A notícia do incêndio lhe deixou estarrecido no meio do trabalho, mas na ocasião, Dominique não conseguiu ajudar ativamente no cuidado com os animais ou com o abrigo, já que estava no final da produção de sua próxima campanha. Apesar da grande quantia doada para ajudar a reerguer o lugar, sabia que dinheiro não era a solução de tudo. Por isso que, com o anúncio da feira, dessa vez não deixaria passar a oportunidade de ajudar de alguma forma.

Havia acordado com dor, mas aquilo não o impediu de cumprir com sua promessa. Ao longo daquele dia, quase não pensou na dor que sentia, havia se divertido em ajudar, em ver os bichinhos passando felizes com seus novos donos, talvez tivesse sido permissivo demais com as amostras das guloseimas? Sim. Mas ninguém havia dito que não podia fazer aquilo. Percebeu ali que não era bom com trabalhos manuais que não envolvessem desenho, corte e costura, porque amarrar as sacolinhas com os biscoitos amanteigados em forma de ossinho se transformou em uma tarefa verdadeiramente homérica, mas o francês não era alguém que desistia. Depois de pegar o jeito, ficou muito mais fácil fazer as pequenas trouxinhas para facilitar a venda.

Pesava tudo com cuidado, embalava com mais cuidado ainda, e assim sequer viu o dia passando, somente quando os organizadores passaram avisando que a feira já iria fechar. Tinha concluído sua missão, pensou, mas não sabia ainda que naquele dia a deusa da lua tinha outra missão para lhe dar. Após desmontar a barraca e ajudar a guardar o que havia sobrado, andou pelo local para ver se mais alguém precisava de ajuda, já que nem todos os animais haviam sido adotados ao longo do dia. E foi então que o viu em uma das gaiolas, os olhos mais brilhantes que já tinha visto em um animal em toda sua vida.

Se aproximou com cuidado para fazer um breve afago no gatinho, mas não podia se distrair por muito tempo porque ainda precisava limpar a área dos felinos antes dos animais serem levados de volta ao abrigo. E por alguns minutos, Dominique estava mesmo focado naquela tarefa, ignorando o miado insistente do bichano ou todas as suas tentativas de puxá-lo pela roupa com a patinha. Ele era o único gato que havia restado, foi o que notou, e naquele momento algo em seu coração dizia que ele não deveria ficar ali. Que maldade deixá-lo para trás, foi o que pensou.

Depois de um suspiro de pura derrota, abriu a gaiola e pegou o animal no colo, o deixando no bolso largo de seu avental para que pudesse terminar de limpar o lugar. De algum jeito, ele coube perfeitamente ali, por mais pesado que fosse. E de algum jeito, aquele pareceu o exato lugar onde o gato deveria estar. Agora lhe restava aprender a como cuidar de um animal com sua vida corrida e tão atarefada, porque deixá-lo abandonado em casa estava longe de ser uma opção. Mas aquele era um problema para o Dominique do futuro ter que lidar.