambas são boas ferramentas, quando usadas convenientemente. Ambas podem igualmente ser perigosas – para nós e para as pessoas que confrontamos. Despir uma pessoa de ilusões não é um projeto casual. Se o assunto que está sendo negado é sério, a pessoa pode parar com a negação após ser confrontada. Mas lembre-se – essa pessoa não vai provavelmente evoluir calmamente para a aceitação. Ele ou ela pode avançar para a segunda parte do processo – a raiva. Eu assisti a atos violentos e assustadores quando situações destas ocorreram. Tenha cuidado. John Powel explica porque: “A vocação de endireitar as pessoas, de lhes tirar as máscaras, de esforçar e enfrentar a verdade reprimida, é uma chamada extremamente perigosa e destrutiva”. Escreve Powel. “Ele não pode viver com algo que realizou. De uma maneira ou de outra, ele se mantém psicologicamente intacto através de uma forma de ilusão. Se esta ilusão psicológica for desmontada, quem vai reconstruir e colocar o pobre ser humano de pé outra vez.” Procure ajuda profissional se pensa que você, ou alguém perto de si, está na negação ou se está considerando confrontá-la ou intervir num caso difícil.
  559. Desligue. Postura difícil, mas que ajuda tanto.
  560. Não pense que as pessoas são contra você e não leve os problemas delas ou mesmo a negação, para o âmbito pessoal. Não somos responsáveis por outros adultos – não assuma responsabilidades por eles ou pelos seus problemas. Em última análise e com toda a certeza, cada pessoa é responsável pela sua negação. O seu processo de negação é da sua responsabilidade. Ocupe-se das suas responsabilidades – de si e do seu processo de aceitação. Se não podemos controlar os outros,
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  567. podemos então ao menos controlar a nós mesmos. Se nos sentimos demais responsáveis por outra pessoa, estamos no núcleo da co-dependência e quem precisa de ajuda somos nós.
  568. Confie em si. No seu processo de aceitação e no seu Poder Superior. Não existem regras absolutas para lidar com a negação ou com as pessoas. Cada situação e cada pessoa são únicas. Mas você pode pensar e lidar com as situações. Quer ajudar alguém, pergunte ao seu Poder Superior que o utilize e que lhe mostre o que tem de fazer. Empenhe-se em ser gentil, pensar claro, e em ter amor nos seus encontros com pessoas. Esqueça a perfeição. E você nem sempre tem de fazer algo. As pessoas reestruturam-se “chegando ao fundo do poço”, por mais feio e doloroso que seja aprendendo
  569. pela a dor – e o processo muitas vezes começa pela negação. É assim que Deus trabalha conosco. Abra mão do controle e deixe fazê-lo por si.
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  625. PENSAMENTO DESTRUTIVO
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  646. Podemos conseguir e desfrutar uma sobriedade duradoura. Temos dentro de nós o potencial para crescer e amadurecer na nossa recuperação, para conseguir uma vida abundante e cheia. Podemos nos tornar pessoas de grande autoestima e de expectativas otimistas. Podemos tornar-nos vencedores.
  647. Quantos recuperam? Quantos conseguem se manter sóbrios e bem, depois da sua primeira experiência em tratamento? Quantos recaem mergulhando outra vez na doença e no desespero da dependência química?
  648. De fato, a dependência química é uma doença caracterizada pela recaída. Dentre aqueles que sinceramente tentam se manter sóbrios e bem através do aconselhamento profissional e dos Alcoólicos e Narcóticos Anônimos, cerca de 97% tendem a “escorregar” sem esperança para uma dependência crônica do álcool ou outras drogas.
  649. O que se passa com eles? Serão estúpidos?
  650. É pouco provável. Veja que uma recuperação duradoura não depende da inteligência. O mundo está cheio de alcoólicos e adictos inteligentes. Um doutor em Física Nuclear não garante uma sobriedade feliz. Nem tão pouco ganhar a loteria ou ficar em primeiro lugar num concurso de beleza. Não é a inteligência, a sorte ou a beleza que nos mantém sóbrios – a atitude faz a diferença na recuperação.
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  652. A ATITUDE É A RESPOSTA
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  654. As atitudes são tanto um caminho para uma recuperação saudável e feliz como o caminho para a recaída. Tão simples quanto isso. Isto não é de maneira nenhuma uma idéia nova. Os antigos gregos compreenderam-no. Norman Vicent Peale mudou as vidas de milhares de pessoas sugerindo o poder do pensamento positivo. Earl Nightingale disse-nos: “Nós nos tornamos, literalmente, naquilo em que pensamos na maior parte do tempo”. Infelizmente aqueles que entre nós estão se recuperando da dependência química, com demasiada frequência sofrem do que os membros de AA chamam pensamento destrutivo.. O pensamento destrutivo é uma má atitude. E ser negativo e se sentir culpado demonstra estar cronicamente insatisfeito e é uma atitude traiçoeira.
  655. As nossas más atitudes podem enganar toda a vizinhança, mas a arrogância e o falso orgulho levam-nos a acreditar que os nossos pensamentos e ações destrutivas são tão doces quanto as flores da Primavera. E com certeza acreditamos que o outro está errado!
  656. Este é o outro elemento do pensamento destrutivo. Tornamo-nos peritos em inventariar o próximo enquanto permanecemos cegos aos nossos próprios defeitos.
  657. O pensamento destrutivo é um dos maiores sintomas da dependência química. Todos nós sofremos disso uma vez por outra e não passa com 30 dias de tratamento. Até podemos nos despedaçar, mesmo quando sóbrios – destruindo a nossa recuperação.
  658. Os 40% que “escorregam” para uma recaída crônica são pensadores destrutivos por excelência. Cada um de nós deve examinar o seu próprio pensamento. Seremos a nossa atitude positiva e construtiva ou praticaremos pensamentos destrutivos? Andamos alimentando a recaída com atitudes negativas? Estaremos a “pendurar-nos” na sobriedade com os dentes cerrados e uma infelicidade violenta?
  659. Para conseguirmos uma recuperação bem sucedida é preciso sentir-se bem mental e fisicamente, precisamos ter as cabeças no lugar com um pensamento claro e racional. Para conseguirmos isso temos de reconhecer os nossos padrões de pensamento destrutivo e aprender maneiras de mudar esses padrões negativos em padrões positivos.
  660. Existem quatro denominadores comuns que parecem caracterizar as pessoas que voltam a
  661. “escorregar” na dependência química. Estas quatro atitudes especificam, podem aparecer durante qualquer período do processo de recuperação, mesmo depois de vários anos de sobriedade bem sucedida, mas tem um papel primordial durante os primeiros meses críticos de sobriedade.
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  669. Estas atitudes são muitas vezes a causa da recaída que ocorre durante o primeiro ano depois do tratamento. Uma pessoa pode terminar um programa de tratamento com êxito e mesmo assim
  670. continuar a ser um pensador destrutivo. Porque, semanas de tratamento intensivo é apenas o começo da recuperação. A recuperação é um processo. Leva tempo e esforço. A recuperação continua além do tratamento à medida que trabalhamos para desenvolver atitudes positivas no mundo que nos rodeia assim como melhoramos os relacionamentos e recuperamos a saúde. A recuperação é dinâmica. É o processo de mudança, crescimento e amadurecimento. Para nós, a recuperação é a vida.
  671. Portanto vamos olhar mais de perto para as atitudes negativas que podem impedir a recuperação de seguir no seu bom caminho.
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  673. CONVERSA FIADA
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  675. Fyodor Dostoyevsky, o escritor russo disse uma vez que: “Fingir tão facilmente coexiste com sentimento sincero”.
  676. As suas palavras descrevem habitualmente um fenômeno comum entre as pessoas que estão em tratamento da dependência química. O fenômeno chama-se conversa fiada é um exemplo de primeira importância do pensamento destrutivo. A conversa fiada é fazer afirmações que não são sinceras. É dizer aos outros aquilo que eles querem ouvir. É condescendência superficial – um logro para sermos bem vistos.
  677. Conversa fiada é diferente da mentira. Quando mentimos, estamos cometendo uma fraude total. Sabemos que estamos faltando com a verdade e esperamos não ser apanhados. A conversa fiada se parece mais com um pensamento daquilo que se deseja: No mínimo, só acreditamos em metade daquilo que estamos dizendo. Algumas vezes somos totalmente sinceros – pelo menos nessa altura. Mas falta-nos sequencia. É só conversa e nada de ação. E isso é o que torna perigosa, a conversa fiada para pessoas em recuperação. Nos sentamos, mexemos os lábios desejando que as nossas palavras se tornem verdade. Mas a conversa de nada vale. A recuperação exige ação! Mudança! Compromisso! Trabalho!
  678. A conversa fiada é um perigo para sobriedade porque somos suficientemente ingênuos para acreditar que ao repetir as palavras e os slogans certos podemos adequadamente substituir o trabalho, tantas vezes doloroso e difícil, de olharmos para dentro de nós mesmos e mudarmos e de crenças e comportamentos errados que tornaram as nossas vidas desgovernadas.
  679. A conversa fiada não resulta. Poderemos ser capazes de enganar o nosso conselheiro, a mulher, o patrão, os amigos, a assistente social, com as nossas fluentes palavras, mas a menos que secundemos essas palavras com ação sincera, teremos que encarar a possibilidade mais provável da recaída!
  680. Certas frases feitas são características da conversa fiada:
  681. - Prometo não tornar a fazer.
  682. - Desta vez aprendi a lição.
  683. - Eu acho os AA maravilhosos, mas...
  684. - Juro que ser pego guiando bêbado foi a melhor coisa que me aconteceu.
  685. - Sei que nunca mais voltarei a beber.
  686. - Eu vou deixar de (fumar, dirigir sem carta, comer porcarias, perder a cabeça, etc) assim que...
  687. - Farei tudo o que disser, desde que (não me despeça, não tenha que me divorciar, não seja preso).
  688. Lembre-se, normalmente acreditamos na nossa própria conversa fiada. Continuidade é o que distingue a falsidade da conversa fiada da sinceridade, do verdadeiro compromisso para com a recuperação. Não é o que dizemos que conta. Mas sim aquilo que fazemos.
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  694. Devemos nos fazer as seguintes perguntas: “Será que faço listas das coisas que devo fazer ou maneiras de me melhorar, contudo, falho no cumprimento das coisas que tenho em lista? Será que no meu íntimo acredito que, embora outras pessoas quimicamente dependentes precisem seguir os requisitos de um programa de tratamento para se recuperar esses requisitos na verdade não se
  695. aplicam à minha situação? Será que as vezes me ouço repetindo certas frases e slogans acerca da minha recuperação na esperança de ganhar aprovação das pessoas que me odeiam? Será que faço promessas para melhorar o meu comportamento e que essas promessas nunca se realizam?”
  696. Se a resposta é sim, mesmo que seja só a uma destas perguntas, estamos a saboreando a nossa recuperação e entrando na conversa fiada.
  697. O que é que nos leva a nos sabotar desta maneira? Por uma única razão. Porque tendemos a agradar os outros. Queremos ganhar a aprovação dos nossos conselheiros, maridos (esposas) e família, dizendo-lhes aquilo que pensamos que eles querem ouvir. Torna-os felizes e nos tratam bem, e isso nos faz felizes – pelo menos em curto prazo.
  698. Há outra razão mais egoísta para usarmos a conversa fiada. É um processo eficaz para que as outras pessoas não nos aborreçam. Se dissermos o slogan certo, podemos acalmar o conselheiro, o juiz, a mulher ou o marido, que continuam nos censurando.
  699. A chave da conversa fiada é a falta de sinceridade. Enganamos os outros muitas vezes e isso nos conduz a outro dos nossos problemas de atitude, a qual nomeamos grandiosidade.
  700. A grandiosidade é o outro lado da baixa autoestima. É caracterizada por um sentido exagerado do “eu”, e aqueles que entre nós sofrem disso, possuem um sentido embaraçosamente irreal da sua importância, talentos e habilidades. Nos comportamos como se fôssemos imunes às leis do Universo que governam os simples mortais. Bem, nos achamos diferentes.
  701. É a nossa crença grandiosa, de que as outras pessoas são demasiadas estúpidas para reconhecerem a nossa falta de sinceridade, que nos leva a continuar o jogo da conversa fiada.
  702. Grandiosidade é:
  703. - Acreditar que podemos frequentar bares escuros e fumacentos, sem ser tentados a beber ou usar.
  704. - Acreditar que podemos continuar a andar por ai com os nossos velhos amigos do “uso”, sem sermos pegos outra vez na adoção.
  705. - Acreditar que há pessoas que podem precisar da muleta dos AA ou NA, mas que nós não precisamos de nenhuma dessas tretas da espiritualidade.
  706. - Acreditar que uma cerveja ou um “passa” não vais nos fazer perder o controle.
  707. - Acreditar que podemos voltar a beber em sociedade ou a usar drogas outra vez de forma controlada.
  708. - Acreditar que somos melhores, mais espertos ou dignos que os outros.
  709. - Acreditar que as regras são para os tolos e não para nós.
  710. - A crença irreal de que, de uma maneira ou de outra, podemos magnificamente ultrapassar as probabilidades de continuar preguiçosos e exigentes, sem arriscar a recaída.
  711. - A soma de nossos pensamentos destrutivos.
  712. Devemos nos fazer as seguintes perguntas: “Será que pretendo frequentar bares porque sei que sou suficientemente forte para não ser tentado a beber outra vez? Será que provavelmente posso voltar a beber em sociedade ou usar outra droga moderadamente se eu quiser? Será que penso que todas essas reuniões de Doze Passos e sessões de acompanhamento com o meu conselheiro são apenas tempo perdido, não valendo à pena? Será que estar rodeados de todos esses alcoólicos, adictos e falidos em AA e NA e nos grupos de acompanhamento atrasa a minha caminhada?”
  713. Se respondermos sim, mesmo que seja a uma destas perguntas, estamos sabotando a nossa recuperação com uma grandiosidade irreal.
  714. É um paradoxo, mas os alcoólicos e outros adictos podem ser grandiosos mesmo sofrendo de um complexo de inferioridade. Dependendo de como nos sentimos e da situação, pulamos entre o falso orgulho e um ego inchado de grandiosidade ou uma depressão destruidora e baixa auto0estima.
  715. Isto porque o que distingue tanto a baixa autoestima como a grandiosidade é o desprezo. Com baixa autoestima, o desprezo volta-se para dentro de nós; com grandiosidade, nós visamos o exterior, as outras pessoas e as regras da sociedade e da natureza.
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  720. Quando começamos a pensar que as regras não são para nós, desenvolvemos outro problema de atitude. A facilitação.
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  722. FACILITAÇÃO
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  724. É sábado de manhã e o sol brilha; os pássaros cantam, e está um dia lindo. Então que mal poderá fazer não ir a uma reunião de acompanhamento com o nosso conselheiro no centro de tratamento? Será que aconteceu alguma coisa de mal por não termos ido à reunião de AA da semana passada? Além disso, num dia como o de hoje, é provavelmente mais saudável estar ao ar livre e tomar sol, do que enfiados num estúpido edifício. Quero dizer, qual é a importância desta coisa do “acompanhamento”? A importância é que o sucesso da nossa recuperação depende em muito, do nosso empenho em continuarmos ativos no nosso “acompanhamento”. Quando começamos a faltar ao que está marcado, a fugir das reuniões e a arranjar desculpas, quando nos tornamos menos meticulosos no nosso empenho para com a recuperação, estamos entrando na facilitação. A facilitação é uma forma de se manipular. Começa devagar, mas pode rapidamente se tornar uma total recaída. O meu amigo Alexandre é um bom exemplo de alguém que está no autoengano.
  725. O Alexandre deu entrada num programa de tratamento porque sua vida estava se desfazendo devido ao álcool e outras drogas. Ele saiu do tratamento como um homem novo, “a maneira”, cheio de entusiasmo e desejando um estilo de vida sóbrio. De fato, ele estava entusiasmado com a sobriedade e esperava um dia vir a ser conselheiro para poder ajudar outras pessoas. Decidiu ter aulas à noite, de Psicologia, na universidade local.
  726. As exigências de emprego e da família não lhe deixavam muito tempo para o trabalho de casa, principalmente quando três noites por semana era devotada às reuniões do AA. Alguma coisa acabaria sendo demais. Pensando que podia tirar o mesmo proveito das aulas de psicologia como dos AA, o Alexandre passou a ir somente a uma reunião dos AA por semana. Depois deixou de ir, mas mesmo assim tentou ler o seu Texto Básico mais ou menos uma vez por semana. Cerca de um mês depois, a mulher do Alexandre, a Valdicleia, começou a lamentar-se do pouco tempo que passavam juntos e, então, o Alexandre surpreendeu-a cancelando a sessão de aconselhamento familiar, no centro de tratamento, levando-a ao melhor restaurante da cidade.
  727. De fato, o Alexandre sentiu-se bastante culpado por passar tantas noites fora de casa e assim esperava que aquele jantar espetacular pudesse por fim às queixas da Valdicleia. Ele tinha a certeza absoluta de que ela estava desconfiada, mas também não pensava que estivesse fazendo nada de tão errado.
  728. Ele acreditava ter o direito de ver os seus velhos amigos? E conseguia estar quase totalmente limpo e bem. Ele poderia até ter “cheirado” cocaína todas as noites, mas recusou todas as vezes que lhe ofereceram. Fumou apenas um baseado. Que mal podia fazer? A maconha era praticamente inofensiva. Ele nem sequer chegou a ficar verdadeiramente “louco”.
  729. Que mal podia fazer?
  730. No espaço de três meses, o Alexandre não estava seguindo a programação. Ele facilitou com uma sucessão de pequenas mentiras, o resultado foi a recaída total.
  731. O autoengano é traiçoeiro. As primeiras mentiras parecem pequenas e inocentes, de modo algum causam preocupação. E nós arranjamos sempre uma boa explicação para o nosso desvio. A menos que reconheçamos o autoengano como um pensamento destrutivo e, inevitavelmente conduz ao desastre.
  732. Devemos nos perguntar:
  733. - Deixei de ir a uma sessão de aconselhamento ou a uma reunião de AA porque estava muito cansado e ocupado ou porque achei que estava indo tão bem que não precisava?
  734. - Bebi um copo ou usei outra droga ainda que só uma vez?
  735. - Estou ignorando certas instruções do meu conselheiro ou médico que digam respeito à dieta, exercício, controle de stress, trabalhos de casa, etc, por que dão muito trabalho?
  736.  
  737.  
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  739.  
  740. - Deixei de fazer regularmente o meu inventário moral ou evitei ter uma ação positiva para corrigir os meus defeitos de caráter?
  741. Se respondermos positivamente a uma que seja, destas perguntas, estamos sabotando a nossa recuperação.
  742. A chave da facilitação é desculpar-se.
  743. Podemos nos tornar peritos em criar este tipo de conversa fiada, onde há grandiosidade e nossas manipulações formam uma péssima atitude que coloca em risco a nossa recuperação.
  744. Um exemplo do nosso pensamento destrutivo pode soar assim: “Penso que os Alcoólicos Anônimos são formidáveis (conversa fiada), mas não sou do gênero de precisar de todo esse apoio de grupo para permanecer sóbrio (grandiosidade). Além disso, eu preciso de todo o meu tempo disponível para estar com a minha família, para compensá-los do abandono que causei (arranjando desculpas).”
  745. No discurso normal dos acontecimentos, a família e os amigos começarão a notar “o autoengano”. Ficarão preocupados e começarão a nos censurar, o que fará aparecer a nossa rebeldia.
  746.  
  747. REBELDIA
  748.  
  749. Os alcoólicos e outros adictos são um grupo rebelde. Não suportamos que nos digam o que temos de fazer. No momento em que alguém começa a nos dar ordens (mesmo quando estão certos, mesmo que seja para o nosso bem), ficamos com raiva.
  750. Para nós, a rebeldia é tão normal como respirar. Parece que temos uma tendência nata para resistir e nos opor à autoridade. E para nós, a autoridade pode ser qualquer um, incluindo a nossa mulher, os nossos filhos, os nossos pais, o nosso conselheiro, o nosso “padrinho” dos AA ou NA e qualquer pessoa que tenta influenciar nosso comportamento.
  751. Talvez a nossa rebeldia venha em parte da nossa grandiosidade. Queremos ter sempre razão. A nossa grandiosidade nos engana, nos fazendo acreditar que temos todas as respostas, que tudo correrá bem se todos fizerem as coisas à nossa maneira.
  752. Claro quem nem sempre mostramos abertamente a nossa rebeldia. Podemos mesmo nos mostrar perfeitamente agradáveis e alegres por fora, mas por dentro estamos mal e arquitetando planos para virar a situação e fazer exatamente o que queremos.
  753. Por causa da nossa rebeldia e grandiosidade, não somos muito bons a receber sugestões dos nossos conselheiros e outras pessoas em recuperação que conhecem o “esquema” e que poderiam nos ajudar, se ouvíssemos em vez de filtrar tudo através dos nossos egos inchados. Deveríamos nos perguntar:
  754. - Sinto-me como se as outras pessoas estivessem sempre tentando governar a minha vida?
  755. - Faço promessas no sentido de melhorar o meu comportamento, quando na verdade não tenho intenção alguma de mudar?
  756. - Será que às vezes penso que o meu conselheiro ou padrinho é doido ou pior ainda?
  757. Se respondermos afirmativamente a uma que seja destas perguntas estamos então sabotando a nossa recuperação com rebeldia. A chave da rebeldia é a imaturidade. Em muitos aspectos somos como crianças grandes. Queremos ser o centro das atenções e que todas as nossas necessidades sejam imediatamente satisfeitas. Ficamos zangados e ressentidos quando as pessoas que nos rodeiam não procedem como nós queremos. Começamos a jogar sobre elas a responsabilidade de nossos problemas e despendemos uma enorme quantidade de energia tentando muda-las, a fazer tudo certo, para nos tornarem felizes. Isto é o que torna a rebeldia tão perigosa para a nossa recuperação. Estamos tão ocupados tentando controlar e mudar os outros de um modo tão arrogante, que não temos a energia ou visão necessária para mudarmos a nós mesmos e ao nosso pensamento destrutivo.
  758. Uma boa atitude é a resposta. A recuperação floresce quando conduzimos sem medo os nossos pensamentos e ações, quando nos dedicamos a reconhecer e eliminar os hábitos destrutivos da conversa fiada, da grandiosidade, do autoengano e da rebeldia. Estas quatro qualidades de
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  763. comportamento promovem crenças destrutivas que podem tornar as nossas vidas desgovernadas e infelizes, mesmo quando estamos sóbrios.
  764. Mas podemos mudar! Podemos desafiar o nosso pensamento destrutivo e aprender novas e saudáveis respostas à vida. Podemos endireitar as nossas cabeças e aceitar nosso lugar.
  765.  
  766. DESAFIANDO O NOSSO PENSAMENTO DESTRUTIVO
  767.  
  768. São necessárias pelo menos três coisas para desafiar o pensamento destrutivo.
  769.  
  770. CONSCIÊNCIA
  771. Não podemos mudar uma má atitude se não nos dermos conta dela, e enquanto enterramos as nossas cabeças na areia da grandiosidade e rebeldia, nunca reconheceremos os nossos próprios defeitos de caráter. O Quarto Passo dos Alcoólicos Anônimos é um modo excelente para aumentar a nossa consciência dos nossos comportamentos.
  772. A consciência pode ser dolorosa. Temos uma tendência natural para negar as nossas imperfeições, proteger nosso ego, nos defender da horrível verdade dos nossos erros. Mas sem estarmos conscientes nunca poderemos crescer ou melhorar.
  773. Então vamos não ter medo do nosso inventário moral! Uma vez passada a dor inicial da busca dentro de nós, podemos até achar maravilhosamente libertadora a consciência de nós mesmos.
  774.  
  775. COMPROMISSO
  776.  
  777. Agora já não é tempo de conversa fiada superficial. A mudança positiva requer trabalho, esforço e prática. Devemos procurar conselho sensato num terapeuta hábil, num padrinho digno de confiança numa irmandade que se preocupa.
  778. Devemos examinar os nossos planos para melhorarmos. Estaremos tentando nos enganar? Tentando encontrar o caminho mais fácil? A mudança não acontece facilmente, mas nós valemos este esforço. O compromisso sincero é vital para nossa recuperação!
  779.  
  780. AÇÃO
  781. A consciência não tem significado a menos que tomemos uma ação positiva e construtiva para melhorar nossas fraquezas e defendermos as nossas forças. Possuímos uma habilidade notável para mudar, contudo a visão de nós mesmos é muitas vezes seguida de inatividade. Por quê?
  782. O medo pode nos atrapalhar; medo do desconhecido, medo de nos enfrentarmos. “Pode doer” dizemos. “A mudança apavora-me”. A preguiça é um grande bloqueio. “Para que incomodar-me?“ perguntamos. “Até aqui sobrevivi sem mudar”. E a grandiosidade juntamente com a baixa autoestima nos mantém presos a nossa rotina. “Eu não preciso mudar”, insistimos com medo de admitir a nossa fraqueza. “Não se passa nada de mal comigo!” A ação marca a diferença entre o sucesso e o fracasso. Se estivermos prontos para mudar, para melhorar, e crescer, é agora tempo de fazê-lo.
  783.  
  784. TRANSFORMAÇÕES
  785. O ponto mais importante que devemos ter em conta acerca do pensamento destrutivo é este:
  786. - Podemos mudar as nossas atitudes.
  787. - Podemos ser rabugentos ou positivos. “A escolha é nossa”. Ao eliminar o pensamento destrutivo, estamos pensando claramente e nos envolvemos na recuperação.
  788. Já aprendemos quais as chaves da recaída – insinceridade, desprezo, desculpas e imaturidade.
  789. Estas características da personalidade são obstáculos a nossa procura da felicidade, da maturidade.
  790. Mas estamos alerta, empenhados, podemos transformar estes obstáculos nos alicerces da recuperação. Podemos contrabalancear estes aspectos negativos, da nossa personalidade, nos esforçando ativamente na direção dos opostos positivos destas características.
  791.  
  792.  
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  796. Vejamos os opostos positivos que podem intensificar a nossa recuperação. De um lado estão as características negativas que conduzem a recaída, do outro lado vemos os opostos positivos, os traços de personalidade que assinalam uma atitude vencedora e uma recuperação saudável.
  797.  
  798.  
  799. SINTOMAS DE RECAÍDA X SINAIS DE RECUPERAÇÃO
  800.  
  801. CONVERSA FIADA
  802. COMPROMISSO
  803. Chave: Falta de sinceridade
  804. Chave: Sinceridade
  805. Falso
  806. Autêntico
  807. Enganador
  808. Honesto
  809. Exagerado
  810. Digno de confiança
  811. Inconstante
  812. Dedicado
  813. GRANDIOSIDADE
  814. AUTOCONFIANÇA
  815. Chave: desprezo
  816. Chave: Respeito
  817. Barulhento, o que fala alto
  818. Prudente, aquele que sabe ouvir
  819.  
  820.  
  821. Ignorante
  822. Dedicado, o que aprende
  823. O que se odeia
  824. O que gosta de si
  825. Arrogante
  826. Humilde
  827. Fantasista
  828. Realista
  829. FACILITANDO
  830. VIGILANTE
  831. Chave: O que se desculpa
  832. Chave: De confiança
  833. Irresponsável
  834. Responsável
  835. Preguiçoso
  836. Ativo
  837. O que não é de confiança
  838. Escrupuloso
  839. Impulsivo
  840. Autocontrolado
  841. REBELDIA
  842. ACEITAÇÃO
  843. Chave: Imaturidade
  844. Chave: Maturidade
  845. Teimoso
  846. Receptivo
  847. Egocêntrico
  848. O que se preocupa
  849. Amedrontado
  850. Aberto a mudança
  851. O que resiste
  852. O que se rende
  853.  
  854. Agora olhemos para nós próprios, de perto e honestamente para os nossos mais íntimos pensamentos e sentimentos. Qual a lista de características de personalidade que melhor descreve o que gostaríamos de ser? Qual a lista que melhor descreve como fomos e como estamos agora? Fomos ou estamos sendo enganadores, arrogantes, irresponsáveis e argumentativos? Será o nosso pensamento claro e racional ou vacilamos no pântano do pensamento destrutivo?
  855.  
  856. AGORA É O MOMENTO PARA UM PENSAMENTO CLARO
  857.  
  858. Um pensamento claro é um sinal de recuperação. O pensamento destrutivo assinala a recaída. Os que têm pensamentos claros estão alerta. Admitem prontamente que suas percepções e comportamentos foram assombrados e confundidos pela sua doença ativa. Não tem medo ou vergonha em admitir suas faltas ou fraquezas porque sabem que possuem o potencial para transformar as suas falhas em opostos positivos que podem potencializar a sua recuperação. Os que têm o pensamento claro são honestos – não apenas com os outros. São honestos consigo próprio. São honestos quanto à sua doença e quanto ao tempo e esforço que a recuperação positiva requer. Sabem que não tem todas as respostas e aceitam que não podem estar sempre certos.
  859. Os que têm pensamento destrutivo não estão alerta. Sentem-se como vítimas, negando o papel que o comportamento tem nos seus problemas. Estão, cheios de egoísmo, de costas voltada
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  861.  
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  863.  
  864. s para as necessidades dos outros e sem se darem conta do impacto do seu comportamento naqueles de quem mais gostam.
  865. Os que têm pensamento claro aceitam a responsabilidade pela sua recuperação.
  866. Os que têm pensamento destrutivo culpam os outros pelos seus problemas. Os que têm pensamento positivo têm mente aberta.
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  870. Os que têm pensamento destrutivo são fechados, assustados e estão na defensiva.
  871. O que temos nós? Temos um pensamento claro ou temos um pensamento destrutivo? Podemos concordar ou discordar dessas afirmações?
  872. Tenho orgulho em poder falar sobre assuntos delicados e/ou difíceis.
  873. O aconselhamento para mim falhou porque descobri que era mais esperto que o meu conselheiro. Não preciso de um grupo de apoio para permanecer limpo, porque aprendi tudo aquilo que precisava e assim poderei detectar qualquer sinal de problema que apareça.
  874. Metade dos meus problemas seria resolvido se os outros me deixassem em paz e me tratassem bem.
  875. Poderíamos concordar com apenas uma destas afirmações?
  876. Poderíamos reconhecer os sintomas da insinceridade, da arrogância, da racionalização e do egocentrismo implícitos nestas afirmações?
  877. LEMBREM-SE: o primeiro e mais importante passo para um pensamento claro é estar consciente.
  878. Em recuperação, procuramos e andamos alerta todos os dias da nossa vida, abrindo-nos a novas experiências e a métodos saudáveis de lidar com os problemas da vida. Não corremos nem os escondemos, não mentimos nem somos fanfarrões. Humildemente aceitamos a responsabilidade pelo nosso próprio bem estar, vigilantemente examinando o nosso comportamento diário a procura de sintomas de pensamento destrutivo e recaída.
  879. Tudo aquilo que realmente precisamos fazer para termos um pensamento claro e aprender a pormo-nos algumas questões:
  880. “Tenho sido honesto?”.
  881. “Tenho sido realista?”.
  882. “Tenho sido responsável pelas minhas ações?”.
  883. “Tenho aceitado e sido aberto?”.
  884. Estas questões desafiam o pensamento destrutivo. Se pudermos responder sim, ou tivermos vontade de procurar o conselho sensato de alguém experiente em pensamento claro, temos o caminho sólido de que precisamos para a recuperação.
  885. Estando alerta, podemos nos entregar a uma ação positiva. Podemos transformar-nos, a cada dia. Podemos nos recuperar!
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  924. GRANDIOSIDADE
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  938. É uma raiva que fecha o assunto e deixa o adicto mergulhado em controvérsias que cria.
  939. O adicto teme em não ter a quantidade de drogas necessárias ou disponíveis diante de sua voracidade, mas não tem medo da droga em si porque ele provou ser um servo fiel.
  940. Porém tem medo das pessoas bem intencionadas porque elas podem cortar seu suprimento através de algum truque.
  941. A solidão e o aborrecimento são alimentados pela grandiosidade como exemplo das coisas horríveis que podem acontecer ao adicto que tenta parar de usar. Eles são vistos como os falsos presentes que os “intrometidos” bem intencionados podem prometer se ele ou ela deixar de usar.
  942. A grandiosidade prega que tudo aquilo que merece ser feito deve ser feito em excesso. O excesso impele o adicto grandioso a ir até o fim das suas compulsões e obsessões, que podem ser vistas por meio da impaciência, do ciúme, impulso, pressão, desregramento, stress e emoções como raiva, medo e ódio.
  943. O orgulho do alcoólico onipotente é todo voltado pra si mesmo. Ele entra em parafuso com atitudes e pontos de vista. O super orgulhoso DQ não se preocupa ou partilha com os outros. O orgulho doentio ou a ele ou ela intolerante, rude ao ceticismo é incapaz de ouvir conselhos. Ele ou ela não só não concorda como é desagradável.
  944. Os adictos grandiosos não lidam bem com os ressentimentos. Eles estão numa concha onde a ajuda nunca lhes chega, preocupados com os constantes ensaios das retribuições que estão plantando. Eles culpam qualquer dor resultante dos seus ressentimentos pelos outros. A sua determinação em se vingarem de todas as pessoas mantém o frenesi de usar cada vez mais drogas.
  945. A maioria destas emoções destrutivas leva ao pensamento negativo. Para o adicto arrogante, todas as pessoas estão erradas e não tem nunca o direito de estar certas. Um adicto como este, sabe que não há dois lados numa discussão porque sua grandiosidade sempre cria monólogos, mantendo complexo de mandão e teimoso como uma mula, sempre querendo maior atenção. A grandiosidade pode ter uma maior ameaça à recuperação do que a raiva ou o ressentimento.
  946. As idéias grandiosas são muito fáceis de adquirir. Os homens e mulheres adictos vivem num mundo onde se dão prêmios às pessoas espertas. As revistas, jornais e televisão dão muito tempo e espaço à teoria de que as pessoas espertas merecem o melhor da vida. Boas roupas, viagens exóticas,
  947. automóveis rápidos, jóias que brilham, e jantares luxuosos ficam assim tão facilmente acessíveis como bebidas alcoólicas ou outras drogas. Para o alcoólico grandioso, tudo isto fica a mão de semear através das fantasias oferecidas pelo uso de drogas.
  948.  
  949. CARACTERÍSTICAS DA GRANDIOSIDADE
  950.  
  951. A principal origem da grandiosidade é a imaturidade, a incapacidade de crescer e a recusa de esquecer a “proteção” na infância onde todas suas exigências ou necessidades eram concedidas.
  952. Em função disso, existe a seguinte expressão favorita entre adictos em recuperação que é: “Os primeiros 35 anos da minha infância quase me mataram”.
  953. O sujeito “Sua Majestade, o Bebê”, foi introduzido pela primeira vez por Freud. Ele descreveu a criança como um monarca em três áreas: ele sabe que pode adquirir o que quer através de ser barulhento; tem baixa resistência à frustração e, portanto se recusa a se submeter e faz tudo correndo. Estes traços conduzem naturalmente a comportamentos compulsivos e excessivos pela vida a fora. Sentimentos grandiosos não deixam o bebê se esquecer dos tempos tirânicos da infância, mas exige uma forte recusa e arrogância na admissão de sua infantilidade.
  954. A grandiosidade é muito baseada no egocentrismo. Os seus desejos e prazeres vêm primeiro, para o DQ grandioso, e cada sucesso aumenta este egoísmo. Qualquer coisa faz iniciar mais um episódio de egoísmo e auto importância do DQ e descobrir maneiras engenhosas para impedir que os outros descubram garrafas escondidas e os truques para impedir que eles descubram as quantidades de drogas ou álcool que está usando. Cada adicto arrogante se imagina esperto demais e valoriza demais esse conhecimento.
  955.  
  956.  
  957.  
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  959. Mesmo o sentimento de estar sendo observado serve para aumentar o seu ego; é a prova para os adictos, da sua importância para os outros. Quando os outros começam a “vigiar” ou a ser “abusivo” acerca do consumo, a grandiosidade diz ao adicto que eles são “falsos amigos” acreditando que assim podem viver sem o carinho deles.
  960. “Não preciso do afeto deles. Sou capaz de viver bem sem eles”. Quando a família, amigos e até médicos ou terapeutas, desistem com desgosto e considera a pessoa dependente uma causa perdida, o adicto grandioso sabe que sua superioridade foi provada.
  961. É óbvio que a grandiosidade vai dar ênfase ao sentimento de ser único que consome os adictos. Uma adicção em conjunto com uma obsessão leva os que usam SPA a considerarem-se diferentes. Eles muitas vezes sentem pena de todos os outros que levam uma vida chata e aborrecida sem usarem nada.
  962. “Eu ficar sóbrio? Ser uma cópia destas pessoas tristes por ai?”
  963. A grandiosidade é a causa principal da racionalização. Ela oferece à mente consciente as respostas a cada pedido para deixar de usar drogas. O pensamento grandioso tem desculpas já feitas, álibis, explicações, sempre negações como resposta. Este modo de pensar limitado é a marca da grandiosidade. O adicto grandioso recusa-se a aceitar a idéia de que não consegue controlar o seu uso de álcool e drogas. As respostas deste pensador onipotente aos doze passos são típicas. Eles não aceitam a idéia de serem impotentes sobre o uso compulsivo e de terem as suas vidas desgovernadas. Como eles concebem que existe um Poder Superior a eles mesmos, que há qualquer insanidade no seu pensamento, ou que as suas vidas deveriam ser entregues aos cuidados de um Deus de qualquer tipo?
  964. A grandiosidade não promove normalmente uma reação violenta e de raiva em forma de rebeldia às sugestões de que o Bebê deve desistir das suas drogas. Bater com os punhos na mesa e exclamações profanas normalmente dá lugar a uma calma, mas firme recusa de ouvir conselhos. É suficiente para o adicto na ativa, se considerar superior, de considerar os que querem ajudar, bem
  965. intencionados como ignorantes, inexperientes e mal guiados. A cantiga “My Way” poderia ter sido escrita para estes grandiosos.
  966. A atitude superior do Rei Bebê diz: “Estou bem. Outros estão muito pior que eu. Se eu algum dia começar a usar como eles...” a grandiosidade é enganadora, habilidosa e poderosa e, mais ainda,
  967. ciumenta e paciente. A grandiosidade também ajuda outros defeitos de caráter, atitudes negativas, e emoções destrutivas.
  968.  
  969. DEFEITOS DE CARÁTER x SENTIMENTOS NEGATIVOS
  970.  
  971. Um ego muito grande relembra constantemente o adicto sobre o estigma que a sociedade pode por sobre um adicto. Uma grande parte da sociedade, ainda ignorante dos fatos acerca desta doença, é culpada de rotular o dependente químico como um caso perdido. A grandiosidade não só promove a negação como é a arma principal do adicto contra qualquer hipótese de que se renda como um sinônimo desta característica, por isso que sempre dizemos que dependência química ou adicção, é a doença da negação. O alcoólico grandioso acredita em todas estas negações tão completamente que ele ou ela confronta os sinais dos outros para parar de usar perguntando, “Porque estão mentindo sobre mim? Quem está dando toda esta informação falsa sobre mim?” A sutileza da grandiosidade e habilidosamente descrita pela citação A adicção é a única doença que diz às suas vítimas que não a tem se tornando uma arma poderosa deste grande ego.
  972. A grandiosidade facilmente consegue fechar a mente evitando que se renda e murmure para si mesmo “Não tenho pressa”.
  973. Os adictos na negação veem as frases de recuperação como se fossem tolices de criança. Ex: “Devagar se vai ao longe”, ou “Não tire conclusões precipitadas”.
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  981. A desconfiança é uma espada afiada plantada na cabeça do adicto grandioso. Ela ajuda um adicto a concluir que aqueles que insistem na sobriedade estão vendendo uma ilusão; e logo pensa: “Sou muito esperto para cair na conversa deles”.
  982. Ele ou ela reage a tudo isso, porque não consegue entender a sobriedade, porque tem medo de enfrentar a dor da abstinência, acreditando que tudo isso é “conversa mole”. “Vocês pensam mesmo que eu não sou mais do que esses Nóias que andam por ai nas ruas?”
  983. Em relação à gratidão, o adicto na ativa tem uma visão distorcida, mantendo o seguinte pensamento: “A verdade é que mereço muito mais do que o que me foi dado”.
  984. A inveja é facilmente promovida pela grandiosidade porque a pessoa com problemas por causa do uso, sempre exige mais de tudo do que ele ou ela crê ser necessário. O adicto grandioso pensa, “Eu quero o que ele tem. Mereço mais do que ele. Faço tudo melhor que ele. Ele só tem sorte”.
  985. Os adictos são pessoas de tudo ou nada, é natural que os seus sentimentos de onipotência produzam a ganância. Para o Grande Ego dos adictos, ele acredita que sempre são negadas as melhores coisas da vida. Ele ou ela não vai aceitar as segundas melhores, mas vai dizer, “Sou um líder natural e não apenas mais um”, “Ou é da minha maneira ou não vou jogar este jogo idiota do sucesso”.
  986. A raiva emerge da inveja e da ganância do adicto grandioso que viu os outros terem aquilo de que estava esperando. Os adictos arrogantes raramente aceitam as coisas e não sabem lidar com as rejeições. A sua resposta é a de beber, por tudo e por todos. A raiva do alcoólico grandioso é um luxo. É uma raiva que fecha o assunto e deixa o alcoólico afastar-se de todas as controvérsias.
  987. Os adictos temem não ter a quantidade de álcool e drogas necessárias disponível em todas as “necessidades”, não tem medo da bebida ou da droga em si mesmos porque esta provou ser um servo fiel. Eles têm medo das pessoas bem intencionadas porque elas podem conseguir tirar a oportunidade de usar.
  988. A solidão e o aborrecimento são mantidos pela grandiosidade como exemplo das coisas horríveis que podem acontecer ao adicto se o mesmo parar de usar. Eles são vistos como os falsos presentes que os “intrometidos” bem intencionados podem prometer levando o dependente a viver uma solidão e um caos de aborrecimentos por causa da abstinência.
  989. A grandiosidade prega que tudo aquilo que merece ser feito, deve ser feito em excesso. O excesso impele o adicto grandioso a ir até o fim das suas compulsões, obsessões, impaciência, ciúme, impulso, pressão, desregramento, stress e emoções como raiva, medo e ódio.
  990. O orgulho do adicto onipotente é todo voltado para si mesmo. Ele entra em parafuso com atitudes e pontos de vista. O adicto orgulhoso não tem tempo para se preocupar ou partilhar com os outros. O orgulho doentio é intolerante, rude à experiência de outra pessoa, incapaz de ouvir conselhos. Ele ou ela não só não concorda como é desagradável.
  991. Os adictos grandiosos não lidam bem com os ressentimentos. Eles estão numa concha onde a ajuda nunca pode chegar, preocupados com os constantes resultados do que plantaram. Eles culpam qualquer dor resultante dos seus ressentimentos nos outros. A sua determinação em se vingarem de todos é o que alimenta sua compulsão em usar.
  992. A maioria destas emoções destrutivas leva ao pensamento negativo. Para o adicto arrogante, todas as pessoas estão erradas e não tem nunca o direito de estarem certas. Um adicto como este sabe que não há dois lados numa discussão, afinal ele tem sempre razão.
  993. Um fator dominante na leitura da grandiosidade é a teimosia. Em qualquer conflito, a maneira de ser do adicto nunca é uma questão de opinião, mas sim um fato e uma realidade. Apesar dos outros saberem que ele ou ela muitas vezes está errado, o adicto nunca põe em dúvida o seu ponto de vista.
  994.  
  995. SUBMISSÃO x RENDIÇÃO
  996.  
  997. Os adictos desafiadores tem toda confiança do mundo no que diz respeito a sua capacidade de resistir a todos os esforços tentam forçá-lo a parar de usar. Em recuperação, muitos adictos referem-se a esta atitude como a minha “armadura”. Esta faz se sentirem invencíveis. Eles acreditam que, enquanto recusarem deixar de usar, nada de importante pode ser retirado. Independentemente desta
  998.  
  999.  
  1000.  
  1001. fanfarronice verbalizada pelos adictos grandiosos que lhes confirma a sua onipotência, as suas mentes estão sempre tropeçando num conflito entre o seu consciente e o inconsciente. O inconsciente é o depósito da grandiosidade. O consciente é o único refúgio, para a realidade, pode muitas vezes admitir o horror das recaídas. Não pode negar a dor assustadora e as alucinações que causam suas dúvidas sobre poder usar de forma controlada, mas nos períodos mais calmos que seguem estas recaídas (cria crenças), a grandiosidade no adicto toma controle assegurando que a dor foi o resultado de um pequeno erro na forma que usou e não porque usou. “Sendo assim da próxima vez será diferente se tomar um pouco mais de cuidado”.
  1002. A grandiosidade é aquela autoridade máxima, que requer na dor sempre uma “segunda opinião”. Existe uma “inversão da decisão” para muitos alcoólicos que pedem ajuda no seu pico de agonia e desespero. Os amigos interpretam esta ação como uma rendição, mas os adictos são famosos por terem um plano B e memórias curtas. A grandiosidade cega as memórias da dor libertando a “alegria”. O grande ego nos avisa para não sermos fracos e deixar que tenham poder sobre nós. Esses puritanos iriam proibir todos os divertimentos do mundo, diz a grandiosidade.
  1003. Há uma rápida mudança de atitude e familiar na recuperação da adicção. Muitos dos que estão a caminho da sua primeira reunião de Anônimos, repetidamente alternaram entre “eu preciso de ajuda” e “tenho muita pena, mas eu não vou para frente com isto”.
  1004. A principal razão pela qual os adictos desistem temporariamente e podem apagar-se e parecer aparentemente entregues é porque a grandiosidade permite apenas um ato de submissão e não de rendição, mas submeter-se é somente uma forma aparente de aceitação perante a dor, um disfarce de aceitação, não é sequer um sentimento de resignação a um cruel destino. Toma lugar apenas na superfície da consciência e é só uma escolha de “uma maneira mais fácil e suave”.
  1005. Ao submeter-se, o adicto pode conscientemente sentir a necessidade de ajuda, mas estas medidas normalmente levam o adicto ao uso e nunca o deixam.
  1006. Este equívoco pode desencorajar amigos e a família, mas a grandiosidade leva o adicto a pensar, “boa jogada essa que os tirei das minhas costas”. O fato de haver um constante conflito na mente do adicto entre o consciente e o inconsciente dá razão a esperança de que a grandiosidade pode ser diminuída com sucesso.
  1007. A grandiosidade fecha a mente e inflama a intolerância das outras pessoas, assim como das suas idéias e opiniões, qualquer indecisão da parte do adicto arrogante é progressiva. É um passo na direção da realidade se o adicto grandioso começar a dar como resposta:
  1008. -“Eu não sei, ‘’Eu não percebo,’’ ou, ‘’Estou mudando minha maneira de pensar.’’
  1009. Um sinal de crescimento em tolerância mostra muitas vezes expressões de culpa por comportamento adictivo. Se a culpa pode ser temperada, a consciência da responsabilidade pode começar. Este crescimento pode levar aqueles que têm Egos doentes a entender que cometer erros não é catastrófico desde que ele ou ela admita sua responsabilidade e esteja disposto a fazer reparações assim como corrigir esses traços que podem resultar numa repetição destes mesmos erros.
  1010. Reduzir no adicto o sentimento de que ele ou ela é diferente pode ajudar a que ele se identifique com outros adictos em recuperação. Uma palavra deve ser acentuada constantemente como resposta aos comentários: “Eu nunca fiz isso”. “Se continuar usando vou fazer novamente”, essa consciência vai fazendo diminuir a grandiosidade.
  1011. Qualquer passo que nos leve ao desejo de ouvir a outro, é um ataque a nossa grandiosidade. Só sendo capazes de ouvir poderemos mudar o adicto onipotente, chegando ao autoconhecimento. O progresso em ouvir é um sinal de que há anos não éramos capazes de nos enxergar de fato como
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  1016. somos, trazendo a vontade de partilhar. Isto nos traz a alegria de sentir carinho, de dar e receber, e de tocar os outros com ideias e amor. Vai nos dar o presente que é exercitar boas emoções.
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  1021. Aqueles que estão perto de um adicto onipotente podem se sentir impacientes com o tempo que leva para aceitar o desejo de entrega. Temos que nos lembrar que a redução da grandiosidade só funciona quando atacada na base da onipotência, ou seja, o inconsciente.
  1022. A rendição, diz a maioria dos terapeutas, não pode acontecer antes da pessoa estar pronta. Tem de vir como um ato de conversão espontânea. A verdadeira entrega e aceitação podem ajudar na ativação do contato com a realidade, algo que a grandiosidade não permitiu que a mente do adicto concebesse que pudesse ajudar. A entrega é para ter uma vida de amor, gratidão e humildade com muita intensidade.
  1023. O adicto decide mudar, e começa a viver uma jornada espiritual que não tem fim. A grandiosidade sofre uma quebra quando o adicto para de tentar resolver seus problemas sozinho e alegremente aceita a ajuda de outros para fazer a sua recuperação funcionar. Em vez de lutar para escapar da adicção, ele ou ela luta para ter uma nova vida. Volta à autoconfiança. Mas não é segredo que a entrega não dura sempre para todos os adictos que estão abstêmios. Muito rapidamente, o adicto que está “tentando” a sobriedade pode voltar para o velho pensamento destrutivo que tinha antes de se entregar. É aqui que é guiado a estar vigilante para prevenir uma recaída. A grandiosidade nunca se deita e morre.
  1024. A natureza compulsiva e excessiva dos adictos mantem a tensão em recuperação. Durante a sobriedade, isto pode fazer com que um adicto sóbrio fique impaciente por experimentar um teste que determine, de uma vez por todas, se ele ou ela perdeu o controle sobre as drogas. A grandiosidade, viva e de boa saúde apesar de excluída da mente consciente, dispara a lapsos que é tão familiar aos membros dos Alcoólicos Anônimos. Os ‘’recaídos’’ em potencial são por vezes facilmente identificáveis.
  1025. Sendo que eles se submeteram a uma tentativa com a abstinência mais do que se renderam a sua grandiosidade em profundidade, eles favorecem o pensamento negativo, evitam fazer o seu inventário e reparações, não põem esforços em descobrir um Poder Superior, evitam rezar, negligenciam arranjar um padrinho, sentem que leituras do livro azul em repetidas reuniões são uma prática sem sentido, e se aborrecem não maioria das reuniões. Uma pessoa assim está seca , não
  1026. sóbria. Outros membros muitas vezes falam sobre a incapacidade destes novos membros de ouvir, partilhar, ou de se envolver. Frequentemente, tentativas de interferir para evitar uma recaída sãosentidas pelo adicto grandioso, enquanto o abstêmio, como uma invasão de acreditar estar no controle de sua vida.
  1027. Ao fim estamos dizendo que a grandiosidade é um ego inchado, que pode ser trabalhado, porém pode surgir a qualquer momento se não estamos praticando os princípios da recuperação em nossa vida.
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  1065. PERFECCIONISMO
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  1080. Uma das fábulas de ESOPO conta a história de um homem, do seu filho e do burro deles. Ao caminharem pela estrada, um andarilho critica o pai por fazer o filho ir a pé quando poderia cavalgar no burro. Portanto o pai montou seu filho no burro. A seguir, outro andarilho critica o filho por ser preguiçoso e obrigar o pai a ir a pé. O pai então sobe no burro a frente se seu filho. Em seguida, um terceiro andarilho lamenta e acha cruel que o burro tenha que carregar os dois. Por isso tira o filho de cima do burro e constrói uma padiola com cordas. Ele e o filho conseguem por o burro em cima da padiola e começam a arrastar o burro, mas o burro escapa e cai num lago e afoga- se.
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  1082. PORQUE PENSAMOS QUE PRECISÁVAMOS PARECER PERFEITOS
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  1084. Embora só tivesse oito ou nove anos quando li pela primeira vez esta fábula, percebi que a história tinha alguma coisa a ver com uma tentativa de agradar aos outros. Não compreendi que já estava firmando os meus próprios hábitos de tentar obter a aprovação dos outros.
  1085. É normal querermos sentir que temos valor e querermos que as outras pessoas nos considerem como pessoas de valor. É a maneira como satisfazemos este desejo que pode ser ao nosso favor ou voltar- se contra nós.
  1086. O amor verdadeiramente é incondicional e raro. Provavelmente, a maior parte de nós nasceu numa família em que o amor era, de certa maneira, condicional. Em crianças, podemos ter tentado pelo nosso comportamento ganhar a atenção e o afeto dos nossos pais. Podemos ter tentado ser perfeitos para eles. Se crescermos numa família em que a dependência dos químicos era um problema, teremos provavelmente recordações de uma afeição que se manifestava de forma pouco regular. Um dia despejavam- nos amor em cima da cabeça, no dia seguinte, podíamos ser alvo de maus tratos. Não sabemos com o que contar, nem quando contar com o que, causava- nos mau- estar. Então, para evitar nos sentirmos inquietos, podemos ter tentado ser sempre perfeitos. Fazer as coisas ‘’na perfeição’’ nos dava um sentimento de controle com relação a nossa vida e nos ajudar a dominar a inquietação causada pela irregularidade das manifestações de afeto. Mas, se somos dependentes dos químicos, o uso tinha tendência para diminuir a nossa autoestima e para aumentar os nossos sentimentos de inadequação e a nossa necessidade de parecermos perfeitos.
  1087. Exigirmos de nós a perfeição pode ser destrutivo. Pode introduzir tensões na nossa vida, fazer baixar a nossa autoestima e afetar as nossas relações. Um dos meios que podemos utilizar para ultrapassar o nosso perfeccionismo é a Terapia Racional Emotiva de Albert Ellis. Esta brochura nos mostra como ela nos pode ajudar a identificar e mudar a nossa forma perfeccionista de pensar.
  1088.  
  1089. O QUE É O PERFECCIONISMO?
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  1091. Perfeccionismo indica um significado com a pretensão de ser impecável? Será a tentativa de não se cometer erros? O perfeccionismo nem sempre é assim tão definido. Vamos observar alguns episódios da vida de três pessoas: Catarina, David e Maria.
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  1094. CATARINA
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  1096. Nervosa por estar quase na hora da reunião do grupo de pacientes ambulatórios, Catarina revê- se ao espelho pela quarta vez, encolhe os ombros e dirigi- se para a porta. O telefone toca. Irritada, levanta o fone.
  1097. ‘’Catarina! Podemos falar?’’
  1098.  ‘’Falar, falar, falar’’ resmunga Catarina antes de se forçar a um tom de voz mais agradável. ‘’Claro, Cartola...’’
  1099. Meia hora mais tarde, Catarina sai de casa e mete a chave na ignição com rancor, cheia de ressentimento pelo contratempo que permitiu a Cartola causar- lhe. Agora, vai provavelmente chegar atrasada a terapia do grupo. ‘’Porque é que as pessoas descarregam sempre os problemas pra cima de mim? ‘’ pergunta a si mesma.
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  1101.  
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  1104. Conduz o carro ao longo da avenida orlada de árvores, as folhas de Outono vivamente coloridas brilham ao sol.
  1105. ‘’ Tal e qual como a minha vida’’, lamenta- se ela. ‘’Estou sempre a meio, com a glória e a beleza de cada lado de mim, mas fora do meu alcance. ’’
  1106. Avança para o primeiro espaço vazio no parque de estacionamento da clinica. Depois recua, e avança outra vez de maneira a que o carro exatamente paralelo aos carros que estão ao lado. Não quer incomodar ninguém pela forma como estaciona. Correndo, Catarina consegue sentar- se exatamente antes do grupo começar. Dá um suspiro de alivio. Detesta chegar atrasada.
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  1108. DAVID
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  1110. Embora puxe o cachecol para proteger a cara da violência da neve, David hoje não se importa realmente com o vento e o frio. Ao menos o tempo lhe oferece alguma coisa de concreto contra a qual lutar. Tem sentido ansiedade desde que, há seis meses mudou. Quase ri da ironia. Trabalhou aquelas semanas de sessenta, setenta, oitenta horas para um dia poder mudar e sossegar e agora não consegue descontrair-se. David se recorda do dia, há uns trinta anos, em que ele e o pai observavam a cidade do alto da penthouse no condomínio de David. Lembra-se de ter dito: “Pai, realizei tanta coisa, mas foi o pai que apostou no meu êxito. Tenho orgulho de ser seu filho”. A vida tinha tanto significado a essa altura. Sabe que vai precisar de qualquer coisa que o faça atravessar os longos dias de inverno.
  1111.  
  1112. MARIA
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  1114. Em frente da Estátua da Liberdade e olhando para o porto que a rodeia, Maria está momentaneamente desapontada. O letreiro na porta diz: “Não há visitas. Fechado para obras”.
  1115. Mas o desapontamento desaparece rapidamente com a excitação de se encontrar em Nova York, recompensa de ter sido votada a Professora do Ano. Deu muito às suas alunas ao longo dos anos – longas horas e uma energia quase infinita. Às vezes pedia demais a si própria, ultrapassando os seus próprios limites, mas sentia-se orgulhosa quando os pais louvaram os seus esforços. Como é emocionante agora ver o monumento, a senhora de pé com o braço levantado, de facho na mão, e ler a inscrição, “Tragam-me o vosso povo, cansado, pobre, esmagado, ansiando por respirar livremente...” Os olhos de Maria enchem-se de lágrimas à medida que vai lendo as palavras. Por que de repente se sentira tão cansada? Observa outra vez a estátua. Identifica-se perfeitamente com a necessidade que a senhora tem de ser restaurada.
  1116. Catarina, David e Maria têm todos os traços de perfeccionismo, embora não exprimam necessariamente o seu perfeccionismo da mesma forma. Catarina pode ser descrita como uma pessoa que “quer endireitar tudo a sua volta”. David baseia o seu poder próprio na realização profissional. O seu perfeccionismo pode não parecer óbvio como o de Catarina porque a nossa sociedade encoraja a ambição e nos ensinou a encarar o êxito em termos de posição social e riqueza. Maria, obrigando-se a ultrapassar os seus próprios limites para agradar aos outros, mostra-nos outra faceta do perfeccionismo.
  1117.  
  1118. PERFECCIONISMO E DEPENDÊNCIA DOS QUÍMICOS
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  1120.  É comum os adictos serem perfeccionistas. Entre nós há quem seja como Maria, outros como David e, outros como Catarina.
  1121. As mulheres têm sido, tradicionalmente, ensinadas a desempenhar um papel de serviço em relação aos outros, elas são altamente vulneráveis, a forma de pensar perfeccionista, que diz que devem estar sempre prontas a ajudar e a serem amáveis.
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  1128. Apesar dos recentes progressos realizados pelos movimentos feministas, a percepção que a mulher tem de si mesma é influenciada pelo que aprendeu quando criança e pela maneira como a sociedade encara as mulheres. A dependência química complica ainda este problema. Uma mulher com dependência química que acredita segundo certas mensagens da sociedade, que as mulheres são inferiores, se sente ainda mais incapaz e inútil por causa da bebida. Apenas se pode sentir segura de ser amada quando tenta ser a companheira “perfeita” e a mãe “perfeita”. Se eu for perfeita ninguém notará como me sinto inútil e envergonhada.
  1129. Também os homens sentem o peso das noções antiquadas e limitadas a propósito daquilo que um homem deve ser. Podem achar que tem de parecer forte em todas as ocasiões e quem chorar ou deixar que os outros os ajudem, possam parecer fracos. Podem crer que tem de ser o pai perfeito ou o marido ideal para terem algum valor.
  1130. Ao lerem isto, podem estar dizendo: “Então, sou perfeccionista. Para ser totalmente sincero, pensei que isso fosse uma das minhas vantagens. Aprecio quando as pessoas comentam como faço as coisas bem feitas”. É verdade que, em curto prazo, o perfeccionismo pode produzir alguns resultados positivos. Mas, em longo prazo, é derrotista. Iremos analisar esta idéia mais adiante, servindo-nos da Terapia Racional-Emotiva.
  1131. A TER pode ajudar-nos em relação ao nosso perfeccionismo, ajudando-nos a mudar a forma como pensamos sobre certas situações da nossa vida. Alguns centros de tratamento das dependências químicas e algumas clínicas de saúde mental têm grupos de TER para ajudarem as pessoas a identificarem e alterarem os pensamentos e comportamentos derrotistas. Catarina, David e Maria estão num destes centros de tratamento. Vamos acompanha-los ao seu grupo de TER para explorarem formas de alterar a sua maneira de pensar perfeccionista.
  1132.  
  1133. A REUNIÃO DO GRUPO DE TER
  1134.  
  1135. “O mais importante não é o êxito, desde que façam sempre o melhor que podem. Quantos de vocês já ouviram isto antes?” perguntou Mariana, responsável pelo grupo. “Gostaria de falar mais sobre esta forma de pensar e de como elas pode nos afetar. É impossível conseguir sempre o máximo, e tenta-lo apenas levará à frustração e a pouca estima por nós próprios”.
  1136. “O tema de hoje é o perfeccionismo”, continuou Mariana.
  1137. “Mas antes de entramos no assunto, vamos rever os princípios da TER para os recém-chegados. Depois, tentaremos identificar algumas das suas próprias características perfeccionistas, observar como é que elas podem voltar-se contra nós em vez de jogarem a nosso favor e, em seguida, descobrir formas mais construtivas, que venham ao encontro das nossas necessidades.
  1138. A TER diz que a forma como pensamos afeta a forma como sentimos e como sentimos, afeta a forma como agimos. Ficamos muitas vezes desnecessariamente perturbados devido à maneira como pensamos. Na verdade, temos realmente certo controle sobre as nossas emoções. É importante saber isto porque algumas emoções podem colocar obstáculos ao crescimento em recuperação. Este diagrama mostra como isso pode acontecer. Mariana apontou para o quadro.
  1139.  
  1140.  
  1141.  
  1142.  
  1143.  
  1144.  
  1145. -------------------------------
  1146.  
  1147.  
  1148. Sentimento desagradável
  1149. Furioso
  1150. Mau
  1151. Triste
  1152. Com medo
  1153. I
  1154. I
  1155. I
  1156. V
  1157. Consequências negativas, incapacidade de dominar a situação que produziu o sentimento desagradável e desenvolvimento de um padrão de comportamento derrotista.
  1158.  
  1159.  
  1160. --------------------------------
  1161.  
  1162. Comportamento derrotista, o uso de químicos que modificam o humor, se alimentarem de forma exagerada, comportamento agressivo.
  1163.  
  1164.  
  1165.  
  1166.  
  1167. “A nossa forma de pensar é por vezes racional, outras vezes irracional”, continuou Mariana. “Por exemplo, se eu achar que preciso ser perfeito para ser aceito por outra pessoa, introduzo tensões na minha vida. Mas elimino essas tensões da minha vida e pratico a TER se alterar os meus pensamentos para: “é aceitável cometer um erro embora prefira não o fazer”, ou “posso sentir-me bem comigo mesmo sem ter a aprovação de todos”, ou ainda “os erros podem ser como uma forma de aprender”.
  1168. Por outras palavras, a TER é um processo através do qual examino a minha forma de pensar a fim de descobrir quais são os pensamentos irracionais que me perturbam desnecessariamente. Depois, posso debater esses pensamentos e mudar a minha maneira de pensar. “Isso me ajuda a reduzir os pensamentos que me perturbam e fará com que esteja menos sujeito a cair em comportamentos autodestrutivos, tais como usar drogas, cometer excessos com a comida ou isolar-me dos amigos e da família”.
  1169. No programa da TER, usamos o processo ABCD para mudarmos a nossa maneira de pensar. Mariana apontou para outro diagrama no quadro.
  1170.  
  1171. A ----------------
  1172. B ----------------
  1173. C -----------------
  1174. D
  1175. Acontecimento
  1176. Convicções e pensamentos
  1177. Sentimentos
  1178. Debater
  1179. Convicções irracionais
  1180. Comecemos por observar algumas características perfeccionistas vulgares. Mariana escreveu uma lista no quadro e leu alto cada uma delas.
  1181.  
  1182. CARACTERÍSTICAS PERFECCIONISTAS
  1183.  
  1184. 1 - Tem uma sede insaciável de reabilitação.
  1185. 2 - Precisa se sentir indispensável.
  1186. 3 - Não dá oportunidade para que se verifiquem erros.
  1187. 4 - Deposita-nos outras esperanças irreais.
  1188. 5 - Sente necessidade da aprovação de todos.
  1189. 6 - Concentra-se nos insucessos.
  1190. 7 - Estabelece para si mesmo normas impossíveis de atingir.
  1191. 8 - É extremamente competitivo em relação aos outros.
  1192. 9 - Receia correr riscos.
  1193. 10 - Adia.
  1194. 11 - Tem dificuldade a aceitar críticas.
  1195. “Vamos usar o número nove – “receia correr riscos” – para descrever como pode funcionar o processo ABCD. Vou usar um exemplo da minha própria vida”, disse Mariana ao começar a escrever no quadro.
  1196.  
  1197. A -----------------
  1198. B ----------------
  1199. C ---------------
  1200. D
  1201. Acontecimento
  1202. Convicções e pensamentos
  1203. Sentimentos
  1204. Debater
  1205. Convicções irracionais
  1206. Convidam-me para tomar café.
  1207. Não me sinto em condições de ter uma relação séria.
  1208. Ansiedade
  1209. Medo
  1210. É apenas um café, não é uma proposta de casamento.
  1211.  
  1212. Não sei o que ele quer
  1213. Ansiedade
  1214. Medo
  1215. Não faz mal correr um risco... É uma forma de crescer.
  1216.  
  1217. Posso não gostar dele, ou ele pode não gostar
  1218. de mim.
  1219. Ansiedade
  1220. Medo
  1221. Provavelmente vai gostar de mim. Se não gostar, isso não significa que eu não seja como devo ser.
  1222.  
  1223.  
  1224.  
  1225.  
  1226.  
  1227. Mariana acabou de escrever, apontou para B (Convicções e pensamentos) e sublinhou-o “O meu conselho é que se detenham em B. Escutem os seus pensamentos e alterem-nos se estiverem perturbando desnecessariamente”, disse ela.
  1228. “Agora vamos ver se há algumas interações por aí... Porque é que cada um não escolhe um sentimento que tenha tido hoje e não tenta ligá-lo a um acontecimento recente. Por exemplo, poderá sentir-se ansioso a propósito de qualquer coisa que uma pessoa de família lhe contou numa conversa telefônica. Depois de descrever o acontecimento e o sentimento, tentaremos identificar as idéias perfeccionistas e, em seguida, explorar formas alternativas de pensar a respeito do acontecimento”.
  1229.  
  1230. PERFECCIONISMO x CONTROLE
  1231.  
  1232. Catarina falou em primeiro lugar.
  1233. -“Tenho me sentido irritada hoje, desde que o grupo começou. Quantas vezes temos falado sobre começar a horas e o Tiago entra atrasado!”
  1234. Tiago corou e falou com voz irritada: “Desculpa, mas não foi por minha culpa. O encontro com a enfermeira foi interrompido por uma emergência”.
  1235. Catarina enfiou-se pela cadeira abaixo e disse: “Desculpa Tiago” e depois disse Mariana:
  1236. ”Estava com medo de arriscar dizer aquilo. Tenho a certeza de que é capaz de encontrar escondidas, idéias perfeccionistas”.
  1237. Mariana fez sinal para o grupo: “Comentários?”
  1238. “Ontem falamos de desvios no grupo”, atreveu-se David e continuou: “Reparei que um dos traços perfeccionistas da lista é “Deposita esperanças irreais nos grupos”. Catarina, você está tendo esperanças irreais em Tiago se pensa que ele devia, ou tem que, estar sempre aqui há horas. Acho que ficou zangada porque ele não fez o que você queria e que havia decidido com você mesmo que ele devia fazer. Não pode controla-lo.” E depois, disse Mariana: “Compreendo que encontramos aqui uma esperança que não é realista, mas por que é que o perfeccionismo e as esperanças irrealistas que depositamos outros andam juntos?”
  1239. “Acho que nós, os perfeccionistas, somos os nossos juízes mais severos”, respondeu Mariana. “E isso extravasa afetando as pessoas próximas. É verdade, somos severos conosco, mas somos também severos com os outros. Tentamos muitas vezes controlar as outras pessoas. David acabava de dizer certas coisas à Catarina a respeito de controle. Pensa que controle e perfeccionismo se acompanham?”
  1240. “Bem, se eu tentar colocar em você esperanças irrealistas, me parece que estou insistindo em te controlar”, disse David.
  1241. “Concordo com isso, continuou Mariana. Sei que, ao crescer, me sentia muito incomodada por causa da minha mãe beber. Eu era sempre o alvo da raiva dela quando estava bêbada. Durante dez anos, tentei fazer tudo o que podia para conseguir que ela parasse. Pensava que se eu fosse perfeita, ela deixaria de beber. Nada deu resultado. Quando cheguei aos dezoito anos, fui embora de casa. Mas a essa altura, já havia formado alguns hábitos muito fortes de perfeccionismo”.
  1242.  
  1243. PERFECCIONISMO x ANSIEDADE
  1244.  
  1245. “Mariana, disse David, às vezes penso que a razão porque comecei a beber foi para controlar essa sensação desagradável de que acabou de mencionar. Sei do que está falando”. Várias pessoas assentiram com a cabeça. David se sentou aliviado. Estava satisfeito por saber que não era a única pessoa que se sentia assim.
  1246. “Por falar em se sentir pouco a vontade, fico uma pilha de nervos só de pensar que tenho de falar num grupo”, disse Carla, um novo membro do grupo, que falava pela primeira vez.
  1247. “Tenho pena que esteja ansiosa. Carla gostaria que o grupo a ajudasse usando um pouco a TRE?” perguntou Mariana.
  1248.  
  1249.  
  1250.  
  1251.  
  1252.  
  1253. “Gostaria. Há dois dias que tenho o estômago colado às costas. Não funciona bem em grupo. Nem acredito que estou falando agora!”
  1254. Mariana foi ao quadro e escreveu: “Falar em frente de um grupo” por baixo de A (Acontecimento).
  1255. -“Carla, o que é que diz a si mesma que a faz ficar tão ansiosa?” perguntou Mariana.
  1256. -“Tenho medo de desmaiar ou de gaguejar. E, cometer um erro...?”
  1257. Mariana começou a escrever, registrando estas afirmações por baixo de B (Convicções e pensamentos). Wilson, membro do grupo há bastante tempo interveio: “Li um artigo sobre perfeccionismo e descobri certas coisas que me ajudaram. Compreendi que não era obrigado a corresponder às esperanças de ninguém a meu respeito e que não era grave se cometesse alguns erros. Acho que pensava que tinha de ser melhor do que os outros.”
  1258. “Você pode falar um pouco mais sobre isso, Wilson?” pediu Mariana. “Há coisas interessantes no que disse que podem ajudar Carla a questionar sobre sua forma de pensar.”
  1259. “Disse para comigo: ninguém é perfeito e eu também não”.
  1260. Mariana escreveu as observações de Wilson por baixo de D (Debater as convicções irracionais) à medida que ele falava.
  1261. “Percebi que cometer um erro não era uma desgraça. Percebi também que estamos todos no mesmo barco. Precisamos da ajuda uns dos outros. Não precisamos entrar em competição uns com os outros. O mais difícil de aceitar para mim foi a terceira coisa: disse para comigo que não tinha importância se não tivesse a aprovação de algumas pessoas do grupo. Ainda continuo a batalhar neste aspecto.”
  1262.  
  1263.  
  1264. PERFECCIONISMO x CRÍTICA
  1265.  
  1266. Wilson parecia incomodado. Não estava habituado a falar sobre os seus sentimentos. “Quando fui embora ontem, me senti magoado porque alguém me criticou por falar demais, é muito difícil suportar críticas. Acho que se estivesse realmente convencido que não tenho que ser perfeito, aguentaria muito melhor as críticas.”
  1267. “As pessoas oscilam muitas vezes entre os oito e os oitenta” respondeu Mariana. “Ou somos perfeitos ou somos falhos. É difícil dizermos: “Sei que tenho cinco qualidades e cinco defeitos”. Mas, ou somos como se deve ser, ou não prestamos para nada. É fácil também contarmo-nos apenas nos nossos fracassos.”
  1268. “Faço muito isso” suspirou Juliana. “Há vários anos, ganhei o prêmio de “Professora do Ano” e me senti muito orgulhosa. Há muito que o cobiçava. Mas depois de ganha-lo, comecei a pensar se conseguiria manter o mesmo ritmo. Tinha medo que as pessoas descobrissem que afinal não era assim tão boa professora, e assim estava eu, Professora do Ano, perguntando a mim mesma se deveria continuar arriscando a me colocar numa situação em que poderia falhar. É este o gênero de pensamentos em que caio.”
  1269. “Também faço isso”, reconheceu Catarina. “Tentei ser a mãe perfeita, a esposa perfeita, a amiga perfeita. Quero fazer as coisas melhor do que os outros ajudá-los quando precisam e tirá-los de dificuldades. Convenço-me de que sou impecável e, depois, quando as outras pessoas pedem a minha ajuda, fico ressentida e acho que querem se aproveitar de mim.”
  1270.  
  1271. PERFECCIONISMO x ADIAMENTO
  1272.  
  1273. “Reparei que tenho adiamentos na lista, disse David. Quando trabalhava, estava muito com outras pessoas. Desde que me divorciei e me reformei, me tornei bastante solitário. Tomei várias vezes a resolução de tornar a ver pessoas, mas continuo adiando. No entanto não sei bem o que é que isto tem a ver com perfeccionismo”
  1274.  
  1275.  
  1276.  
  1277.  
  1278.  
  1279. Maria tomou a palavra. “Suponho que pode ter a ver com não querer correr o risco de um fracasso, talvez por causa do seu divórcio. Se parece com a dúvida que tenho se devo voltar a ensinar”.
  1280. “Sentada aqui ouvindo as suas contribuições, disse Mariana, estou espantada com alguns dos pontos de vista que apresentam. Estava quase chamando de “o grupo perfeito”, mas é capaz de não ser a melhor terminologia tendo em conta o nosso tema de hoje. Antes prefiro dizer que mostraram ser um notável desafio a forma de pensar perfeccionista”.
  1281. Mariana começou a distribuir folhas para a prática da TER. “Preencham estas folhas e tragam para a próxima reunião de grupo. Vamos usá-las para colocarmos alguns dos seus pontos de vista a seu favor.”
  1282. Poderão ver agora, nas páginas seguintes como Maria, David e Catarina colocam em prática o que aprenderam no grupo.
  1283.  
  1284. FOLHA DE PRÁTICA DE MARIA
  1285.  
  1286. A ----------------
  1287. B ---------------
  1288. C ----------------
  1289. D
  1290. Acontecimento
  1291. Convicções e pensamentos
  1292. Sentimentos
  1293. Debater Convicções irracionais
  1294. Pediram-me para tomar parte numa representação.
  1295. Não sei representar. E se fazem piada de mim?
  1296. Medo de falhar.
  1297. Isto não é cinema. Estamos apenas tentando ajudar alguém a superar um sentimento.
  1298.  
  1299.  
  1300.  
  1301. Em vez de ter medo vou me esforçar por ajudar essa pessoa.
  1302.  
  1303.  
  1304.  
  1305. Todos sabem que não sou uma atriz profissional.
  1306.  
  1307.  
  1308.  
  1309. Fico satisfeita por amenizar.
  1310. FOLHA DE PRÁTICA DE DAVID
  1311.  
  1312. A ---------------
  1313. B ---------------
  1314. C ----------------
  1315. D
  1316. Acontecimento
  1317. Convicções e pensamentos
  1318. Sentimentos
  1319. Debater Convicções irracionais
  1320. Ser criticado em grupo por falar demais.
  1321. Não presto. As pessoas não gostam de mim quando deixo que veja quem, na verdade eu sou.
  1322. Magoado
  1323. Deprimido
  1324. Quem é que diz que não presto? Só porque alguém me critica não quer dizer que não presto.
  1325.  
  1326. As pessoas só gostavam de mim antigamente porque tinha êxito e era rico.
  1327. Magoado
  1328. Deprimido
  1329. Tenho me sentido melhor comigo mesmo desde que comecei a falar em grupo.
  1330.  
  1331. Não consigo aguentar se todas as pessoas do grupo estiverem contra mim.
  1332. Deprimido
  1333. Se uma pessoa não gostar do que eu digo, não quer dizer que todos estejam contra mim.
  1334.  
  1335.  
  1336.  
  1337. Talvez eu aprendesse mais se falasse menos e escutasse mais.
  1338.  
  1339.  
  1340.  
  1341. FOLHA PRÁTICA DE CATARINA
  1342.  
  1343.  
  1344. A ---------------
  1345. B --------------
  1346. C ----------------
  1347. D
  1348. Acontecimento
  1349. Convicções e pensamentos
  1350. Sentimentos
  1351. Debater convicções irracionais.
  1352. Uma amiga telefonou para pedir para tomar conta das duas crianças dela.
  1353. Tenho um grande sentimento de culpa quando recuso.
  1354. Culpa
  1355. Raiva
  1356. Sentimento
  1357. Tenho o direito de estabelecer limites mesmo com os amigos.
  1358.  
  1359. Devia ser capaz de fazer isto por uma amiga íntima.
  1360. Culpa
  1361. Raiva
  1362. Sentimento
  1363. Por que é que irei fazer isto se não quero fazer? Sei que não preciso ser a miga “perfeita”.
  1364.  
  1365. Por que é que as pessoas se aproveitam de mim?
  1366. Culpa
  1367. Raiva
  1368. Sentimento
  1369. Quando pensar que alguém está se aproveitando de mim, passarei a admitir essa idéia como um sinal para estabelecer limites.
  1370.  
  1371. NÃO EXISTE UMA SOLUÇÃO MÁGICA
  1372.  
  1373. Saber que uma coisa é derrotista e mudar a nossa forma de pensar e o nosso comportamento são duas coisas diferentes. Os hábitos levam tempo e formar-se exige tempo e prática.
  1374.  
  1375.  
  1376.  
  1377.  
  1378.  
  1379.  
  1380.  
  1381.  
  1382.  
  1383.  
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  1385.  
  1386.  
  1387.  
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  1389.  
  1390.  
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  1397.  
  1398.  
  1399.  
  1400.  
  1401.  
  1402.  
  1403. A VERGONHA
  1404.  
  1405.  
  1406.  
  1407.  
  1408.  
  1409.  
  1410.  
  1411.  
  1412.  
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  1415.  
  1416.  
  1417.  
  1418.  
  1419.  
  1420. Compreender os nossos sentimentos não é tarefa fácil. A maioria de nós já sentiu o peso da vergonha a determinada altura, alguns de nós fomos desonestos em relação aos nossos sentimentos – para conosco e com os outros – por medo de sermos descobertos ou de que os outros ficassem sabendo demasiadamente sobre nós. Em recuperação, o sentimento doloroso vem frequentemente à superfície, e nos deixa assim se sentindo mal. Palavras como infelicidade ou tristeza podem dar uma boa descrição desses sentimentos. Por vezes nos sentimos maus, sem sermos de fato tão maus assim. Horas nos sentimos magoados como se algo de errado tivesse chegado ao mais profundo de nosso ser. Sendo assim percebemos que há mais a ser descoberto do que apenas o que o uso de drogas ou álcool pode ter feito conosco. Sentimos que nos falta algo, que somos inadequados e vazios.
  1421. Esse sentimento crônico que nos invade muitas vezes é a vergonha. O vazio aumenta com o derrotismo e com a necessidade constante de preenchimento. O vazio da vergonha é uma armadilha em recuperação, que nos impede de nos sentir satisfeitos e que faz com que o fato de não usarmos drogas, álcool, comida ou outros comportamentos compulsivos, pareça impossível.
  1422.  
  1423. DE ONDE VEM A VERGONHA
  1424.  
  1425. Para a maioria de nós vergonha tem suas raízes na nossa infância. Há famílias que tem problemas de adicção e emocionais, por isso muitos de nós fomos criados em famílias disfuncionais que não sabiam corresponder às nossas necessidades emocionais e muitas vezes físicas. Quando os pais são cronicamente depressivos ou se debatem com um problema de alcoolismo ou de adicção, são muitas vezes incapazes de estar à altura das necessidades emocionais de seus filhos. Quando as crianças não veem suas necessidades afetivas satisfeitas, sentem muitas vezes, vergonha.
  1426. Uma família saudável satisfaz naturalmente as necessidades afetivas de cada um dos seus membros. Os filhos são aceitos tal como são; são amados e valorizados. A individualidade dos membros da família é mantida. Os pais são livres para serem adultos e os filhos, livres para serem crianças, assim formando indivíduos que possam se tornar Pessoas.
  1427. A vergonha cresce quando a criança ou o adolescente se sente abandonado ou desprezado, quando não recebe o carinho necessário para crescer, se desenvolver e olhar para si mesmo como uma Pessoa. Estas crianças ou adolescentes, acabam muitas vezes por ter uma inversão na compreensão de estados de humor e sentimentos, o que pode levar à inadequação e sentir certa inutilidade ficando assim profundamente enraizados.
  1428. A educação inadequada durante a infância pode ter diversas formas. Para alguns de nós era de maneira evidente, como por exemplo:
  1429.  
  1430. Bater em nós ou nos empurrar.
  1431. Obrigar a ter comportamentos sexuais.
  1432. Abandonar-nos por vários dias.
  1433.  
  1434. Para alguns de nós era sutil e manipulativa:
  1435.  
  1436. Comparação com os nossos irmãos que tinham conseguido tanto.
  1437. Sujeitando a ouvir comentários depreciativos sobre a nossa masculinidade ou feminilidade.
  1438. Críticas sobre a nossa capacidade de ultrapassar ou de conseguir as coisas sozinhos.
  1439. Críticas sobre nosso aspecto ou peso.
  1440. Lembrar-nos constantemente dos nossos erros.
  1441. Ameaçar de que nos tornaremos iguais ao nosso “pai ou mãe bêbados ou nóias e assim maus”.
  1442.  
  1443. As pessoas criadas inadequadamente aprendem em grande parte a estar vigilantes quando perto dos outros, para que ninguém descubra seus sentimentos de inadequação. Manter segredos torna-se importante para nós, assim como resistir às descobertas, para evitar erros.
  1444.  
  1445.  
  1446.  
  1447.  
  1448.  
  1449. Errar é visto como a maior evidência de inutilidade. Um erro não é visto como um acontecimento isolado, mas sempre generalizado como uma descrição total de si mesmo “Eu sou um erro. A minha vergonha significa que não me sinto mal em determinado momento, mas acredito que não presto! Que sou inadequado e inútil”.
  1450. Este gênero de raciocínio promove um ciclo vicioso, em que as crianças que não são valorizadas tornam-se adultos que acreditam não ter valor. Duvida e nega suas emoções e deixa de exprimir os sentimentos, de demonstrar afeto, e se tornam desconfortáveis em relação à sua sexualidade; uma tristeza crônica, assim como apatia e medo de serem descobertos, toma o lugar dos sentimentos de confiança e partilha.
  1451.  
  1452. A VERGONHA E A DEPENDÊNCIA QUÍMICA (ADICÇÃO)
  1453.  
  1454. A vergonha pode também começar a aparecer mais tarde. Aqueles de nós que se debatem com uma adicção à drogas, podem sentir-se desesperados com os problemas emocionais a medida que o ciclo da adicção vai aumentando, e as nossas tentativas de levarmos uma vida saudável e produtiva vão sendo derrotadas. Com a perda da esperança, este ciclo autodestrutivo vai salientar os nossos problemas de comportamento e exagerar os sentimentos de inutilidade.
  1455.  
  1456. COMPORTAMENTO AUTODESTRUTIVO
  1457.  
  1458. EXEMPLO: Helena está há seis meses sem usar álcool ou drogas e, no entanto sente-se completamente dominada por um sentimento de vazio ou dúvida. Sente-se paralisada e não consegue identificar ou falar sobre os seus sentimentos. Teme que a falta de confiança em si própria seja completamente óbvia. Deixou de ter os comprimidos e o álcool para preencher o vazio. Para se proteger, ela conta com um mecanismo de defesa rígido e, promete a si mesma que ninguém irá saber de seus sentimentos de inutilidade e de vergonha; ninguém saberá seu segredo. Em vez disso esforça-se para se tornar “perfeita”.
  1459. A confiança de Helena no perfeccionismo é uma defesa constantemente usada contra a vergonha. Na verdade, trata-se de um sistema de crença extremamente rígido, uma espécie de “juiz dentro de nós”, que controla, avalia e critica o nosso comportamento, pensamentos e sentimentos. Esse juiz interior exige perfeição. Errar é desastroso! Acreditamos que para valermos alguma coisa temos de ser bem sucedidos em todas as áreas da nossa vida. Convencemos-nos que somente um desempenho perfeito compensará os nossos sentimentos mais íntimos de vergonha.
  1460. Helena está entalada entre exigências irrealistas: o enorme esforço torna impossível para conseguir um comportamento perfeito e a sua insistência em manter secretos os seus sentimentos de vergonha. Encontra-se na situação do perdedor. Embora tenha deixado de usar comprimidos, a vergonha continua a motivar comportamentos perfeccionistas que limitam a sua capacidade de pedir a ajuda de que necessita desesperadamente.
  1461. Fábio é perseguido por sentimentos de inadequação. Exteriormente projeta a imagem da autoconfiança. No entanto, interiormente sente-se incompleto. Toma secretamente uma bebida atrás da outra, esforçando inutilmente para vencer a sua adicção, preencher os persistentes sentimentos de vazio e acalmar os sentimentos de vergonha. Quanto mais tenta calar os seus sentimentos, mais vazio sente.
  1462. O comportamento autodestrutivo alivia a dor e nos ajuda a nos sentir temporariamente bem, mas não resolve nenhum dos nossos problemas.
  1463.  A adicção de Fábio parece, pelo menos temporariamente, preencher o vazio da vergonha, mas tal como Helena, que conta com o perfeccionismo para disfarçar a vergonha, ao beber Fábio não faz mais do que aumentar os seus sentimentos de inutilidade. O seu alcoolismo engana a sua percepção da vergonha. Ambas as reações são contraproducentes. O seu alcoolismo alivia a dor que a vergonha traz, mas apenas por um curto espaço de tempo. Helena procura evitar os sentimentos de vergonha e
  1464.  
  1465.  
  1466.  
  1467.  
  1468.  
  1469. afasta o propósito de procurar ajuda para seu caos emocional, mantendo uma fachada rígida de perfeccionismo.
  1470.  
  1471. VERGONHA E AS SUAS CONSEQUENCIAS AUTODESTRUTIVAS
  1472.  
  1473. A vergonha é um problema emocional. As emoções tornam-se um problema quando nos impedem de alcançar alguns dos nossos objetivos mais básicos. Para muitos de nós, construir um estilo de vida saudável implica o desenvolvimento de relações que nos preenchem ao deixarmos de ser vulneráveis e imperfeitos com aqueles em quem confiamos ao mesmo tempo em que aceitamos a vulnerabilidade e imperfeição dos outros. Ser humano é ser falível e menos que perfeito. Recuperação também significa participar ativamente no mundo do trabalho, tirar prazer em viver o dia a dia e, é claro, manter-se abstinente. Quando um sentimento como a vergonha nos impede de realizarmos qualquer uma destas tarefas básicas então temos um problema emocional.
  1474. A vergonha é, portanto, um obstáculo à aprendizagem das tarefas básicas da vida. Sensações crônicas de vazio podem minar os esforços para nos sentirmos felizes e podem fornecer uma desculpa para uma recaída. A vergonha os mantém isolados e separados dos outros, sabotando assim as nossas necessidades de intimidade e relações com significado, interfere na nossa capacidade de nos relacionar com os outros como pessoas reais e imperfeitas.
  1475. A vergonha é um problema especial para as pessoas em recuperação da adicção e de problemas emocionais. Se tivermos sentimentos não identificados de vergonha com os quais não lidamos, estamos em risco de recair. De fato, o modo como nos comportamos ao sentirmos vergonha é frequentemente oposto ao modo como nos comportamos em recuperação. Recuperação é o processo que nos devolve à uma vida mais realizada, o que envolve frequentemente menos sofrimento emocional e liberdade do comportamento adictivo.
  1476.  
  1477.  
  1478. CARACTERÍSTICAS DA VERGONHA
  1479. CARACTERÍSTICAS DE RECUPERAÇÃO
  1480. Procura isolamento social e distanciamento emocional.
  1481. Participa no processo social de recuperação.
  1482. Falta de confiança em si próprio.
  1483. Confia nas suas opiniões e sentimentos.
  1484. Sente a espontaneidade reprimida.
  1485. Sente alegria.
  1486. Reflete os mesmos erros.
  1487. Aprende com a experiência.
  1488. Baseia-se em comportamentos rígidos
  1489. Aborda os problemas com flexibilidade
  1490.  
  1491. Como a vergonha nos faz sentir mal e tem como resultado o nosso comportamento autodestrutivo, é importante identificar e reduzir a vergonha como parte do nosso processo de recuperação.
  1492.  
  1493. VERGONHA x CULPA
  1494.  
  1495. A vergonha é diferente da culpa. A culpa é um sentimento de reação contra um mau comportamento ou uma omissão de um comportamento esperado. Por exemplo, um adolescente pode sentir culpa por ter magoado outras pessoas, ou um pai pode sentir-se culpado por ter negligenciado seu filho. A culpa está geralmente limitada a um acontecimento específico, não envolve uma avaliação do nosso valor como pessoa. Na verdade, os sentimentos de culpa são muitas vezes saudáveis. Podem ser um sinal de que falhamos em alguma coisa ou que precisamos olhar melhor para o nosso comportamento. Podemos aprender a olhar para a culpa e não a temer. Ajuda a nos lembrar que somos seres humanos imperfeitos e que temos valor, podendo aprender com os nossos erros e nos tornar pessoas que funcionam em plenitude.
  1496. Por outro lado, os sentimentos de vergonha envolvem geralmente a nossa valorização como pessoas.
  1497.  
  1498.  
  1499.  
  1500.  
  1501.  
  1502. A vergonha não é uma simples reação a um acontecimento específico; mas antes uma resposta emocional adquirida que permanece seja qual for a qualidade da nossa atuação.
  1503. Quando nos sentimos com vergonha, temos mais chances de nos isolar e de nos distanciarmos emocionalmente, nos tornamos menos espontâneos e mais infelizes. Os comportamentos derrotistas da vergonha reforçam os nossos sentimentos implacáveis de angústia, vazio e inutilidade.
  1504.  
  1505. BOAS NOTÍCIAS
  1506.  
  1507. Podemos mudar os sentimentos da vergonha! Assim como a vergonha se aprende, também pode ser “desaprendida” e substituída por atitudes, comportamentos e sentimentos mais positivos. Podemos reduzir os sentimentos da vergonha compreendendo as suas raízes, reconhecendo que temos vergonha e alterando conscientemente os comportamentos relacionados com ela.
  1508. As convicções em relação a nós próprios, quer tenham sido adquiridas na infância quer mais tarde, tendem a persistir mesmo quando a nossa adicção parou.
  1509. Quando ainda crianças, temos tendência a acreditar naquilo que os adultos nos ensinam, especialmente quando confiamos nesses adultos, tal como nós pais, padres ou professores. Como adolescentes, modificamos as nossas atitudes baseando-nos nas nossas experiências. Assim, se formos confrontados com fracassos constantes, críticas e com os nossos novos comportamentos de adictos, aprendemos depressa a desvalorizar aquilo que somos. As crianças e os adolescentes, pela natureza da sua juventude, tem falta da capacidade, do conhecimento e da estabilidade emocional para compreender a complexidade das suas atitudes e sentimentos. Como consequências disto, não são responsáveis pelo modo como fomos tratados no passado nem como aprendemos muito cedo a nos sentir. Essencialmente não somos responsáveis pela nossa infância. Ela é, por natureza, caracterizada pela impotência.
  1510. O mesmo se aplica à adicção e aos comportamentos compulsivos. Alguns de nós passamos por obsessões e comportamentos compulsivos que invadiram toda a nossa personalidade: outros passam pela experiência do descontrole em relação a certos comportamentos tais como a bebida, drogas ou o jogo. Todos nós enfrentamos e sentimos a destruição que vem da nossa incapacidade para modificar o nosso comportamento. Por si são, as resoluções firmes e a força de vontade só nos levaram a tristes insucessos. Embora quiséssemos que a dor resultante do nosso comportamento derrotista parasse, éramos impotentes. Tal como as crianças, impotentes em relação às nossas tentativas para controlar as complexidades das nossas atitudes, sentimentos e comportamento adictivo.
  1511. Só quando aceitamos a nossa impotência enquanto adultos e que podemos recuperar. Em recuperação, ficamos mais conscientes dos nossos sentimentos e podemos tomar decisões conscientes em relação ao modo como nos comportamos e sentimos. A vergonha perpetua-se nas nossas convicções. Não importa quando, como e onde as aprendemos, estas atitudes baseadas na vergonha fazem agora parte de nós. O juiz interior que representa as nossas tentativas perfeccionistas de controle pode agora ser enfrentando, diminuindo e, eventualmente destronado. As leis do juiz não são absolutas e podem ser vencidas com uma oposição persistente baseada na lógica e na razão.
  1512.  
  1513. PRINCÍPIOS DA T.E.R.
  1514.  
  1515. Apesar da vergonha ter as suas raízes no passado precisou lidar com ela no presente. Um dos métodos para atacar as atitudes baseadas na vergonha é utilizar uma abordagem baseada na autoajuda: Terapia Racional Emotiva (TER). A TER baseia-se na premissa que os pensamentos provocam sentimentos. Muitos de nós pensamos que os nossos sentimentos são reações automáticas a acontecimentos isolados. Falamos muitas vezes dos sentimentos desagradáveis como se alguém ou
  1516.  
  1517.  
  1518.  
  1519.  
  1520.  
  1521. algo fosse responsável por eles: “Ela me deixou furiosa”. Muitos de nós acreditamos que os acontecimentos em A causam as emoções de B.
  1522. No entanto, os sentimentos não são automáticos nem necessariamente similares ou compatíveis com a resposta a acontecimentos semelhantes. Por exemplo, um acontecimento (A), tal como receber um conselho em grupo pode resultar em inúmeros sentimentos diferentes (B), que podem ir desde sentir raiva a sentir tristeza. Portanto, os sentimentos variam de indivíduo para indivíduo e não estão automaticamente relacionados com os acontecimentos. Como tal, as emoções não são diretamente causadas por acontecimentos. A TER nos diz que podemos escolher o modo como interpretamos ou o que pensamos de um acontecimento em B, que por sua vez causam um sentimento em C.
  1523.  
  1524. HISTÓRIA DE HELENA
  1525.  
  1526. Apesar de estar limpa há seis meses, Helena tem sido martirizada por pesadelos constantes, noites sem dormir e problemas com relações. Procurou apoio num grupo terapêutico de mulheres. Se por um lado teve a coragem de pedir ajuda, por outro lado sentiu-se muda e incapaz de partilhar os seus sentimentos. Helena confia a tanto tempo no seu perfeccionismo defensivo, mantendo as pessoas à distância, que se torna agora difícil deixa-las se aproximarem.
  1527. Ao rever acontecimentos da sua infância, Helena lembra a história, há muito tempo reprimida, pela sua família, história essa que envolve sentimentos dolorosos e abuso físico. Ambos os pais de Helena foram alcoólicos. Helena está cheia de vergonha e, consequentemente, tem o pavor de contar a sua história. Ao pensar no seu passado, Helena diz para ela própria: “Devia ter sido capaz de parar com o abuso. Não devia ter aguentado tanto tempo. Que criança tão antipática que eu devo ter sido para merecer este tratamento. Em que adulto horrível fui me tornar. Ninguém pode saber.”
  1528.  
  1529.  
  1530. A -------------
  1531. B --------------
  1532. C -------------
  1533.  
  1534. Acontecimento
  1535. Pensamentos
  1536. Sentimentos
  1537. Consequências no comportamento
  1538. Contar a história
  1539. Devia ter impedido o abuso
  1540. Vergonha
  1541.  
  1542.  
  1543. Não devia ter aguentado tanto tempo
  1544.  
  1545. Isolada dos companheiros evita contarem a sua história
  1546.  
  1547. Devia ter sido uma criança muito antipática
  1548.  
  1549.  
  1550.  
  1551. Em que adulto horrível fui me tornar
  1552.  
  1553.  
  1554.  
  1555. Ninguém pode saber
  1556.  
  1557.  
  1558.  
  1559. Em consequência da sua vergonha, Helena tenta isolar-se do grupo. O seu comportamento é autodestrutivo, já que elimina o potencial apoio de que necessita para enfrentar o seu segredo. O conjunto de valores de Helena em B caracteriza-se por exigências irrealistas combinadas com uma tendência para denegrir a sua pessoa. Os “devo” e os “tenho que” de Helena, traduzem as suas exigências irrealistas de que deveria ter tido mais poder ou controle.
  1560. Deprecia o seu valor culpando-se a si própria e menosprezando-se como pessoa. Ellen interpreta os acontecimentos do seu passado através de um sistema de convicções que produzem sentimentos de vergonha. O seu juiz interior formula esperanças rígidas em relação a sua atuação e envergonha-a quando ela se torna incapaz de alcançar esses objetivos inatingíveis.
  1561.  
  1562.  
  1563.  
  1564.  
  1565.  
  1566. Felizmente para Helena, dois dos seus companheiros ajudaram-na a abrir-se ao partilharem as suas próprias histórias com o grupo. Na verdade, Helena aprendeu a combater a sua lógica baseada na vergonha (D), ao levantar questões tais como: Quem? O que? E Por quê?
  1567.  
  1568.  
  1569. A -----------------
  1570. B ------------------
  1571. C -----------------
  1572. Pensamentos
  1573. Sentimentos
  1574. Crítica
  1575. Devia ter parado com o abuso
  1576. Vergonha
  1577. Quem diz que eu deveria ter parado com o abuso? Eu era uma criança, não tinha mais poder sobre os meus pais, do que eles tinham sobre a bebida.
  1578. Não devia ter alterado
  1579. Vergonha
  1580. Que escolhas é que eu tinha? Não somos todos impotentes quando crianças? Não sou responsável pelo comportamento dos meus pais. Pare de fazer exigências irreais!
  1581. Que criança antipática devo ter sido
  1582. Vergonha
  1583. Que provas tenho de que fui uma criança antipática? Não são todas as crianças simpáticas e merecedoras? Não são todas merecedoras de amor e carinho?
  1584. Em que adulto terrível fui me tornar
  1585. Vergonha
  1586. Só porque fui criticada no passado, não é razão para me criticar agora. Claro que não sou perfeita, mas que é? Não somos todos seres humanos falíveis e merecedores?
  1587. Ninguém pode tê-lo
  1588. Vergonha
  1589. Por que? Não sou responsável pela minha infância. Não são os meus pais os responsáveis pelo comportamento? Por terem abusado de mim no passado, não prova que agora seja um adulto sem valor.
  1590.  
  1591. ESTABELECER OBJETIVOS
  1592.  
  1593. À medida que a lógica de Ellen muda, fica livre para identificar os seus objetivos. Apesar do vazio e da vergonha não desaparecerem de um dia para o outro, sente-se cada vez mais bem disposta e menos preocupada.
  1594.  Estabeleceu o objetivo de viver uma vida produtiva, saudável, com o menos possível de vergonha. Para ajudar a alcançar esses objetivos, Helena continua a participar no grupo terapêutico de mulheres, e começou uma terapia individual. Entretanto, Ellen renova a sua emergente atitude de respeito por si própria com uma afirmação: “Sou Helena, uma pessoa falível e com valor, merecedora de respeito por mim própria e aos outros. Hoje vou me considerar uma pessoa com valor e merecedora”.
  1595.  
  1596.  
  1597.  
  1598.  
  1599.  
  1600.  
  1601.  
  1602. Como o juiz interior de Helena não é facilmente combatido, elaborou um plano concreto para ajudar a colocar em prática a sua nova afirmação. Como forma de se lembrar, liga a sua afirmação a uma atividade diária frequente. Como bebe quatro refrescos por dia, decidiu usar seu primeiro gole como sinal de que está na hora de repetir a sua firmação positiva. Uma vez terminada a sua afirmação, bebe o restante do refresco como “recompensa” pela sua nova atitude.
  1603. Mais tarde, Helena fez uma lista de atividades para atacar a vergonha com a ajuda do seu terapeuta de grupo. Se por um lado ela compreende algumas das suas atitudes baseadas na vergonha, também compreende que os seus sentimentos crônicos de vazio podem facilmente colocá-la em risco de cair de novo nos seus velhos comportamentos autodestrutivos. Embora se sinta cada vez melhor, sabe que os problemas relacionados com a vergonha não estão completamente resolvidos.
  1604. Helena também decidiu continuar a sua aprendizagem sobre a vergonha. Decidiu fazer um plano especial de leitura e encontrou um terapeuta especializado em adicção e abuso infantil. Planeja continuar o seu trabalho diário de autoafirmação. Como pretende continuar a frequentar o grupo de terapia de mulheres, decidiu fazer pelo menos mais dois trabalhos relacionados com a TER, a fim de ser capaz de discutir os seus problemas relacionados com a vergonha com o resto do grupo.
  1605. É óbvio que a vergonha de Helena tem origem nas experiências da infância e as suas atitudes exageradas sem relação a essas experiências e a si própria poderiam ter impedido o seu progresso. Mas, ao contestar a sua lógica, Helena tornou-se capaz de proceder às mudanças necessárias.
  1606.  
  1607. A HISTÓRIA DE WILSON
  1608.  
  1609. Em contraste, a vergonha de Wilson não tem origem na sua infância, mas está antes, diretamente relacionada com as consequências autodestrutivas da adicção. Quanto mais bebe, menos se valoriza. Embora se esforce por controlar o que bebe, os esforços resultam sempre em fracassos. Segundo Wilson, deveria ser capaz de controlar o que bebe. Wilson acredita firmemente que é mau e que não tem qualquer valor porque não consegue parar ou reduzir a bebida.
  1610. Jim não pode prever quando vai haver intervalos de abstinência ou intoxicações. Começa a se ver como um degenerado moral. Pensa que se tivesse qualquer valor ou dignidade não se degradaria a ponto de se encontrar permanentemente intoxicado e de sofrer humilhações públicas. À medida que a sua vergonha aumenta vai se afastando cada vez mais da família e dos amigos. Isolado, bebe ainda mais.
  1611. A convicção de Wilson de que não presta, baseia-se na exigência que faz a si próprio de que deveria ser capaz de controlar a bebida. O seu juiz interior exige força de vontade, autodomínio e condena o seu valor quando Wilson se torna incapaz de controlar o seu comportamento. A vergonha e o isolamento de Wilson são obstáculos à sua recuperação. – afastam de si próprio todos os que poderiam ajudar.
  1612.  
  1613.  
  1614. A -------------
  1615. B -------------
  1616. C --------------
  1617.  
  1618. Acontecimento
  1619. Pensamentos
  1620. Sentimentos
  1621. Consequências no comportamento
  1622. Beber continuamente
  1623. Deveria ser capaz de controlar a bebida.
  1624. Vergonha
  1625. Isolamento social, beber continuamente
  1626.  
  1627. É horrível não conseguir aguentar uma bebida.
  1628.  
  1629.  
  1630.  
  1631. Não passo de uma pessoa má.
  1632.  
  1633.  
  1634.  
  1635. A família e os amigos de Wilson não desistiram. Através do seu apoio e compreensão, Jim finalmente decidiu entrar em tratamento. No entanto, o juiz interior continuava a exigir o controle
  1636.  
  1637.  
  1638.  
  1639.  
  1640.  
  1641. total. Jim agarrava-se à exigência irrealista de que deveria ser capaz de controlar a bebida. Através dos esforços dos seus companheiros e da aprendizagem relacionada com o alcoolismo, Jim começou a questionar sua lógica em (D).
  1642.  
  1643.  
  1644. B ------------------
  1645. C ------------------
  1646. D ------------------
  1647. Pensamentos
  1648. Sentimentos
  1649. Discussão
  1650. Deveria ser absolutamente capaz de controlar o que bebo
  1651. Vergonha
  1652. Quem diz que deveria ser capaz de controlar a bebida? Não é verdade que o alcoolismo é uma doença? A doença não tem a ver com a força de vontade.
  1653. É horrível não ser capaz de aguentar uma bebida
  1654. Vergonha
  1655. Claro que não consigo aguentar nenhuma bebida. Para mim não se trata de controle voluntário. Uma vez que beba um copo só paro quando acabar a garrafa.
  1656. Não passo de uma pessoa má
  1657. Vergonha
  1658. Tenho que parar de “exagerar”! Tenho uma doença mas não sou uma pessoa má.
  1659.  
  1660. À medida que as suas convicções em relação ao alcoolismo foi mudando, ele foi se tornando mais consciente das exigências irrealistas que colocava à si próprio. Ao aceitar a sua impotência perante o álcool, Wilson passou também a aceitar a sua condição humana com tudo o que ela implica de capacidades e limitações.
  1661. A vergonha de Wilson tem origem na convicção de que precisa controlar o que é incontrolável. Para Wilson, reconhecer as suas limitações como ser humano é uma tarefa em curso, já não luta para ser perfeito.
  1662.  
  1663. COMEÇAR A AGIR
  1664.  
  1665. À medida que Wilson ia progredindo, o seu consultor lhe deu uma série de recomendações úteis. A fim de reduzir a sua vergonha, Wilson precisava se tornar mais flexível em relação às expectativas que tinha dele próprio e dos outros. Desde que Jim passou a se aceitar como um ser humano digno e falível deixou de haver razão para continuar a dar ouvido ao seu juiz interior. A sua falta de controle ou a impotência deixaram de ser ameaças ao seu valor como pessoa e passaram simplesmente a fazer parte das características de um ser humano. Quaisquer esforços para controlar o incontrolável o levariam ao fracasso, e muitas vezes a auto recriminação e a vergonha. Tendo isto em mente, Wilson concordou em participar das seguintes atividades:
  1666. - Encontrar um grupo de apoio. Wilson descobriu a necessidade de frequentar um grupo de apoio que o ajudasse a identificar parte do seu pensamento baseado na vergonha, bem como o seu comportamento derrotista. Chegou à conclusão que as suas atitudes continham muitas vezes uma necessidade de controlar que minavam a aceitação do seu alcoolismo. Ele concordou frequentar pelo menos dois grupos diferentes: AA e um grupo de terapia para homens.
  1667. - Fazer um trabalho da TER. Antes de completar o seu tratamento, Wilson fez um trabalho suplementar de TER, para desafiar a sua mania de exigência, aquilo a que o seu consultor se referia como dizer “devo” demais. Jim aprendeu que palavras como “devo” e “tenho”, representam muitas vezes exigências irreais, e são palavras chaves que precisam ser questionadas ao mudar as suas atitudes. Com isto em mente, Wilson começou a fazer o seu trabalho de TER sobre sentimentos de vergonha relacionados com o seu casamento. Wilson escreveu a palavra “vergonha” como um problema emocional em “C” (sentimentos). Wilson sabia que os seus sentimentos de vergonha
  1668.  
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  1670.  
  1671.  
  1672.  
  1673. estavam intimamente ligados com o isolamento social e a bebida. Por baixo de “A” (acontecimento), identificou um acontecimento recente que o tornou consciente dos seus sentimentos de vergonha – lembrou-se que o último encontro com a sua mulher, o tinha levado a sentir uma forte vergonha. Wilson refletiu sobre os pensamentos que teve durante o encontro com a sua mulher e os escreveu embaixo de “B” (pensamentos):
  1674.  
  1675. Devia ser capaz de alterar os sentimentos da minha mulher.
  1676. É horrível vê-la chorar.
  1677. Não devia ter me tornado um alcoólico.
  1678. Sou uma pessoa horrível.
  1679.  
  1680. Ao compreender as ferramentas básicas da TER, Wilson questionou a sua lógica ao escrever uma crítica ao seu pensamento embaixo de “D” (discussão).
  1681.  
  1682. Quem diz que eu devia ser capaz de alterar os sentimentos da minha mulher? Não posso controlar as emoções dela.
  1683. É desagradável vê-la chorar e gostaria que ela não tivesse que passar por isto. Talvez as lágrimas lhe tragam algum alívio emocional.
  1684. O alcoolismo é uma doença, não é uma questão de força de vontade. “Para de dizer “devo” o tempo todo”.
  1685. Sou um ser humano falível e digno. Tenho lutado contra esta doença horrível. Não sou uma pessoa má.
  1686.  
  1687. Ao questionar o seu próprio pensamento, Wilson formulou um objetivo que o ajudasse a guiar o seu comportamento (E). Wilson reconheceu a sua necessidade de dar apoio emocional a mulher ao mesmo tempo em que tentava reduzir a sua vergonha. Assim, fez uma lista das seguintes ações construtivas que deveria efetuar para alcançar o seu objetivo:
  1688.  
  1689. Falar sobre as minhas preocupações e apoio com a minha mulher.
  1690. Convidá-la para participar de um “workshop” de comunicação entre casais.
  1691. Apoiar o envolvimento da minha mulher num grupo de ajuda.
  1692. Fazer mais dois trabalhos da TER para identificar problemas específicos relacionados com a vergonha.
  1693.  
  1694. Wilson aprendeu depressa que, ao desafiar conscientemente as suas convicções e ao modificar os seus comportamentos, tornava-se capaz de reduzir os sentimentos de vergonha, ao mesmo tempo em que oferecia apoio emocional à sua mulher. Ao aceitar a sua impotência sobre o álcool, também reconheceu as suas outras limitações. Era com certeza uma pessoa falível, mas não era certamente uma pessoa “má” ou “horrível”. Wilson passou a acreditar que é humano cometer erros, ter um controle limitado sobre a sua vida e ter uma doença como o alcoolismo. Ao aceitar a sua humanidade, Wilson deu um primeiro passo, fundamental para os alicerces da sua recuperação, ao mesmo tempo em que começava a se libertar da auto recriminação, das exigências irreais e dos sentimentos de vergonha.
  1695.  
  1696. RESUMINDO...
  1697.  
  1698. Seguem-se seis coisas importantes para nos lembrarmos sobre a vergonha;
  1699.  
  1700.  
  1701.  
  1702.  
  1703.  
  1704.  
  1705.  
  1706.  
  1707. * A vergonha é um sentimento penetrante de inutilidade. A vergonha é diferente da culpa; é uma simples reação ao nosso mau comportamento. A vergonha é, muitas vezes um sentimento crônico de inadequação, de vazio e de dúvida em relação à nós próprios.
  1708. * A vergonha tem muitas vezes origem na infância e na adolescência, vinda de um sistema familiar doentio. A criança ou o adolescente acreditam que as críticas que a família lhes faz são plenamente justificadas e cresce acreditando que eles não têm nenhum valor ou utilidade. Somos impotentes em relação àquilo que aprendemos quando crianças.
  1709. * A vergonha pode também ser uma consequência da adicção. A incapacidade de parar ou de controlar um comportamento adictivo nos leva frequentemente a desvalorização pessoal.
  1710. * Os sentimentos intensos de vergonha resultam em comportamentos derrotistas tais como: afastamento social, isolamento e em comportamentos adictivos, tais como não parar de comer, jogar compulsivamente ou beber excessivamente. Portanto, a vergonha representa um fator de risco para a recaída.
  1711. * A vergonha envolve geralmente um juiz interior que nos exige um comportamento rígido e que nos envergonha quando não conseguimos cumprir essas exigências. A vergonha balança muitas vezes entre as expectativas perfeccionistas e a autocondenação. O “juiz interior” representa de fato o nosso conjunto de crenças.
  1712. * Já que a vergonha é inventada e aprendida, também pode ser “destruída” e “desaparecida”. Usando os recursos ao nosso dispor, que incluem as ferramentas básicas da TER, podemos reduzir com sucesso os nossos sentimentos de vergonha – isto é, sentir vergonha menos intensamente e com menos frequência.
  1713.  
  1714. UM TRABALHO DA TRE (Exercício)
  1715.  
  1716. Agora é a sua vez! Tal como qualquer comportamento novo, você precisa praticar a redução dos seus sentimentos de vergonha. A sua tarefa é acabar um trabalho da TER e, para isso, talvez precise de um bloco de notas. Eis algumas sugestões a considerar quando fizer o seu trabalho:
  1717. * Identifique a vergonha. Comece primeiro por identificar o sentimento de vergonha que o preocupa; observe os comportamentos derrotistas geralmente relacionados com a vergonha, seja específico; pense num exemplo retirado da sua experiência.
  1718. * Identifique o acontecimento. Em seguida identifique o acontecimento motivador. Pense numa ocasião em que uma ação específica tenha provocado um sentimento intenso de vergonha. Pode ter sido informação (feedback) que lhe deram durante uma terapia de grupo ou um comentário feito pelo seu parceiro. Em qualquer dos casos, seja o mais objetivo, concreto e específico possível, ao identificar o acontecimento (A).
  1719. * Identifique os seus pensamentos e sentimentos. A próxima tarefa é identificar os seus pensamentos (B). Reveja os exemplos de Helena e Wilson. Geralmente, os sentimentos de vergonha (C) são iniciados por exigências irreais, tendência para exagerar o lado negativo e desvalorização pessoal.
  1720. Critique o seu pensamento. Questione a sua lógica (D). Aqui, critique os seus pensamentos, conteste a sua lógica e desenvolva uma alternativa mais racional. Estabeleça objetivos. Pense em quais são os seus objetivos menos vezes e menos intensamente. É melhor sentir pena e remorso do que vergonha e incerteza. Reduzir a vergonha é sem dúvida um objetivo importante para se atingir uma verdadeira recuperação. Frequentemente, este objetivo ajuda a orientar a nossa ação construtiva.
  1721. Comece a agir.
  1722. Faça uma lista de todas as ações construtivas que pode tomar para alcançar o seu objetivo (E). Seja o mais específico e concreto possível. Numere a lista e mantenha-a simples, se concentrando na ação.
  1723. Agora que acabou em exercício escrito de TER a sua próxima tarefa é partilhar este trabalho com outros. Procure mais ajuda e opiniões em relação ao seu pensamento (B). Pergunte aos seus
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  1729. companheiros se falhou alguma coisa. Talvez tenham algumas idéias que o ajudem a questionar a sua lógica (D). Talvez algum deles tenha alguma ação a acrescentar à lista que você fez em “E”. Use o seu trabalho de TER como catalisador para discutir os seus sentimentos, as suas atitudes baseadas na vergonha e as suas idéias alternativas. Quanto mais envolver outras pessoas no processo, mais rapidamente aprenderá maneiras de reduzir os seus sentimentos de vergonha.
  1730. Não se esqueça de utilizar outros métodos de autoajuda para atacar os sentimentos de vergonha. Lembre-se que Helena usava afirmações para reforçar as suas atitudes de respeito por si própria. Wilson, por exemplo, identificava as situações em que detinha o controle, e que bloqueavam a aceitação de sua adicção e humanidade. Ambos se deram ao trabalho de informar os respectivos padrinhos de que a vergonha era um fator de risco para recair.
  1731. Não desista facilmente. Provavelmente há muitos anos de prática de comportamentos baseados na vergonha. Terá por isso, que praticar bastante para encontrar novos comportamentos que o ajudem a superá-los. Há uma série de recursos que podem ajudar: grupos de autoajuda, terapia individual e de grupo, aconselhamento em longo prazo e grupos de prevenção à recaída. Alterando as suas atitudes e modificando os seus comportamentos, pode reduzir os sentimentos de vergonha, diminuir o risco de recaída e viver as alegrias de uma vida feliz e saudável.
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  1758. RAIVA
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  1777. Por que nos preocupamos com a raiva? No fim das contas, não é verdade que todos nós sentimos raiva? De fato, a raiva é um sentimento humano que todos experimentamos de vez em quando. O principal problema está nas consequências, o que acontece quando você fica com raiva? Se não acontece nada quando você fica com raiva, então a sua raiva não é razão para preocupação, porque as consequências são limitadas. No entanto, se tiver atitudes derrotistas em relação a si ou se fizer mal aos outros, e se a sua raiva tiver consequências dolorosas ou prejudiciais, então talvez tenha razão para se preocupar com ela.
  1778. Por exemplo: você está guiando por uma autoestrada, atrás de uma pessoa que conduz a 50 km, quando a velocidade permitida é de 80 km, e se atrasa para um encontro. Começa a sentir-se muito irritado por causa disso, ultrapassa impudentemente o outro carro. Põe a sua própria vida e a dos outros em risco por causa da sua condução imprudente, ou seja, potencialmente uma consequência muito perigosa da sua raiva.
  1779. Outro exemplo das consequências nocivas da sua raiva poderia ser o seguinte:
  1780. - Já é tarde, você quer ir embora do trabalho mais cedo, para jogar futebol. Começa a trabalhar mais cedo e também trabalha na hora do almoço, para compensar o fato de sair mais cedo. No meio da tarde, aparece o seu patrão e lhe dá uma nova tarefa, e quer que seja feita antes de você ir embora. Você obedece, mas só acaba a tarefa muito tarde, quando já não dá mais para jogar futebol. Enquanto o tempo vai passando, mais você se sente furioso. Quando sai do trabalho, para num bar a caminho de casa, para aliviar um pouco da sua raiva. Acaba bebendo demais, chega a sua casa muito tarde e tem uma discussão com a sua mulher, a quem não se preocupou em telefonar para avisar que chegaria mais tarde.
  1781. Ou , em vez de parar num bar, pode ir diretamente para casa depois do trabalho, de muito mau humor. Tropeça nos brinquedos das crianças, espalhados pela sala, onde os seus filhos estiveram brincando, esperando você chegar. Despeja a sua raiva contra as crianças, as mandando arrumarem a sala; ao ver que elas demoram a arrumar os brinquedos, você finalmente, num ataque de fúria, ordena que elas vão para cama. Depois, senta-se para jantar com a sua mulher e a acusa violentamente por ser uma péssima mãe.
  1782. Para alguns de nós, as consequências dolorosas ou prejudiciais da raiva, resultam em expressarmos abertamente contra as outras pessoas. Exemplos extremos dessas consequências são as formas de violência doméstica e de brutalidade contra as crianças. Por outro lado, alguns de nós podemos negar os sentir dificuldade em aceitar e falar abertamente sobre os sentimentos de raiva, contra as outras pessoas. Podemos esconder a nossa raiva, guardando ela para nós mesmos, engolindo ela dentro de nós. Podemos ter medo de que os outros não gostem, se a manifestarmos francamente.
  1783. Nós reprimimos a nossa raiva, qualquer que seja a razão, fazíamos o uso de drogas para amenizar o sentimento de raiva, ou seja, reprimíamos nossos sentimentos. Enquanto usávamos, podemos ter nos tornado pessoas fisicamente hostis.
  1784. Outros de nós podem ter escondido os seus sentimentos de raiva, mas depois descontam essa raiva contra pessoas que o amam.
  1785.  
  1786. APRENDER A COMPREENDER A RAIVA E AS SUAS CAUSAS
  1787.  
  1788. Aprender a lidar com a raiva de forma saudável, sem fazer mal a nós próprios ou aos outros, é uma parte importante de nossa vida. Embora seja importante para todos nós, sermos capazes de enfrentar de forma eficaz a nossa raiva, para alguns, isso se torna especialmente importante.
  1789. Se estivermos em recuperação das drogas e do álcool ou de problemas emocionais, podemos correr o risco de uma recorrência desses problemas se não aprendermos a controlar a nossa raiva.
  1790. “Irrita-me tanto”.
  1791. A maior parte de nós pensa que são as outras pessoas ou situações que nos fazem ficar irritados. Achamos que o que as outras pessoas fazem ou o que nos acontece que isso é o que causa a
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  1797. nossa raiva. Atiramos para cima dos outros a responsabilidade da nossa raiva “eles me deixam loucos”. Ou achamos que temos um gênio ruim, como se fôssemos sempre desse jeito e não poderíamos mudar. Achamos que não podemos mudar esses sentimentos perturbados sem que as “causas” (pressões exteriores ou outras pessoas) mudem. Acusar nos permite racionalizar a nossa raiva. Arranjamos desculpas para os nossos sentimentos de raiva, colocamos a culpa nos outros e nos recusamos a mudar o nosso jeito.
  1798. Para alguns de nós, culpar outras pessoas ou situações pela nossa raiva nos fornece uma desculpa para usar álcool ou drogas. Para outros, essa acusação constitui uma justificação para a nossa raiva, e por isso não a largamos.
  1799. Contrariamente à crença comum sobre a raiva (de que os casos ou as situações é que nos fazem ficar irritados) o que realmente nos faz sentir e pensar com raiva sobre as coisas que nos acontecem. Aquilo que pensamos ou que contamos a nós mesmos sobre um acontecimento é que nos faz sentir raiva, e não o acontecimento em si mesmo.
  1800. Normalmente, quando julgamos ou avaliamos qualquer coisa de forma negativa ficamos perturbados. Se julgarmos ou avaliarmos uma coisa de forma menos negativa ou mais positivamente, nos sentimos de forma geral, melhor.
  1801. Basicamente, não são os acontecimentos que nos perturbam, mas sim a nossa forma de pensar sobre esses acontecimentos. Por outras palavras, sentimos como pensamos.
  1802.  
  1803. UM EXEMPLO
  1804.  
  1805. Uma mãe leva o filho de 1 ano para visitar uma amiga. A criança engatinha pelo chão enquanto as duas mulheres conversam. Certa hora, a criança se estica até a mesinha onde estão algumas revistas e então começa a jogar as mesmas no chão.
  1806. A mãe afasta a criança da mesa, coloca as revistas na mesa e continua a conversar com a amiga. A criança volta a engatinhar até a mesinha, se estica, e começa de novo a jogar as revistas no chão. A mãe observa a situação e pensa consigo mesma: “-Ele não devia fazer isto...” “Não devia ser tão irritante...” “Não devia interromper a minha conversa...” “Não devia me aborrecer...” A mãe grita e bate na criança, e a criança a chorar.
  1807. A amiga também observou a criança jogando as revistas no chão e pensa com ela: “É próprio de uma criança de 1 ano mexer nas coisas” “Teria sido melhor se eu tivesse preparado a sala para poder receber uma criança antes de chegarem” “A criança precisa se distrair.” A amiga diz então: “Vamos ver se encontramos outras atividades que interessam ao seu filho.” Este exemplo demonstra como sentimos da forma como pensamos.
  1808. Com base na forma como encararam a situação, uma das mulheres ficou irritada e a outra não. Aquilo que pensaram ou disseram a si próprias, a forma como avaliaram as circunstância determinou o que sentiram.
  1809. Então, o que estamos dizendo realmente é que o nosso pensamento a respeito de uma situação é que causa a nossa raiva, e não a situação em si. A maneira de pensar que provoca em nós sentimentos de raiva tem a ver com a nossa necessidade de controle e a nossa exigência de que tudo seja feito da nossa maneira. A sequência começa quando queremos que as coisas corram segundo a nossa vontade, o que é um exemplo normal do egocentrismo que todos nós temos. Quando esse desejo não se realiza e não conseguimos aquilo que queremos, podemos ficar com raiva.
  1810. No entanto, o que acontece com a nossa raiva, é que a nossa forma de pensar muda ou se desvia quando queremos que tudo seja exatamente do nosso jeito (tem que ser como eu quero!). Quanto mais sentimos raiva, mais exigimos que as coisas sejam do nosso jeito, mas não conseguimos.
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  1820.  
  1821. EGOCENTRISMO: A necessidade de controlar “Conseguir o que quero”.
  1822.  
  1823.  
  1824. FLEXÍVEL
  1825. RÍGIDO
  1826. Querer que as coisas corram como eu quero e não conseguir. Eu quero, desejo ou prefiro uma coisa e não obtenho: consequência – raiva (sentimento de perturbação normal).
  1827. Exigir que as coisas corram como eu quero e não conseguir. Devia ter, tenho que ter uma coisa e não consigo: consequência – ira, ódio, rancor (sentimentos de perturbação intensa).
  1828.  
  1829. CONSEQUÊNCIAS DA NOSSA RAIVA
  1830.  
  1831. As consequências da nossa raiva movida por ressentimentos ou crenças errôneas, serão sempre tentando conseguir o que queremos sendo agressivos, verbal ou fisicamente (gritando, berrando ou batendo). O que acontece com a nossa relação com os outros, se usarmos a raiva para conseguir o que queremos? Como é que os outros nos veem? Evitam-nos? Ignoram-nos? E como é que isto nos atinge sobre a aceitação que temos de nós próprios?
  1832.  
  1833. UM EXEMPLO:
  1834.  
  1835. É sábado de manhã e você faz questão de arrumar uma cadeira de madeira do pátio, que se partiu. Desce até a sua oficina no porão, abre a porta e descobre que seu filho de dez anos deixou todas as suas ferramentas espalhadas pelo porão. Observa a cena e pensa “O que é que se passa com aquele rapaz?” “Ele deveria saber que não pode deixar as minhas jogadas no chão”. “Ele tem que se lembrar do que eu disse sobre arrumar as coisas”. “Não devia ter feito isso”. “As minhas ferramentas tem de ficar arrumadas como deve ser”. “Vai ver o que vai acontecer quando chegar em casa”. Em consequência disto, você sente raiva. Procura então o martelo e não consegue encontrá-lo e pensa: ”Não devia perder meu tempo procurando o martelo” e cada vez se sente mais furioso. Finalmente encontra o martelo e os pregos, e começa a arrumar a cadeira. Com a irritação, acaba entortando um dos pregos e pensa novamente “Isto não deveria acontecer” e fica cada vez mais furioso. Ao tentar endireitar o prego, bate com o martelo em seu polegar e grita “Não posso aguentar isto!” Enche-se então de raiva (fica irado e irritado) e joga o martelo longe, que acaba batendo no banco que estava contra a janela, quebrando o banco e a janela. Arrasta-se pesadamente pelas escadas. Tendo por costume usar álcool ou drogas para aliviar a sua raiva, pode ser que se dirija para uma destas saídas. Abre a geladeira, pega uma cerveja e vai para a sala beber enquanto assiste Palmeiras x Corinthians na TV, pelo resto da tarde. Depois se torna implicante e critica os outros membros da família até o fim do dia. Ou, se não for dependente químico, pode talvez subir as escadas, sentar-se numa cadeira cozinhando a sua irritação até que seu filho de dez anos chegue em casa. Então grita com ele dizendo-lhe que é “um irresponsável, que não presta para nada, e que não pode confiar nele para nada”. Depois, o manda para o quarto e o deixa de castigo por todo o fim de semana. Nesse exemplo, foram as exigências do pai de que o filho não devia ter deixado as suas ferramentas jogadas pelo chão e que deveria fazer as coisas do seu jeito e isso acabou o irritando. Se ele tivesse alterado as suas exigências para as preferências, não teria ficado como raiva. O diálogo interior poderia ter sido estruturado dessa forma:
  1836. “Teria sido melhor se ele tivesse arrumado as ferramentas quando acabou.”
  1837. “Era melhor se ele deixasse as coisas arrumadas como eu deixo.”
  1838. Com estas preferências mais realistas, o pai poderia então ter conversado com o filho a respeito do assunto, e explicado sobre as vantagens da ordem e do respeito pelas coisas dos outros. Há outro aspecto a considerar no desenrolar dos sentimentos de raiva. Quando ficamos com raiva por causa daquilo que pensamos, essa raiva pode distorcer os nossos pensamentos ou percepções sobre a situação, tal como se víssemos as coisas através de “óculos da raiva”. É difícil observar uma situação
  1839.  
  1840.  
  1841.  
  1842.  
  1843. positivamente ou com realismo quando estamos com raiva, é provável que agir segundo estas percepções distorcidas, torne a situação ainda pior ou agrave perante as suas consequências negativas. A maior parte de nós poderá recordar situações em que a raiva nos impediu de observarmos e compreendermos claramente o que se estava a passar.
  1844.  
  1845. APRENDER A CONTROLAR NOSSA RAIVA
  1846. Como poderemos então controlar os nossos sentimentos de raiva? Se for a nossa maneia irada de pensar que causa a nossa raiva, terá de trabalhar para modificar ou substituir os nossos pensamentos irados de forma a reduzirmos ou controlarmos essa raiva. Podemos alternar as exigências que estão na base dos nossos pensamentos irados (não deveria discordar de mim, eu não devia cometer erros, tem de ser pontual) e nos esforçarmos para deixar de controlar tudo ao nosso redor. Isto poderá parecer simples e evidente, mas como é que se aprende a modificar a nossa forma irada de pensar? Para começar, podemos fazer um “inventário pessoal”. Fazer um inventário pessoal sobre a nossa raiva, nos ajuda a desenvolver uma maior consciência e compreensão quanto a sua origem, quanto às suas consequências de ficarmos amarrados a essas situações e quanto ao que nossos sentimentos e a tomar consciência da nossa necessidade de controle. Pode usar o esquema “ABC” para ajudar a compreender a “anatomia” da raiva.
  1847.  
  1848. A = Situação
  1849. O problema que nos desperta certos sentimentos que perturbam ou enraivecem.
  1850.  
  1851. B = Convicções
  1852. O que pensa ou o que diz a si mesmo (as suas exigências) a respeito da situação.
  1853.  
  1854. C = Sentimentos e ações
  1855. Como se sente (perturbado ou enraivecido) a propósito da situação por causa do que pensa, e como se comporta ou atua por causa do que sente: as consequências derrotistas ou dolorosas.
  1856.  
  1857. UM EXEMPLO
  1858.  
  1859. A = Situação
  1860. Vou para a cozinha esperando que o meu almoço esteja pronto, antes de ir trabalhar. Encontro minha mulher ajudando nossa filha com os deveres da escola. Sendo assim, meu almoço ainda não está pronto.
  1861.  
  1862. B = Convicções
  1863. Acho que minha mulher poderia ter feito meu almoço e que minha filha deveria fazer os deveres da escola sozinha.
  1864.  
  1865. C = Sentimentos e ações
  1866. Sinto-me cheio de raiva. Grito com ela. Digo que meu trabalho é mais importante do que os deveres da escola de uma criança e saio violentamente de casa. Chego ao trabalho muito irritado.
  1867.  
  1868. Se eu tivesse analisado essa situação de forma objetiva ou realista, teria compreendido que a minha mulher já tinha feito uma opção ao ajudar a nossa filha nos deveres da escola. As coisas do meu jeito apenas refletiam as minhas exigências egocêntricas, e geraram a raiva que tive em casa e levei comigo ao trabalho.
  1869.  
  1870.  
  1871.  
  1872.  
  1873.  
  1874.  
  1875.  
  1876.  
  1877. FAZER UM “DIÁRIO DE BORDO”
  1878. Como parte do processo de aprendizagem para fazer um inventário pessoal sobre a sua raiva, é muito útil fazer um “diário de bordo”. Para começar, tome nota de acontecimentos ou situações passadas ou recentes em que sentiu raiva. Ao descrever essa experiência, use o esquema "ABC”.
  1879.  
  1880.  
  1881. A
  1882. B
  1883. C
  1884. Situação
  1885. Convicções
  1886. Sentimentos e ações
  1887.  
  1888. Depois de ter alguma prática na descrição de manifestações da sua raiva, passadas ou recentes, pode considerar útil trazer consigo um pequeno bloco para fazer um registro diário das suas manifestações de raiva. Ao longo do dia, pode usar o esquema “ABC” para tomar nota de exemplos dos seus sentimentos de raiva. Fazer um diário, o ajuda a desenvolver uma maior consciência da sua raiva, das causas e consequências. Fazer um diário o ajuda também a ter contato com os seus sentimentos.
  1889.  
  1890. USAR O PROCESSO “ABC” – ABRANDAR A “FERRADURA”
  1891.  
  1892. A primeira parte do processo ABC para o controle dos sentimentos de raiva pode ser comparado à analogia entre a chaleira e a raiva. Podemos imaginar a nossa raiva como sendo a água dentro de uma chaleira sobre o fogão. Se a água continuar a aquecer, sairá pela chaleira em forma de vapor.
  1893. Com a nossa raiva acontece o mesmo (quanto mais sentimos raiva, mais provável que ela se exteriorize abertamente). Algumas pessoas acreditam que a melhor forma de lidar com a raiva é ficarem aliviadas, será como a chaleira.
  1894. No entanto, se apagar o fogo debaixo da chaleira não terá o jato de vapor. Aquilo que o processo ABO nos mostra é que se “diminuirmos a chama” dos pensamentos irados que estão “fervendo” da nossa raiva, não haverá necessidade de expelir essa raiva. Mantendo-nos alerta para detectar os primeiros sinais de raiva e nos dirigindo uma mensagem de auto ajuda, não ficaremos tão “enfurecidos” que tenhamos que “despejar o vapor”.
  1895.  
  1896. USAR O D – PÔR EM QUESTÃO A NOSSA FORMA DE PENSAR
  1897.  
  1898. O passo seguinte na aprendizagem do controle da raiva consiste em acrescentar um D ao esquema ABC, a fim de provocar uma mudança. É aqui que começamos a modificar os nossos sentimentos de raiva ao questionarmos os nossos pensamentos irados (as nossas exigências). Praticando o inventário pessoal ABC aprendemos a identificar os pensamentos perturbados, exigentes e negativos que nos fazem sentir raiva. Em seguida, vamos por os seguintes tipos de questões: Quem disse isso? Por quê? Que provas eu tenho? Haverá outra forma que me possa ser mais útil na análise da situação? Por fim, respondemos as nossas perguntas... Voltemos agora ao exemplo da condução previamente citado, e o colocamos em formato ABC.
  1899.  
  1900. UM EXEMPLO
  1901. A = Situação
  1902. Estou seguindo em uma estrada atrás de um carro que vai a 50Km tendo a estrada o limite de 80Km e estou atrasado para um compromisso.
  1903.  
  1904. B = Convicções
  1905.  Esta pessoa devia dirigir de acordo com o limite de velocidade. Não devia me atrasar. Tenho que chegar a tempo para o meu compromisso.
  1906.  
  1907.  
  1908.  
  1909.  
  1910.  
  1911.  
  1912. C = Sentimento
  1913. Raiva.
  1914.  
  1915. D = Discussão
  1916. Quem é que disse que ele devia andar a 80Km? (fui eu). Porque ele não pode ir à minha frente? Não há razão para que eu tenha sempre de fazer a minha vontade. Porque eu deveria chegar na hora certa? Não vai ser nenhuma desgraça se eu chegar atrasado; iriam me compreender. Deixe de controlar tudo a sua maneira. Talvez a pessoa esteja dirigindo o mais rápido que é capaz. Era melhor eu esperar e ultrapassar quando seguro.
  1917.  
  1918. No passo D do esquema ABC, iniciamos o processo de enviar a nós mesmos algumas mensagens novas para afastarem ou tomarem o lugar dos nossos pensamentos egocêntricos e exigentes. Este “gênero” de mensagens novas que nos dirigimos e que nos prestam auxílio são mais realistas e menos perturbados, e podem nos ajudar a reduzir a nossa necessidade de controle.
  1919.  
  1920. RESOLVER OS PROBLEMAS – ACRESCENTAR E, F e G
  1921.  
  1922. Usar o esquema ABC como inventário pessoal nos ajuda a ter uma visão mais clara dos fatores que contribuem para sentirmos raiva e saber como começar o processo de mudança.
  1923. Compreender isto nos leva a seguir os passos (E, F e G) do esquema ABC. Mantendo um simples diário sobre a nossa raiva, podemos desenvolver uma maior consciência a seu respeito e a respeito das suas consequências. Podemos então começar a modificar a nossa forma de pensar irada e exigente, nos fazendo perguntas que ajudem a reduzir a raiva que sentimos. Descobriremos que determinadas situações provavelmente nos perturbarão ou enraivecerão menos, se colocarmos em questão a nossa forma de pensar.
  1924. Quando estivermos menos perturbados, poderemos analisar o problema claramente e decidir como fazer para que a situação se desenrole, criando objetivos realistas para nós mesmos (E). Podemos nos perguntar: “O que eu posso mudar nesta situação e o que eu tenho que aceitar?” Isto se aplica na Oração da Serenidade: “Concedei-me Senhor a serenidade necessária, para aceitar as coisas que não posso modificar, coragem para modificar aquelas que eu posso e sabedoria para distinguir uma das outras.”
  1925. Tendo decidido aquilo que quer que aconteça, pode perguntar a si mesmo: O que eu posso fazer de útil para obter aquilo que quero? Como consequência começa a perceber quais são as opções construtivas (F) para alcançar os seus objetivos. Seleciona então uma opção e põe ela em prática (G).
  1926.  
  1927.  
  1928. A = Situação
  1929. A situação problemática que está causando alguns sentimentos que o perturbam ou enraivecem.
  1930.  
  1931. B = Convicções
  1932. O que pensa a respeito da situação ou o que diz dela a si mesmo (as suas exigências).
  1933.  
  1934. C = Sentimentos e Ações
  1935. O que sente (perturbação ou raiva) a respeito da situação por causa do que pensa, e como age por causa do que sente (as consequências derrotistas ou dolorosas).
  1936.  
  1937. D = Discussão
  1938. Questionar e desafiar os pensamentos que o perturbam ou enraivecem as suas exigências. Quem disse isso? Por quê? Haverá uma maneira mais eficaz de encarar a situação?
  1939.  
  1940.  
  1941.  
  1942.  
  1943.  
  1944.  
  1945. E = Objetivos realistas
  1946. Novos objetivos realistas em relação a situação. O que gostaria de ver acontecer? O que quer?
  1947.  
  1948. F = Opções construtivas
  1949. O que poderá fazer de útil para obter o que deseja?
  1950.  
  1951. G = Coloque a sua opção em prática
  1952. Selecione uma opção e a coloque em prática. Ação construtiva!
  1953.  
  1954. UM EXEMPLO:
  1955. A = Situação
  1956. Fim de tarde. Você está na cozinha seguindo com todo o cuidado uma complicada receita de bolo e pesando os ingredientes. De repente, os seus filhos entram na cozinha correndo, gritando e pedindo bolachas. Eles se esticam por cima da bancada para chegar à lata de bolachas; fazendo isso derrubam a tigela com os ingredientes que você estava pesando.
  1957.  
  1958. B = Convicções
  1959. Pensa consigo mesmo: “O que essas crianças têm?” “Não são capazes de ver que estou ocupado e não posso ser interrompido?” “Não deviam entrar correndo desta maneira.” “Deviam ter mais consideração por mim.” “Não suporto que me interrompam assim.”
  1960.  
  1961. C = Sentimentos e Ações
  1962. Se sente cheio de raiva. Grita com os seus filhos. Os chama de “egoístas e estourados”. Não os deixa comer. Manda-os para o quarto e diz a eles que não poderiam sair de lá antes que os chame.
  1963.  
  1964. D = Discussão
  1965. Começa a questionar as suas exigências: Quem é que disse que eu não poderia ser interrompido? Fui eu quem disse. As interrupções acontecem. Se eu tivesse olhado para o relógio tinha visto que as crianças estavam chegando Por que é que não iriam correndo para cozinha comer? Eu sei que o dia de escola é muito comprido para elas e que esperam lanchar quando chegam a casa. Seria melhor se mostrassem mais consideração pelas minhas necessidades, mas eu também tenho de mostrar consideração pelas necessidades delas. Era melhor se não me interrompessem quando estou na cozinha, mas posso aguentar as interrupções! Se sente agora desapontado e frustrado, mas não com raiva.
  1966.  
  1967. E = Objetivos realistas
  1968. No futuro, gostaria de poder acabar de cozinhar sem ser interrompido, mas gostaria também de evitar ter discussões com os meus filhos quando chegam da escola.
  1969.  
  1970. F = Opções construtivas
  1971. Podia preparar a comida para uma ocasião em que as probabilidades de ser interrompido fossem menores. Quando for possível, planejarei o trabalho de forma que esteja pronto quando os meus filhos chegarem a casa. Terei alguma coisa preparada para comerem quando chegarem.
  1972.  
  1973. G = Colocar as opções em prática
  1974. A próxima vez que fizer um bolo, o farei de manhã, depois do almoço talvez. Durante esta semana, pelo menos três tardes, deixarei em lanche para quando as crianças chegarem. Também deixarei em tempo livre para quando as crianças voltam da escola e mostrar interesse pelas atividades que tiveram durante o dia.
  1975.  
  1976.  
  1977.  
  1978.  
  1979.  
  1980.  
  1981. Controlar a raiva que sente através do processo ABC, você terá que praticar muito até conseguir alguns resultados. É por isso que muitos de nós nos tornamos “especialistas” em ficar com raiva. A raiva se torna a forma habitual de lidar com situações problemáticas, quando as coisas não acontecem como gostaríamos. O que isto significa, é que iria precisar de muita prática para aprender a controlar a raiva através do processo ABC, e “desaprender” os seus velhos hábitos.
  1982.  
  1983. MAIS SOBRE O PROCESSO ABC
  1984.  
  1985. Pode usar o processo ABC quando começar a sentir raiva. Começa treinando a perceber os sinais iniciais dos seus sentimentos de raiva, e os utiliza como sinais de “STOP”. Foca-se ao entrar em contato com os seus sentimentos de raiva no momento exato em que começar a se sentir perturbado. É mais fácil fazer qualquer coisa para controlar e transformar esses sentimentos de frustração e desapontamento, quando está começando a se sentir perturbado, do que quando já está furioso ou com um acesso de fúria.
  1986. Controlar os nossos sentimentos é como controlar um carro. É mais fácil controlar a velocidade de um carro que vai a 20Km por hora do que daquele que vai a 80Km. Da mesma forma, é mais fácil acalmar os nossos sentimentos antes que eles comecem realmente a se tornar incontroláveis.
  1987. O que isto significa é que cada um de nós tem de desenvolver uma maior consciência dos sinais ou indicações da nossa raiva, igual como cerramos os dentes e passamos mal do estômago. As formas como cada um exterioriza a sua raiva são diferentes. Uma das primeiras tarefas para aprendermos a controlar a raiva é aprendermos a identificar as suas manifestações de forma que podemos usar como avisos para pararmos. Então, enviando mensagens mais realistas, podemos nos sentir frustrados e desapontados com o comportamento das pessoas, mas não teremos raiva nem jogaremos pragas nelas.
  1988.  
  1989. USAR MENSAGENS ÚTEIS
  1990.  
  1991. O passo seguinte no processo ABC consiste em utilizar estas pistas como sinal inicial para sua raiva, para poder controlar este sentimento. Para fazer isto, poderá enviar uma mensagem eficaz, que se oponham as habituais mensagens, exigentes e prejudiciais, que provocam os sentimentos de raiva.
  1992. Uma mensagem que poderá achar particularmente eficaz é: “Devagar se vai ao longe, não se irrite”.
  1993. De início poderá achar necessário endereçar mensagens mais longas a fim de suspender as velhas mensagens, negativas e exigentes. Provavelmente praticou tanto a forma de pensar com raiva que poderá ser necessário, a princípio, conversar mais consigo mesmo para conseguir “largar” ou modificar essa forma de pensar.
  1994. Mensagens suplementares que ajudarão a melhorar a situação são aquelas que o colocam em contato com o seu egocentrismo e necessidade de controle. Pare de ser tão exigente. Por que é que tem que ser sempre como eu quero? Por que é que os outros não fazem o que eu quero? Continuará a sentir alguma perturbação (querer usar a TRE não faz calar os seus sentimentos), mas vai se sentir frustrado ao invés de sentir raiva.
  1995.  Inicialmente, aprender a controlar os seus sentimentos poderá ser difícil em relação a certas situações que o perturbaram no passado igual aqueles que envolveram problemas com o seu parceiro (a), os seus filhos ou no seu trabalho.
  1996. Devido aos seus sentimentos de raiva, geralmente intensos no decorrer das situações, terá que recorrer a um pequeno intervalo. Afastar-se da situação para que isso o ajude a alterar esse sentimento. Como parte desse intervalo, pode praticar exercícios de respiração profunda para ajudar a descontrair ou pode querer utilizar a técnica da imagem. Poderá por exemplo, imaginar que está
  1997.  
  1998.  
  1999.  
  2000.  
  2001.  
  2002.  
  2003. num local onde se sinta em paz e com tranquilidade. A descontração e a técnica da imagem podem ajudar a aprender a reduzir a sua agitação em situações associadas à raiva intensa.
  2004.  
  2005. RESUMINDO
  2006.  
  2007. Depois de termos reduzido ou modificado os nossos sentimentos de raiva aplicando a primeira parte do processo ABC, estamos agora em melhor posição para observar a situação de forma mais realista do que através dos óculos da raiva. Podemos reavaliar ou redefinir a situação. O que se passa realmente nessa situação? O passo seguinte dentro do processo ABC será fazermos a nós mesmos a grande pergunta: “O que posso fazer de eficaz nessas circunstâncias?”
  2008. É aqui que a Oração da Serenidade pode ser aplicada como um guia que nos auxilia: “Terei eu nessa situação que me esforçar para aceitar?” “Será o comportamento das outras pessoas?” “O que eu poderei fazer para modificar esta situação?” “Geralmente é só o meu comportamento.” Decidi o que poderia fazer de útil, em seguida terei que analisar as opções construtivas que irei escolher para realizar os objetivos da Oração da Serenidade. Finalmente fazer uma opção e coloca-la em prática.
  2009.  
  2010. CONTROLAR A NOSSA RAIVA – SETE BREVES PASSOS
  2011.  
  2012. Exige tempo e prática para aprender esse processo ABC de controle dos seus sentimentos de raiva, ao mesmo tempo em que “desaprende” os seus velhos comportamentos irados. A princípio irá achar que é útil trazer junto com você uma breve descrição do processo, como aquela que se segue. Com o tempo, aprenderá por intuição a ir de um passo para outro.
  2013. Comece pelos sentimentos que o perturbam. Os identifique. Use-os como sinais de “STOP”. Os sentimentos que o perturbam são sinais de que está dizendo a si coisas perturbadoras. Você poderá se tornar um melhor observador dos seus sentimentos. Isto equivale a entrar em contato com os seus sentimentos.
  2014. Neutralize os sentimentos que o perturbam endereçando a eles uma mensagem positiva. Coloque uma trava nos seus sentimentos. Diga para si mesmo: “Acalme-se, simplifique. Não fique tão nervoso.”
  2015. Identifique os pensamentos irritantes dentro da situação que estão te provocando raiva. O que você está exigindo? O que é que está tentando controlar? Examine os pensamentos que o perturbam. Pergunte a si mesmo: “Por que é que tem que ser como eu quero? Por que é que o outro tem que fazer o que eu quero?” E depois responda as perguntas.
  2016. Torne a situação clara para si próprio. Pergunte-se: “O que realmente me deixa com raiva? Em que consistem os fatos e quais são as minhas opiniões sobre eles? Haverá uma forma mais eficaz de encarar a situação? Pode então ficar desapontado com a situação, mas não com raiva contra as pessoas que a criaram.
  2017. Em seguida, estabeleça para si objetivos mais realistas em relação às circunstâncias que levantaram o problema. Pergunte a si próprio. O que posso fazer que seja eficaz a respeito desta situação? Seja específico e concreto. Aplique a Oração da Serenidade. O que posso mudar (o meu comportamento) e o que terei de aceitar (o comportamento dos outros) nesta situação?
  2018.  Faça uma lista das opções construtivas por meio das quais pode alcançar os seus objetivos. Pergunte-se: “Que ações construtivas pode empreender para atingir os meus objetivos?” Escolha uma opção construtiva para alcançar o seu objetivo e atue de acordo com ela. O resultado final do processo ABC é uma ação positiva da sua parte.
  2019.  
  2020. UM EXEMPLO
  2021.  
  2022. A situação consiste numa conversa com a minha mulher sobre as nossas finanças. Começamos na discordar e, depois, começamos a discutir.
  2023.  
  2024.  
  2025.  
  2026.  
  2027.  
  2028. Começo a detectar os primeiros sinais de raiva: estou a serrar os dentes.
  2029. Digo a mim mesmo,: “Acalme-se, não complique. Não fique tão zangado.”
  2030. Depois digo-me: “O que estou pensando? Ela não devia perguntar quanto é que eu ganho. Ela não devia brigar por causa das contas. Trabalho muito – devia poder gastar o dinheiro como bem entendesse. Ela não devia estar sempre contestando a forma como eu gasto o meu dinheiro. Tendo identificado alguns dos pensamentos que me perturbam, começo então a analisá-los: Por que é que ela não se preocuparia com o dinheiro? É ela quem paga as contas. Ela também trabalha e traz dinheiro para casa. Por que é que eu teria que gastar dinheiro só comigo mesmo? O restante da família também quer coisas. Pare de exigir que ela faça tudo como você quer. Pare de tentar controla-la.
  2031. Não gosto de algumas idéias da minha mulher, nem do seu tom de voz, mas estando mais calmo, consigo reexaminar a situação. Parece-me que temos mesmo alguns problemas com as nossas finanças. As contas parecem realmente estar aumentando. A minha mulher tem, de fato, algumas preocupações legítimas com as nossas finanças. Temos ambos, as responsabilidades neste ponto.
  2032. Pergunto então a mim mesmo: “Perante esta situação o que é que eu posso fazer que seja eficaz? O que posso mudar para que nos tornemos mais capazes de governar as nossas finanças de uma forma agradável para ambos?”
  2033. Faço uma lista de algumas opções que tenho:
  2034. - Combinar uma ocasião habitual durante a semana para falar sobre as nossas finanças.
  2035. - Estabelecer em conjunto algumas prioridades na forma de gastar o dinheiro.
  2036. - Combinar um novo orçamento familiar com a minha mulher.
  2037. - Rever regularmente esse orçamento e modificá-lo quando necessário.
  2038. Para começar, a minha mulher e eu acordamos numa ocasião regular todas as semanas., quando não estivermos cansados e não for provável sermos incomodados, para discutir os problemas do nosso orçamento.
  2039.  
  2040. USAR UM INVENTÁRIO PESSOAL PARA BATER OS RESULTADOS POSITIVOS
  2041.  
  2042. Controlar os sentimentos de raiva através do esquema ABC pode ser considerado como um inventário pessoal. No início, este inventário pessoal exigirá de si muito tempo e esforço. Começa com a utilização de um diário a fim de desenvolver uma maior conscientização das suas causas e consequências.
  2043. A partir deste diário, poderá aprender a identificar os sentimentos que o perturbam e estão na base da sua raiva.
  2044. Pode então prosseguir, praticando o processo ABC como meio de modificar os seus sentimentos de raiva ao modificar também a sua forma irada de pensar.
  2045. Segue-se a resolução dos problemas que fazem parte daquelas situações difíceis que o perturbam.
  2046. Com a prática continuada deste processo, chegará muito provavelmente à conclusão de que os seus esforços estão gradualmente a ser recompensados. Será mais capaz de controlar ou de modificar a sua raiva do que a sua raiva de controlar a si.
  2047.  Com a prática continuada do controle dos seus sentimentos de raiva pelo processo ABC, poderá eventualmente, reduzi-lo a um esquema mais simples de quatro passos.
  2048.  
  2049. Use os primeiros sinais de raiva como sinais de STOP.
  2050. Diga a si mesmo, acalme-se, simplifique. Não se zangue.
  2051. Pergunte-se: O que poderei fazer nestas circunstâncias, que seja útil?
  2052. Depois atue de acordo com as suas opções construtivas.
  2053.  
  2054.  
  2055.  
  2056.  
  2057.  
  2058.  
  2059.  
  2060. O processo ABC pode ser instrumento muito útil no processo de recuperação de problemas emocionais ou de problemas relacionados com o abuso do álcool ou outras drogas. O processo representa uma forma valiosa de enfrentar a perturbação emotiva que se encontra muitas vezes associada aos problemas ligados ao abuso do álcool e outras drogas ou com problemas emocionais. Se não aprender a lidar construtivamente com as perturbações emocionais, poderá estar em risco de uma recaída, já que as situações que envolvem problemas fazem parte inevitável da vida.
  2061. O processo ABC nos proporciona, pelo fato de não termos as nossas percepções obscurecidas pela desordem das emoções, uma maneira diferente de ver as coisas. O nosso sentimento a respeito das coisas modifica-se à medida que a nossa maneira de pensar a respeito delas se modifica – Sentimos como pensamos!
  2062.  
  2063.  
  2064. O QUE É ESPIRITUALIDADE?
  2065.  
  2066. Em relação aos Alcoólicos Anônimos ouvimos com frequência que “o nosso programa é um programa espiritual”. Mas o que significa “espiritual”?
  2067. Será uma palavra que se refere só a Deus, ou talvez a religião ou tenha um significado mais abrangente?
  2068. Muitas pessoas, ao se darem conta de que o Programa de Recuperação dos 12 Passos dos Alcoólicos Anônimos é um programa espiritual desanimam. Interrogam-se: “Será que tenho que me tornar religioso para poder me recuperar?” Este capítulo destina-se a ajudar as pessoas em recuperação a compreenderem o que significa a palavra “espiritual” e “espiritualidade”. Também se destina a ajudar os leitores a verem que a “espiritualidade” já faz parte das nossas vidas sem nos darmos conta disso.
  2069. No programa dos 12 Passos de AA a palavra “espiritual” aparece ligada à palavra “despertar”. Isto é o que acontece depois de termos feito o nosso caminho ao longo de todos os passos tivemos um despertar espiritual, o primeiro problema que aparece no Primeiro Passo: “Admitimos que somos impotentes perante nossa adicção e que tínhamos perdido o domínio sobre nossas vidas”.
  2070. Apesar de a primeira vista não parecer uma constatação de um problema espiritual, mas é na realidade!
  2071. Para podermos ver isso claramente, precisamos começar a desenvolver uma definição de espiritualidade com a qual trabalhar. Uma das maneiras de definí-la é constatando todas as áreas de vida as quais a espiritualidade se liga, assim espiritualidade é: A qualidade do nosso relacionamento com quem quer que seja de mais importante na nossa vida.
  2072. Esta simples definição pode nos ajudar a perceber como a espiritualidade faz parte da vida de qualquer pessoa. Consideramos o seguinte raciocínio. Todos nós temos pessoas ou coisas que são importantes para nós. Uma vez que temos estas relações importantes para nossas vidas alguma deve ser “a mais importante”. Que este “algo” seja maneira, ou pessoa ou grupo de pessoas, tem que existir alguma coisa que seja prioritária na nossa vida. O “quem” quer que seja ou o que quer que seja “mais importante” define o principal foco da nossa espiritualidade.
  2073.  Podemos dizer que a espiritualidade faz parte da condição humana. Assim como todos nós temos um lado físico e um lado emocional também temos um lado espiritual. Reconhecemos que somos pessoas com um lado espiritual. Abre-nos a possibilidade de descobrirmos o quanto este lado da nossa vida nos afeta. É um erro pensarmos que não temos um lado espiritual se não acreditarmos em Deus. Deus é apenas um dos muitos focos espirituais possíveis. Podemos vir a descobrir na nossa vida alguns focos e efeitos espirituais muito surpreendentes, se tivermos a coragem de explorar essa parte do nosso ser.
  2074. Uma vez que está relacionada com que (ou quem) é importante para nós; a espiritualidade está intimamente ligada a valores, prioridades, objetivos e preocupações. Tem a ver com o que quer
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  2081. que seja que está no centro da nossa vida. Gastamos muito do nosso tempo, energia, pensamentos e nos entregamos ao nosso foco ou centro espiritual, porque a espiritualidade tem a ver com relações que estão intimamente ligadas a coisas como amor, confiança e compromisso. Um resultado espiritual pode ser qualquer coisa que toque a nossa relação com os outros mais ou menos amorosos e desvelados.
  2082. Como se disse: há muitos focos espirituais possíveis. O foco da nossa espiritualidade podia ser o álcool ou outros químicos. Quando o álcool é o foco da nossa espiritualidade tem tendência para descrever o alcoolismo como uma doença espiritual. O alcoolismo pode ser descrito como uma expressão destrutiva da espiritualidade. Assim, uma maneira de descrever o problema do alcoólico, será dizer, “o álcool tornou-se demasiado importante”. Demasiado tempo e energia são absorvidos para beber. A relação tornou-se um fardo tremendamente destrutivo. Esta qualidade destrutiva cresce, e à medida que cresce, destrói o alcoólico.
  2083. O alcoolismo é descrito como uma doença progressiva. Nos termos da definição da espiritualidade isto implica que o álcool se torna mais importante à medida que a doença progride, e este crescimento tem muitas repercussões. Na nossa definição de espiritualidade, quando alguma coisa aumenta na sua importância, as outras coisas têm necessariamente que diminuir e ficar para trás. À medida que o álcool se torna mais importante, a nossa família, por exemplo, é necessariamente negligenciada por causa desta nova e poderosa relação. A família é apenas uma das muitas relações que é afetada pela importância crescente do álcool.
  2084. O trabalho será afetado. Ao invés de se devotar com energia e tempo inteiro ao trabalho, o alcoolismo é capaz de viver ou utilizar outras drogas durante o trabalho. Talvez, o fato de beber na noite anterior comece por afetar a sua capacidade de ser pontual e estar desperto durante o trabalho. Se o alcoólico for estudante, as festas, beber ou usar outras drogas, ou até vendê-las para ser financeiramente possível continuar a usá-las. Estas são apenas algumas das áreas da vida afetadas, à medida que o álcool se torna cada vez mais importante. À medida que o alcoolismo se torna crônico, cada vez mais relações de toda a espécie serão alteradas na vida do alcoólico. Sabemos que se a doença progride sem ser reconhecida, causará eventualmente enormes perdas em todas as áreas da vida e até a perda da própria vida.
  2085. Os membros da família do alcoólico podem facilmente se tornar vítimas de uma mudança da sua própria espiritualidade. Os valores, os objetivos e as relações dos membros da família são fatalmente afetados à medida que a doença do alcoolismo progride. À medida que o alcoólico se torna menos responsável, os membros da família podem focar cada vez mais energia na tentativa de o “endireitar” e fazer funcionar melhor. A sua mulher pode despejar as garrafas na tentativa de parar o excesso de bebida; os pais podem de um momento para o outro começar a discutir com a filha adolescente numa tentativa para que pare de usar; um adicto numa família perturba o equilíbrio familiar. Encontrar uma solução para este problema pode levar a uma grande perda de tempo e energia. À medida que os membros da família começam a se preocupar com o adicto, há outros aspectos das suas vidas que começam a sofrer com isso. Tentar lidar com o comportamento do adicto pode desviar a família de uma vida normal. A coisa mais importante na vida da família de um adicto pode tornar-se uma tentativa desesperada de controlar seu uso e comportamentos decorrentes disso. Essa preocupação em “endireitar” e controlar o adicto pode transformar-se num doloroso foco espiritual. Uma organização de apoio como os Programas de Familiares (Al-anon e Nar-anon) pode ser necessária para ajudar os membros da família a recuperar o equilíbrio e a serenidade.
  2086. A palavra espiritualidade tem na sua raiz a palavra “espírito”. Outra maneira de pensar em espiritualidade é nos perguntar onde se foca o espírito de cada um. “Espírito”, neste sentido, não fará nenhuma diferença, se o considerarmos como, por exemplo, o espírito de equipe num jogo de futebol. Um grupo de jogadores e expectadores poderá estar muito entusiasmado com a vitória de um jogo. Um craque pode incitar de modo a criar mais entusiasmo e espírito no grupo. O foco espiritual é energicamente dirigido para “ganhar o grande jogo”. Em outras áreas da espiritualidade
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  2093. encontramos espírito e entusiasmo como sendo o reflexo exato onde se centra a espiritualidade dessa pessoa. As coisas que na vida nos fazem brilhar os olhos e mexer por dentro estão intimamente ligadas à espiritualidade. Espiritualidade tem a ver com as coisas que são os grandes “amores” da nossa vida. Descobriremos que o nosso coração está fortemente ligado às áreas espirituais da vida.
  2094. O espírito e entusiasmo pela bebida é, as vezes, óbvio na vida de um alcoólico. O alcoolismo, quando começa, pode ser como um namoro. Para um alcoólico talvez nada se compare ao ato de beber às escondidas ou do adicto a usar. Pode ter passado a última hora de aula desejando ansiosamente a oportunidade de beber. Para outros alcoólicos esta relação pode ir crescendo muito lenta e gradualmente até que, só anos depois possa dar conta desta necessidade permanente de beber. O entusiasmo e espírito persistem muitas vezes mesmo quando, o relacionamento com o álcool se tornou destrutivo e a energia e o entusiasmo da pessoa em outras áreas da vida foram seriamente afetadas. No meu próprio trabalho com pessoas em recuperação lembro-me de inúmeros indivíduos dizendo, “Beber tornou-se a coisa mais importante da minha vida e isso aconteceu de tal maneira que nem me percebi. Chegou ao ponto de já não me dar nenhum prazer, apenas me ajudar a sentir bem neste momento, mas tinha que beber”. É este o ponto difícil em que uma pessoa está na verdade “agarrada” à bebida, mesmo, quando ele ou ela possam dar-se conta que beber já não funciona da mesma maneira. Contudo, está agarrada pela impotência, dependente da própria causa da sua destruição.
  2095. Mas, como é que começam a se desenvolver essas relações espirituais destrutivas tão poderosas? Como é que alguém pode se envolver numa relação como a acima descrita, que pode levar à morte, suicídio ou à loucura se não tiver ajuda?
  2096. As relações espirituais evoluem da maneira como uma pessoa vive a vida e como ela consegue lidar com as situações da sua própria vida. A nossa espiritualidade pode ter um foco consideravelmente diferente se tivermos tido um conjunto variado de experiências de vida. Ter o álcool e a droga como foco espiritual destrutivo na nossa vida, é o resultado da nossa experiência com o álcool e da capacidade com que ele tem de ir ao encontro de algumas das necessidades básicas humanas. Nem todas as pessoas reagem ao álcool e à droga da mesma maneira, e por isso nem todos desenvolvem o mesmo tipo de relação com ele. Quando uma pessoa começa a ligar-se ao álcool pode ser por aquilo que ele ou ela viram ou ouviram da experiência dos outros. Os amigos podem nos ter encorajado a beber. Eventualmente existe o momento em que a pessoa bebe pela primeira vez e essa foi a sua primeira experiência com o álcool. Dependendo dessa primeira experiência uma pessoa pode desenvolver um padrão de abuso do álcool e drogas, ou beber moderadamente com pouco entusiasmo. Se a experiência for muito negativa a pessoa pode nunca mais tornar a beber; se o interesse da pessoa pelo álcool aumenta é porque efetivamente, ele vai ao encontro de alguma necessidade. O famoso psicólogo Carl Jung descreveu uma vez o alcoolismo do fundador dos AA, Bill W., como uma “doença espiritual que tem na sua base o impulso para plenitude...” Sentir-se meio e completo é uma necessidade humana básica.
  2097. A maneira como o álcool vai ao encontro da nossa necessidade de nos sentirmos satisfeitos não é difícil de compreender. Se uma pessoa é naturalmente acanhada o álcool pode ajuda-la a tornar-se mais ousada e desinibida. Se uma pessoa está cheia de raiva e ressentimentos, o álcool pode ajuda-la a acalmar-se e encontrar alguma paz. Se uma pessoa está sem alento, deprimida, pode ir a um bar e “esquecer de tudo”. Uma pessoa pode beber porque gosta da imagem de quem bebe ou usa. À medida que a doença da adicção progride beber ou usar torna-se necessário para que se possa viver e sentir “normal”. Todos estes comportamentos são uma tentativa para encontrar ou manter a “plenitude”.
  2098. Outra necessidade básica humana é o relacionamento com os outros. Beber é uma atividade social. O álcool e outras drogas tendem a juntar pessoas. Olhando para trás podemos ver os amigos apenas como “amigos do uso” ou “amigo dos copos”, mas pelo menos havia uma espécie de “estarmos juntos”, de camaradagem. Beber era uma maneira de ter um contato pessoal e “passar um bom bocado” ao fazê-lo.
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  2104. O álcool e as drogas enganam as pessoas porque, até certo ponto, vão de encontro de necessidades humanas. Mas em longo prazo não o fazem da melhor maneira para o adicto. A busca espiritual que acaba na adicção pode ter começado por um simples desejo de ser feliz. Talvez ajude a entender a adicção como uma tentativa legítima de ser saudável e feliz. Ajuda-nos a evitar alguns julgamentos e críticas que possamos ter à tentação de usar contra nós ou outros adictos em recuperação.
  2105. Um olhar mais atento para algumas das palavras que são usadas para espiritualidade podem ajudar a aprofundar a compreensão desta palavra. Definir espiritualidade como qualquer coisa que tem a ver com o mais importante na nossa vida. Se alguma coisa é importante para nós isso significa que lhe damos valor e importância. O processo de dar valor a qualquer coisa chama-se valorização ou veneração. Quando veneramos alguma coisa estamos a falar de uma relação com o objetivo da adoração, do tipo da que temos com Deus. Por vezes no programa podemos ouvir alguém dizer “o álcool e as drogas tinham-se tornado meu deus”. Muitas vezes isto é uma constatação exata mesmo que nunca tenhamos pensado assim nesta relação. À medida que a doença do alcoolismo progride, podemos dizer que a relação com um deus que esquece o indivíduo. Esta relação já não é a solução perfeita porque já não vai de encontro às necessidades da pessoa.
  2106. Mesmo que insistamos que não queremos uma relação com Deus (com um D grande), assim como é impossível evitar a espiritualidade como um fato na nossa vida, também é impossível evitar relacionamentos do tipo do que se tem com (um) deus. Quer os reconhecemos claramente ou não, eles fazem parte da nossa vida. Afetam-nos.
  2107. Uma relação do tipo da que se tem com deus, tem uma relação interessante com a palavra “entusiasmo”, palavra essa que está ligada a espiritualidade. A palavra “entusiasmo” vem do grego “em-theos” que significa “em deus”. Outra maneira de vermos as coisas pelas quais temos um grande entusiasmo é dizermos que elas refletem a nossa compreensão e relação com o nosso deus.
  2108. Para o alcoólico cuja vida está sendo destruída. O desafio da recuperação é encontrar uma nova relação da do tipo que se tem com deus, um novo foco para a sua espiritualidade, um novo centro. Alguma coisa tem que substituir o álcool e as drogas como principal centro de interesse na vida de uma pessoa. Esta é a razão pela qual a recuperação não consiste apenas em não beber. Por a rolha na garrafa não quer dizer necessariamente que outra coisa qualquer se tornou nosso centro de interesse da vida de uma pessoa. Somente parar de beber sem outro crescimento e mudanças apenas frustrará uma pessoa que não aprendeu outro modo de ir ao encontro das necessidades humanas básicas.
  2109. A irmandade de AA encara o desafio de ajudar os alcoólicos a encontrarem um novo centro de interesse espiritual. A sua missão é muito parecida com a de ajudar alguém a saltar de um barco que se afunda para outro barco. Pode ser muito traiçoeiro. A missão envolve o conseguir ganhar a confiança e eventualmente o coração da pessoa. De algum modo, com a ajuda dos Doze Passos dos AA, com a irmandade das reuniões e, nas novas relações com gente sóbria, um alcoólico ou adicto em recuperação começará a entregar-se a um novo centro de interesse espiritual. A pessoa em recuperação procura ir de encontro às suas necessidades humanas de uma maneira completamente nova à medida que descobre o modo de vida de AA.
  2110.  O foco espiritual dos que estão em Anônimos, tem muito a ver com um “Poder Superior”; “Deus, como nós o compreendemos”, e as pessoas da irmandade. Os passos Dois e Três dos AA começam esta nova relação e iniciam o novo foco espiritual. Para o que quer que entreguemos a nossa vontade e a nossa vida, isso tem que necessariamente ser muito importante para nós. O Passo Três foi sabiamente deixado tão aberto quanto possível para que ninguém seja excluído. Embora a palavra Deus esteja escrita com D maiúsculo, no Passo Três, temos que entender que há alternativas de como este Passo pode ser abordado. Para aqueles que não compreendem a idéia de Deus no sentido tradicional, o Terceiro Passo, pode, por exemplo, ligar-se ao grupo básico de AA. Um grupo de pessoas é um poder maior do que nós mesmos, e podemos dar-lhe o poder divino de nos mostrar o que precisamos fazer. Poderemos ver que aceitarmos ser guiados pelas pessoas do programa pode
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  2116. ser melhor do que continuar o caminho que sabemos, que acabará na destruição. Outros recém-chegados ao programa podem falar de Deus atuando através do grupo. Podem dizer que Deus é um espírito de amor que se exprime pelo amparo, carinho e orientação que o grupo tem para oferecer. Haverá outros que acreditam nisso e também ligar-se a Deus por outros caminhos, tais como a oração e a leitura devotada. O Passo Três permite variedade e flexibilidade na maioria como os relacionamentos com um Poder Superior.
  2117. Quando as pessoas olham pela primeira vez para os passos Dois e Três, muitas vezes tomam uma de duas posições extremas. A primeira é rebelarem-se e dizerem que tal programa não é para elas. Os seus sentimentos podem ser traduzidos por este sentimento “não quero ser um fanático religioso! Não acredito nesta história de Deus”. A outra reação é ultrapassar rapidamente estes passos e dizer para si próprio: “Sempre acreditaram em deus. E depois?”
  2118. Nenhum destes dois extremos ajudará muito. A espiritualidade é uma área da vida em que precisamos descobrir muito sobre nós próprios. Não se pede a ninguém que acredite em alguma coisa em que não pode acreditar. Acreditar não é algo que se possa forçar. Acreditamos naquilo que acreditamos. Normalmente aquilo em que acreditamos resulta da nossa experiência. Do que sabemos da experiência dos outros e do que nos ensinaram. O segredo da mudança do foco espiritual é ter um espírito aberto, e nos permitir experimentar algo diferente – muito como fazer uma experiência com a nossa vida espiritual.
  2119. A maneira que temos de experimentar algo diferente na nossa vida espiritual provém da ajuda que as pessoas em recuperação oferecem. Não estamos sós, estamos com outras pessoas que trabalham na sua recuperação e que podem tornar-se amigos de verdade. A experiência de recuperação das pessoas na irmandade dá uma informação prática, preciosa sobre o que precisamos fazer de modo a vivermos uma vida sóbria e feliz. Dirão coisas como “vive um dia de cada vez”. Em outras palavras não queira ultrapassar e não se preocupe hoje com as coisas do amanhã. A força de hoje é a que precisa para os problemas de hoje, outra maneira que as pessoas na irmandade têm de se ajudar e confrontarem-se mutuamente com a realidade. Muitas vezes não conseguimos ver claramente como nos magoamos a nós mesmos com as nossas atitudes emocionais e com a maneira como pensamos nas coisas. Outras pessoas podem nos ajudar a resolver problemas e a esclarecer a nossa situação. Outra maneira simples de encontrar plenitude está na capacidade de falar com outra pessoa sobre como nos sentimos. Partilhar tem o efeito de “dividir o nosso fardo” e “duplicar as nossas alegrias”. Na partilha podemos encontrar alívio dos sentimentos negativos de desânimo, medo e raiva.
  2120. As pessoas no programa, quase sem exceção, farão igualmente parte da espiritualidade que descobrimos à medida que recuperamos. O que aprendemos com elas e o apoio emocional que nos podem dar são quase impossíveis de atingir numa experiência, qualquer, solitária. Um “slogan” popular no programa é “Eu preciso das pessoas como Eu”.
  2121. Vamos olhar agora para espiritualidade x religião.
  2122. Há muita confusão no que diz respeito a relação da espiritualidade e religião. Para complicar as coisas, as pessoas usam indiferentemente as palavras e, às vezes, com o mesmo significado.
  2123.  Melhor do que tentar definir o que é religião e o que é espiritual precisamos nos lembrar da nossa definição de espiritualidade. Quando dizemos “espiritualidade tem a ver com a qualidade da nossa relação com o que é mais importante na nossa vida”, não excluímos nada nem ninguém associado à religião como sendo um foco espiritual. Por exemplo, é muito possível ter como a coisa mais importante da nossa vida uma relação com Deus como numa tradição religiosa. A nossa definição de espiritualidade não inclui ou exclui necessariamente tudo aquilo que na nossa mente está associado à “religião”.
  2124. Um exemplo pode ajudar a clarificar a diferença entre ser aparentemente “religioso” e estar espiritualmente concentrado em outra coisa.
  2125. Imagine um jovem de 15 anos que se vê envolvido, sem o desejar e por insistência dos pais, na catequese da igreja local.
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  2131. Ele abusa quer do álcool, quer da maconha. Durante o intervalo das aulas, sai da igreja para “usar”. Neste caso, o que acha que será o foco espiritual deste jovem neste momento? Provavelmente são muito mais os químicos do que a sua instrução religiosa.
  2132. Como outro exemplo, imagine uma mulher jovem que trabalha e é muito devotada à sua igreja. Assiste regularmente aos serviços religiosos, participa de um grupo de senhoras ligado à igreja e reza todos os dias. Tem vários bons amigos na igreja com quem discute muitos aspectos da sua vida. Suponha que esta mulher está dando os primeiros passos no alcoolismo e é uma adicta ao álcool na sua casa, sem ninguém saber. O que podemos dizer da sua espiritualidade? Este exemplo não é tão direto quanto o primeiro. Pelo menos podemos suspeitar que esta mulher esteja com a espiritualidade dividida, mas também podemos prever que ela será arrastada cada vez mais para o foco espiritual que é o álcool, à medida que a doença progride.
  2133. A conclusão que podemos tirar de uma pessoa que aparentemente é religiosa e espiritualmente se concentra em outra coisa, pode muitas vezes ser descrita como hipocrisia. Aquilo em que a pessoa diz que acredita e aquilo que é revelado pelo seu comportamento não combina. Há falta de integridade. Muitas vezes aquilo que as pessoas detestam nas igrejas é exatamente a hipocrisia de alguns de seus membros. Aquilo que criticamos tão fortemente é a falta de espiritualidade autêntica.
  2134. Espiritualidade é uma palavra convidativa quando é bem compreendida. Convida-nos a descobrir nosso mundo de valores e aquilo em que acreditamos. Ao avaliar os nossos focos espirituais e ao vermos como nos ajudou a ir ao encontro de nossas necessidades, isso pode nos ajudar a abandonar relações espirituais destrutivas e a procurar relações em que um honesto e saudável ser, pode ser encontrado. À medida que mudamos o nosso foco espiritual, iremos necessariamente desenvolver um estilo de vida diferente porque o que é importante para nós mudou. Talvez pessoas e interesses que antes eram importantes deixem de o ser porque a relação destrutiva com o álcool terminou. Uma espiritualidade renovada conduzirá a uma sanidade restaurada. Além disso, a espiritualidade renovada mudará os princípios das nossas vidas porque fornece uma nova base para todas as decisões e relações. A espiritualidade tendo a ver com a qualidade da nossa relação com quem ou o que é mais importante nas nossas vidas – toma o seu lugar nos aspectos físicos e emocionais de um programa de recuperação como sendo o alicerce necessário para a construção de um novo modo de vida.
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