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RegulusOfLeo

USSR

Nov 23rd, 2018
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  1. Transcrição:
  2.  
  3. - Arquivo de um amigo de 1 Ano atrás
  4.  
  5. "Olá, xxxxx!
  6.  
  7. Finalmente encaminho respostas as questões:
  8.  
  9. 1. A URSS foi orquestrada, desde suas origens, a partir dos movimentos realizados pela Internacional Comunista. Ou seja, era parte da estratégia globalista que via no Império de Nicolau II um obstáculo à implantação do Império Global. A revolução bolchevique foi conduzida no contexto desse propósito e todos os seus planos originais atestam isso, como por exemplo os documentos que registram as necessidades de destruição da arquitetura da família burguesa, com a libertação das mulheres e a educação das crianças sendo dirigida totalmente pelo Estado. A este respeito, recomendo a obra de Wendy Goldman: Mulher, Estado e Revolução. Com isso, quero dizer que a revolução russa era antinacionalista e antirreligiosa, em sua essência, tendo sido arquitetada a partir das melhores mentes cosmopolitas europeias.
  10.  
  11. 2. Da mesma forma, as intenções globalistas foram sentidas na China através de Mao. O entendimento globalista era o de que tanto Rússia quanto China estavam num estágio de industrialização muito incipiente para o desenvolvimento de uma classe operária forte, que pudesse inspirar pela via democrática e cultural o socialismo universal. Era mais eficaz e seguro encarar o inimigo de frente e assumir a tarefa de gestar a transição do modelo de produção oriental do que permitir que a tecnologia de ponta da época acabasse caindo nas mãos do forte nacionalismo russo ou chinês. A respeito dos desafios impostos pelo modo de produção oriental e a consequente análise a partir da perspectiva ocidental, recomendo dar uma olhada nas obras de Karl August Wittfogel, Paul Lazarsfeld e Friedrich Pollock, todos teóricos da Escola de Frankfurt, que dedicou anos de estudo ao assunto.
  12.  
  13. 3. O projeto original para a Rússia envolvia dois pontos principais, quais sejam: a. A partir de sua situação quase feudal, desenvolver em tempo recorde as forças produtivas necessárias ao estabelecimento de uma classe trabalhadora urbana; b. Uma vez atingida a primeira meta, desenvolver a superestrutura cultural necessária para inspirar a revolução das classes trabalhadoras nos países capitalistas industrializados. Foi nesse intento que, após adoecer, Lênin escolheu Trotsky como Secretário Geral do Partido, com a finalidade de conduzir a “revolução permanente”. É complicado realizar suposições históricas mas, se Trotsky tivesse chegado ao poder, a URSS provavelmente se veria incluída na Liga das Nações ainda na década de 1920 e a história seria muito diferente. Mas como sabemos, não foi o que aconteceu.
  14.  
  15. 4. Stalin já tinha adquirido muito prestígio no Bureau e fez prosperar sua tese do “socialismo em um só país”. O grupo de Stalin divergiu do consenso globalista ao sustentar que o avanço do socialismo poderia ser mais rápido e o Império Global poderia se constituir ainda no século XX. Em vez de apostar no desenvolvimento econômico e cultural, Stalin e seu grupo convenceram setores globalistas de que: a. O tempo necessário à estratégia da revolução permanente era indefinido e a guerra cultural inútil, dada a primazia da estrutura econômica sobre a superestrutura cultural no pensamento de Marx. b. Uma vez pronta, a máquina bélica soviética seria imparável, dada a autonomia da ditadura do proletariado no controle dos recursos. Com a ideia de que o socialismo russo deveria ser rapidamente consolidado e em seguida exportado pela via das armas, esse grupo passou a entender a si mesmo como uma vanguarda do globalismo e acabou fora da Liga das Nações, vindo a integrá-la somente em 1934. Porém, isso só durou até 1939, quando a URSS invadiu a Finlândia e foi expulsa da Liga.
  16.  
  17. 5. Sem a URSS a Liga perdeu grande parte do sentido e eficácia de seu projeto original, levado à cabo com tanta dificuldade pelo Presidente Wilson. De fato, a fraqueza da liga atrasou o desenvolvimento do globalismo, especialmente se tivermos em conta os resultados do Tratado de Versailles, que foi o contrário ao pretendido por Stalin. A Rússia iniciou seu movimento expansionista e não teve recursos para a condução de grande parte dos ideais revolucionários de 1917, abandonando propostas importantes, como aquela referente à desarticulação da família, mencionada no tópico 1. Além disso, Stalin caçou e assassinou vários dissidentes, como o próprio Trotsky, com medo de que seu projeto “contrarrevolucionário” ganhasse apoio interno e internacional. Caía a Cortina de Ferro, que como você sabe, isolaria grande parte das comunicações entre as elites pensantes de ambos os lados do globo.
  18.  
  19. 6. O racha acima explicitado seria certamente explorado pelos cérebros que produziram Hitler, com múltiplas implicações. Para ser sincero com você, a guerra só não foi perdida por muito pouco. A vitória custou anos de desenvolvimento para a Europa, o estabelecimento do Estado de Israel em plena Palestina e a divisão binária de territórios cruciais à globalização. O clima de desconfiança se mostraria insuperável: com a morte de Stalin, em 1953, quem assume é Nikita Khrushchev, que denuncia os crimes de seu antecessor e começa a propor reformas, na intenção de atrair para o projeto nacional-bolchevista setores antiglobalistas derrotados nas últimas décadas. Falando diretamente, Khrushchev acena na direção da Igreja Ortodoxa e relaxa as regras do controle religioso. Mesmo com seu afastamento alguns anos depois, a URSS nunca mais conseguiria manter as igrejas fechadas.
  20.  
  21. 7. O que nos leva à KGB. Se, enquanto projeto de fundo essa organização respondia aos interesses globalistas à maneira de Stalin, internamente foi sendo contaminada por agentes fieis ao Patriarca de Moscou. Ao longo de décadas, a agência se estruturou em inúmeras camadas internas de desinformação e contra-informação, de modo que em certo momento nem mesmos seus Diretores sabiam se estavam no controle das operações. A KGB se converteu numa entidade nacionalista de tal forma que, durante a Perestroika, foi um dos pilares da preparação do terreno para a reconstrução do Império Russo e acabou desfrutando da honra de escolher um dos seus como Tsar. O apoio do globalismo à Perestroika se explica pela confiança no trabalho das empresas transnacionais e na revolução cultural que se daria nos anos seguintes ao desmonte da URSS. A atividade nacionalista no interior da KGB era conhecida no ocidente, mas a maior parte do globalismo não apostou na capacidade de reestruturação do Império Russo diante da abertura comercial, o que hoje só podemos julgar um equívoco.
  22.  
  23. 8. Diante disso, é importante lembrarmos o item b do ponto 3. Que atitude tomou o globalismo diante do fracasso da Rússia como estratégia contracultural para o ocidente? Inventou a Califórnia, por assim dizer. Diante das condições impostas pela Cortina, o ocidente teve de produzir sua própria contracultura. Isso significou um novo nexo para as artes plásticas, para o design e para a arquitetura mas, especialmente, para o rádio, o cinema e a televisão. Após a guerra, os EUA transportariam parte significativa da inteligência alemã sobrevivente e lhes concederia perdão. Na verdade, a inteligência alemã está por trás de quase tudo o que os EUA produziu de mais importante no campo técnico na segunda metade do século XX. Os ex-nazistas dominavam as técnicas de radiodifusão e propaganda, animação cinematográfica, engenharia de foguetes, entre tantas outras coisas. Quase tudo isso passaria às mãos judias e socialistas em território americano. É bem provável que você esteja ciente desse traço interessante da história. Hollywood viria a se tornar a principal ferramenta do poder superestrutural globalista e, hoje, o Vale do Silício dá continuidade a esta missão, apesar de não se resumir a ela.
  24.  
  25. 9. Mas o preço da produção contracultural nos EUA foi e ainda é alto: a organização do movimento Negro, LGBT, Feminista, etc, não pôde contar com a forte luta sindicalista proposta pela estratégia da revolução permanente. Ou seja, operar a contracultura a partir do ocidente envolveu abrir mão da velocidade das transformações de classe nos EUA. E é por isso que a esquerda ocidental é representada hoje pela elite transnacional, não pela classe trabalhadora. Sem o sistema de contrapeso oferecido por uma contracultura gerada no exterior, a própria estrutura do Estado norte-americano teria sido ameaçada, como aconteceu com os Estados de Bem-estar Social europeus. Num sistema mais comprometido com a classe trabalhadora, não sobraria dinheiro para a constituição de uma elite transnacional ultra rica e o imperialismo norte-americano não teria o poder que tem hoje. Um dos elementos bem claros do esgotamento dessa fase histórica se dá justamente no alto grau de organização atual da esquerda norte-americana, ao ponto de alguém como Sanders ter concorrido à presidência professando o socialismo abertamente.
  26.  
  27. 10. Sobra a questão de Cuba, China e Coreia do Norte. São casos bem diferentes. Diferentemente da Rússia e exceto por um ou outro percalço, a China vem cumprindo a agenda globalista à risca. Impossibilitada por motivos óbvios de ser uma forte referência cultural para o ocidente, a China avança paulatinamente no campo econômico e tornou-se o motor da última fase histórica do capitalismo, sem jamais abandonar o projeto comunista. Ao contrário, alguns traços importantes do modelo chinês são o protótipo do que será a primeira fase pós-capitalista do Império Global. Dentro de poucos anos você verá a economia chinesa integrar-se mais profundamente à economia global e, finalmente, quando estivermos prontos, a suspensão de nossas barreiras na internet. Quando isso acontecer, a situação econômica no ocidente já estará pressionando as massas a apoiar o modelo chinês, ao invés de execrá-lo. As massas vão pedir para ser prósperas como a China e isso será um dos fatores mais importantes no estabelecimento progressivo do comunismo global.
  28.  
  29. 11. Cuba é uma questão bastante peculiar. Não foi estabelecida nem pelo modelo da revolução permanente, nem pelo socialismo de um só país, que pressupõe expansão. Cuba foi produto da guerrilha marxista na América Latina e em termos políticos é algo único. De maneira geral, permaneceu desde a revolução na órbita stalinista e, agora, está divida entre a proposta de multipolaridade Russa e os compromissos regionais que assumiu desde a década de 1990 junto ao Forum Social Mundial. Nossa aposta é a de que, apesar dos vários erros cometidos no contexto das relações com a Venezuela, Cuba é um país católico e ocidental que se integrará muito facilmente ao ocidente após o fim derradeiro do regime castrista. Essa é a perspectiva da nova geração cubana, completamente indisposta em continuar a dar ouvidos para Putin.
  30.  
  31. 12. A Coreia do Norte é um regime de inspiração stalinista que se desviou até se tornar um caso quase sem solução. Sua questão é menos ideológica e mais a manutenção do poder. O regime norte-coreano se negou a seguir os passos da China e preferiu esconder-se atrás da Rússia. Sua proposta é perigosa, na medida em que coloca em risco duas cidades indispensáveis para a condução da estratégia globalista: Seul e Tóquio. Mais distante de uma traição do que o Irã, a Coreia do Norte pode ser a Servia do século XXI, o estopim da profetizada terceira e última guerra. Para piorar, Seul não deseja uma integração rápida, diz não ter condições de realizá-la. Trump esbraveja no Twitter, mas a verdade é que trata-se de teatro: temos aí o dedo do Tsar, manejando ambos os lados, a fim de provocar uma guerra antes do tempo. Essa era a finalidade ao tomar a decisão ousada de manipular algoritmos para eleger Trump. Como já comentei com você, a Rússia está procurando por esta guerra, enquanto acredita que ainda pode conseguir um empate. Se conseguíssemos segurar mais cinco ou dez anos, Moscou cairia sem grandes estragos. Mas ao seu lado a Rússia tem a Kaspersky, o WikiLeaks, o Snowden, o Breitbart e parte significativa da dark web, para falar apenas de tecnologia da informação. São ferramentas de desestabilização das relações internacionais que dificilmente podem ser neutralizadas.
  32.  
  33. Enfim. Espero ter contemplado o campo de inquirições e satisfeito algo da sua curiosidade. Espero também que você possa ter compreendido um pouco mais o que quero dizer com “realidades locais complexas”. Você perguntou por uma divisão na esquerda e posso lhe garantir que não há qualquer divisão dessa natureza. O que houve durante algumas décadas foi uma divisão no interior do globalismo, com forte preponderância ocidental. E hoje, o que existem são algumas forças que não são de esquerda mas às vezes se apresentam travestidas de esquerda.
  34.  
  35. Fico no aguardo dos seus comentários e da continuação do diálogo.
  36. Um abraço cordial,
  37. Marcos."
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