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- UPB — Pela tentativa de estabelecer uma teoria normativa libertária consistente e racional
- Uma das maiores dificuldades no ramo da metaética é estabelecer objetividade de algo intuitivamente tido como subjetivo: valores morais, certo, errado, bom e mal. Há certamente uma dificuldade em se entender o seguinte: como algo tão claramente fundado no contexto cultural e histórico do indivíduo pode assumir uma objetividade que se ergue imponente frente à tal cenário?
- É preciso dar dois passos para trás e entender algumas coisas antes que se possa tentar conjecturar a possibilidade dessa objetividade. O primeiro é a respeito da natureza das questões éticas. Dentro da metaética, existem diversas tradições que variam desde afirmações a respeito de uma ontologia das propriedades (no sentido amplo) morais como asserções capazes de conter valor verdade, dotadas portanto de um caráter ontológico similar ao de propriedades empíricas; surge aí a questão da distinção do campo normativo e do factual e mesmo se tal distinção é sequer válida. Note que eu omiti a palavra ética desse inicio de texto e fiz isso propositalmente, sendo este o primeiro tópico que quero explorar, julgado por mim como o mais basilar dos fundamentos para entender o UPB.
- Para compreender o UPB devidamente, é preciso estabelecer correlação entre os significados dos termos ética e moral. Dentro do sistema do UPB, esses termos são intercambiáveis, isto é, são sinônimos, são usados quase que completamente em contextos onde qualquer um dos dois termos seria adequado e, mais importante, ambos estão estabelecidos de forma objetiva. No UPB, tanto ética como moral tem a seguinte conotação: conjunto de regras/leis cuja implicação é de dever, isto é, cuja sua verificação dentro da metodologia estabelecida (dedicarei uma seção inteira para falar disso) implica numa vinculância nomológica e categórica. Em termos coloquiais, moral e ética significam conjuntos de leis objetivamente válidas (leis referentes ao quê? Veremos na seção desse artigo lidando com o UPB e suas ramificações). É importante comentar que um dos erros mais básicos que se pode cometer ao tentar interpretar o UPB é não realizar essa co-equivalência dos termos, estabelecendo assim uma divisão dos termos inadequada ao sistema sendo estudado e, portanto, prejudicando todo o seu entendimento do mesmo. É comum, seguindo esse erro metodológico no estudo desse sistema, então concluir que o UPB não está falando do que costumeiramente temos por ética e sim do que costumeiramente temos por moral. Aqui se faz necessário entender um outro conceito chave do UPB: estética. Este é o termo que se encaixa no que, no meio libertário, é tido costumeiramente como moral. Estética dentro do UPB refere-se a questões valorativas tanto individuais quanto comunitárias e na sua incapacidade de obter uma universalização dentro do método, o que automaticamente elimina-as de serem vinculantes e categóricas como as normas éticas do UPB o são. É evidente durante o processo explicitado no livro essa distinção e ela se faz essencial no processo de teste que estabelece uma norma neste sistema.
- O intuito desse artigo, acima de tudo, é trazer o UPB à tona para o cenário libertário brasileiro visando mostrar que no que tange à discussão ética, há uma outra fonte rica de conteúdo (muito dele implícito no texto, como veremos) além da dicotomia tradicional Hoppe e Rothbard. Inclusive, já que estes foram citados, é interessante estabelecer um paralelo prévio entre o UPB e essas duas metodologias da ética libertária. O UPB assemelha-se muito mais à ética hoppeana do que à ética rothbardiana mas é interessante estabelecer um ponto em comum do UPB com o jusnaturalismo rothbardiano: Tanto o UPB como o jusnaturalismo apresentam um componente de junção similar. Explico: O UPB estabelece sua metodologia formalmente, mas sempre pautada numa relação de correspondência com a realidade empírica, isto é, o UPB não extrapola situações inviáveis (fisicamente) na realidade empírica em sua metodologia; o jusnaturalismo rothbardiano compartilha dessa similaridade, ainda que timidamente, quando trata a relação vida, propriedade e liberdade. Aqui cabe um adendo importantíssimo: enquanto o jusnaturalismo sofre de uma desagradável condição de salto lógico em sua fundamentação ontológica, o UPB cumpre perfeitamente os requisitos do respeito à essa distinção lógica e ontológica: no UPB (após as alterações que fizermos por meio deste artigo), a normatividade é autonomamente restrita e formalmente presa à um método que não faz alusão à componentes empíricos, sendo a correlação mencionada anteriormente uma âncora metodológica no que tange à seu teor prático, assim permitindo que o UPB permaneça firme em sua fundamentação no quis diz respeito à manutenção de uma autonomia do seu aspecto formal e prático. Já a relação do UPB com o argumento hoppeano é bem mais “íntima”: Tanto o UPB quanto Hoppe estão preocupados em possibilitar uma justificação objetiva e lógica para os seus sistemas, ambos visando a consistência e conformidade com a racionalidade. Bem, enquanto em Hoppe temos um foco fundamental no aspecto transcendental da atividade argumentativa (e aqui cabe um adendo: estou me referindo à uma linha hoppeana interpretada e desenvolvida efetivamente como uma tentativa de reformulação desse approach ético), em Molyneux temos um foco no aspecto formal que uma lei universal deve ter. Ambos estão preocupados em o que, fundamentalmente, justifica uma posição ética qualquer mas, enquanto Hoppe foca no aspecto pragmático-transcendental da atividade de justificação proposicional, Molyneux foca no estabelecimento de uma metodologia formal e capaz de aderir racionalmente ao conteúdo de questões éticas. Esse foco no aspecto universalista, racional e metódico designam, tanto o argumento pragmático hoppeano como o argumento formalizado e sistemático de Molyneux, como teorias éticas jusracionalistas.
- Crucial para a compreensão do sistema do UPB é também a sua fundamentação no campo prático. Uma das grandes questões dessa metodologia é estabelecer se comportamentos preferíveis (e não preferidos, como muitos confundem e falaremos disso em seguida) universalmente são sequer possíveis dentro de uma situação prática. O livro trata disso em uma seção designada “Cinco Provas”. Irei avaliar cada uma delas em um outro artigo, desmitificar a sua relação tanto com a metodologia quanto com o termo UPB em sua mais ampla descrição: quando é descrito como um “termo guarda-chuva”, do qual a ética é somente um sub-grupo do que esse termo engloba. Também irei apontar erros cometidos pelo autor nessa seção que, apesar de serem dignos de explicitação e demonstração, não comprometem o sistema (e o porquê não comprometem).
- Como dito no início do artigo, precisávamos dar dois passos para trás antes de iniciarmos nossa jornada pelo sistema ético do canadense Stefan Molyneux. Demos o primeiro e, antes de tudo, daremos o segundo.
- Uma ética formal
- O UPB (Universally Preferable Behavior, traduzido como Comportamentos Universalmente Preferíveis) é um sistema que a principio parece ser fundado em um aspecto material e contingente da ação humana: as preferências. No entanto, há uma necessidade iminente de se especificar o que se quer dizer com o P de UPB e, mais importante ainda, clarificar o porquê nada disso envolve aspectos contingentes e sim aspectos formais desse sistema ético.
- Essa distinção começa com a clarificação de duas traduções possíveis do termo P: preferível ou preferido. O que seria um comportamento preferido? Seria um comportamento denotado empiricamente como executado por um agente, tendo o background da praxeologia para justificar que isso é uma preferência (afinal, como a praxeologia demonstra, o ser intencional usa meios para alcançar fins e sempre inserido na lógica de que seja lá o fim por ele escolhido — e o meio utilizado — este está demonstrando uma preferência por isto e também executando o que julga melhor contextualmente e subjetivamente). Um comportamento preferido vai desde um simples acenar da mão à uma escolha por ir para lugar x ao invés de y (z,w, etc). É efetivamente a ação (no sentido praxeológico i.e. intencional) exercida pelo agente autônomo. Lembrando: a praxeologia surge da necessidade de uma metodologia distinta para aspectos mentais (atitudes proposicionais, finalidades etc) e, efetivamente falando, o termo é usado para exemplificar o método seguido por Mises no estudo da economia.
- Dado esse entendimento do termo P do UPB, então certamente teríamos um sistema ético enviesado para aspectos materiais contingentes e que impossibilitariam uma metodologia de facto objetiva (id est, supervisionada conceitualmente). Mas longe disso, o termo P do UPB não se refere à essa tradução. O termo P é traduzido como preferível. Qual a distinção? Aqui voltamos novamente para a praxeologia: enquanto certos comportamentos preferidos podem ser facilmente denotados e catalogados (além de poderem ser estudados estatisticamente), a praxeologia lida com o aspecto formal dessas preferências; isto é, ela lida com o pressuposto estrutural para a possibilidade desse tipo de ação. É somente com esse background formal e a priori que você é capaz de estabelecer o que vem depois. É no dualismo metodológico misesiano que surge essa formalização das preferências e é estudando a ligação meios e fins (efetivamente garantido que a formalização não estabeleça possibilidades além do real) que somos capazes de estruturar formalmente preferências capazes de serem realizadas (em potencialidade) e aplicar isso para as mais diversas áreas do conhecimento. Iremos ver na seção depois da próxima que UPB é um termo que engloba não só a ética mas vários outros aspectos da agência (agência no sentido de autonomia) humana. É esse aspecto, totalmente em conformidade com a metodologia praxeológica de Mises, que nos interessa no nosso sistema ético.
- Stefan Molyneux deixa isso bem claro em um dos seus vídeos em que tenta esboçar um resumo da sua ética: no vídeo Ethics Redux, Molyneux corrige esse erro (inclusive mencionando que não havia deixado tão claro como deveria no livro) e trata em estabelecer que o UPB lida com a formalização e não com a quantificação/qualificação de preferências. Essa distinção é essencial para o decorrer do artigo, portanto é necessário que estabeleçamos isso com prontidão para que possamos efetivamente dissecar todos os aspectos internos da ética avaliada aqui neste artigo. Prossigamos.
- Uma ética análoga ao método científico
- Um dos aspectos mais importantes para um framework ético é a sua objetividade. Certamente é, intuitivamente falando, estranho falar de questões valorativas e normativas a respeito de conduta humana, i.e. o dever ser como um todo, sob uma ótica objetiva. Afinal, vemos em nosso cotidiano uma gama de divergências sobre o que é correto e o que não é, sobre o que é bom e o que não é e uma perspectiva intensa e essencialmente variada em tudo que envolve tais questões. Portanto, seria uma conclusão relativamente razoável assumir uma subjetividade intrínseca à tais questões e, sendo assim, adotarmos a típica posição não-cognitivista frente à tais questionamentos.
- Em sua essência, o reino do dever ser tem uma grande problemática a resolver e é importantíssimo elucidar razões que façam com que nos desprendamos das ideias tipicamente céticas sobre a objetividade do mesmo. Aqui, surge uma oportunidade de citarmos um trecho da autora Christine Korsgaard para elucidar o caminho pelo qual trilharemos para estabelecer um aspecto de objetividade no reino do dever ser:
- “[...]Kant pensa que, o princípio que nos diz que devemos nos comportar duma maneira nomológica (de caráter regrado) deve ser sintética a priori, se ética sequer for algo que exista.”
- Nesse trecho, que é uma introdução à uma edição da obra Fundamentações da Metafísica dos Costumes [1785], temos um insight que se mostra muito importante para o projeto do UPB. Vemos que o que precisamos estabelecer para fundamentar objetivamente nossa defesa ética é, não só estabelecer um caráter ordeiro que reflete o caráter nomológico das ciências naturais mas, justamente por estarmos num campo que trata de normas, mas também mantermo-nos ao aspecto formal de tal posição ética. Tal insight nos coloca no trilho para o aspecto que vamos analisar nessa seção: o aspecto análogo da ética para com o método científico. Comecemos com uma citação direto do UPB:
- “Se eu apresentar uma teoria científica que invalida completamente a habilidade de um jogador de basebol de pegar uma bola no ar, então eu tenho o desafio impossível de explicar como o jogador consegue, realmente, pegar a bola. Do mesmo jeito, se minha teoria não consegue precisamente prever o arco de uma bola no ar, então, eu tenho uma “grande verdade” que diretamente contradiz uma “pequena verdade,” que não pode ser válida. Uma vez que a necessidade de consistência lógica surge diretamente de “pequenas verdades” da experiência perceptual, qualquer teoria que diretamente contradiz tal experiência não pode ser válida.
- Em outras palavras, os sentidos fazem surgir a lógica — assim sendo, a lógica não pode contradizer as evidências dos sentidos.
- De uma maneira similar, qualquer teoria ética válida deve ser capaz de explicar e justificar nossa comum repulsa contra crimes como assassinato e estupro. Ela não pode contradizer as proibições universais da humanidade, mas deve precisamente incorporar e explicar elas.”
- Neste trecho do livro, temos uma ideia subjacente rondando nossa perspectiva tanto da ciência natural como da ciência moral (e lembremos da nossa terminologia intercambiável entre moral e ética). Tal ideia é de que nossa capacidade de formalizar aspectos subsumidos sob regras da realidade tem uma certa conexão direta com o que temos como evidência. A ideia de partirmos de common grounds e de presunções teóricas que fazem funcionalmente (e não de forma basilar desconexa, como um approach fundacionalista viria a ser) um papel de ponto de partida, nos dá um escopo sobre nossa teoria ética muito mais produtivo. Nesse aspecto, nossa teoria é científica. Pois ela parte funcionalmente de um enquadramento nomológico (que em várias óticas — porém não todas — assemelha-se à ideia de imperativo categórico kantiana) real. Nós não dissociamos nossas práticas tidas como comum do nosso sistema formal: em vez disso, englobamos tais características no nosso framework para estabelecer assim a sua correspondência com tais bases funcionais.
- Há ainda outro aspecto crucial dessa relação ser e dever ser: a relação pequena verdade e grande verdade no UPB. Construímos nosso conhecimento empírico sempre de uma base hipotética que fomenta na abstração (e no elemento sintético e formal em Kant) para assim podermos associar tais aspectos empíricos com uma necessidade. No UPB, o nosso método é deveras similar: Partimos dos common grounds, aplicamos o nosso método conceitual estabelecido (e analisado nas próximas seções) nestes e procedemos em estabelecer fundamentalmente quais normas são expelidas diretamente de uma metodologia objetiva e universal; normas estas, a saber, éticas.
- Analisemos este outro trecho:
- “Comportamento” existe na realidade objetiva, fora de nossas mentes — os conceitos de “deveria”, “deve” e “preferência” não existem fora de nossas mentes. No entanto, o fato que “deveria” não existe na realidade objetiva não significa que “deveria” é completamente subjetivo. Nem o método cientifico nem os números em si existem na realidade, no entanto, ciência e matemática permanecem disciplinas objetivas.”
- Este trecho, apesar de simples, nos apresenta outra ideia crucial do sistema do UPB: comportamentos enquanto empiricamente verificáveis e descritos, são efetivamente objetos da realidade material. Já o nosso framework formal (efetivamente o UPB na ética) que corresponde (ou seja, tem como alvo da sua concepção tal aspecto da realidade) à tal realidade, não existe e não é parte dela, não no mesmo aspecto que os comportamentos o são. Sabendo disto, notamos que o objetivo do UPB não é fluir através dos comportamentos e denotá-los dentro de um escopo sistemático; o objetivo do UPB é usar, criteriosamente os aspectos racionais conectados à nossa formalidade e, através destes, designar deveres impositivos (e aqui temos a similaridade com o imperativo categórico, onde o dever ser advém formalmente e despido de associação ao sujeito empírico) para os agentes. Tais deveres impositivos são, efetivamente, as normas e, como veremos, tais normas são efetivamente os direitos negativos que o libertarianismo em sua faceta anarco-capitalista tanto preza (inclusive com a mesma centralização do direito de propriedade como nas outras metodologias éticas associadas ao libertarianismo).
- Uma ética? UPB e suas sub-categorias
- O termo UPB certamente tem uma conotação direta com o que entendemos por ética porém é preciso elucidar as relações entre o termo e a ética. O termo UPB tem referência à duas coisas: ao aspecto intencional e que denota certa ação como efetivamente ação humana; e à consistência exigida das explicações frente ao método que a praxeologia denota formalmente. Vamos falar primeiro do aspecto intencional.
- Para contar como UPB, temos implicitamente a necessidade de uma relação entre um agente e um comportamento que foi preferido. Quando eu escolhi realizar a digitação deste artigo, eu efetivamente me coloquei, ainda que implicitamente, numa relação formal entre meus desejos e quai deles seria efetivado, isto é, qual deles serviria como causalmente relacionado ao que resultasse da minha ação. Apesar das barreiras linguísticas que vem dessa terminologia, principalmente com a antropomorfização de eventos que não envolvem nem intencionalidade nem agência ou mesmo exemplos dúbios, fica evidente um aspecto: a preferência está intimamente ligada à um estado intencional do agente. Ao realizar uma ação, partindo desse método, nós podemos estabelecer que, de forma subjetivamente determinada, o agente efetuou a preferência por tal ação. No livro, é possível encontrar esse tema recorrente quando Stefan Molyneux fala das provas do UPB. O que é mostrado nessas provas efetivamente a veracidade desse primeiro aspecto do UPB: o aspecto agencial e a relação entre tais fatos e o framework do UPB. É preciso explicar, no entanto, que aqui ainda não se caracteriza o aspecto de universalidade. Esse aspecto se dá quando colocamos, além do mero fato, um background de justificação racional. Quando avaliamos preferências sobre background, podemos avaliar e moldar tais aspectos factuais com o nosso framework. Outra explicação: aqui fica claro que o UPB não viola a chamada lei de Hume pois o aspecto de análise formal em questão se dá de forma puramente contingente para com os fatos. Sendo mais claro: O UPB é uma metodologia independente de exemplificações empíricas e, as suas relações com fatos, se dão contingentemente onde o UPB é aplicado sobre tais exemplificações. Esclarecido isso, vejamos o segundo aspecto.
- Como mencionei, a base de justificação racional é o que caracteriza a metodologia do UPB como de fato lógica/racional (termos usados aqui de forma abrangente). Como e quando podemos caracterizar escolhas/preferências como tal? Sempre que, frente à tal fato, possamos classificar um estado intencional frente à outro como uma “boa explicação” (boa aqui com uma conotação de eficiência explicativa) e que, dado o nosso objeto de relação (estético ou ético), possamos encaixar então numa das sete categorias das quais o UPB disponibiliza para avaliarmos as relações entre sujeitos (e aspectos que não envolvem relações mas que dizem respeito à questões estéticas no geral). As sete categorias em questão são:
- · Certo/bom* (universalmente preferível e exigível como lei, obrigatório em termos deônticos)
- · Esteticamente positivo (caracterizável como universalmente preferível frente ao segundo aspecto citado porém sem coerência para ser efetivado como lei ética e portanto, não-obrigatório em termos deônticos)
- · Pessoalmente positivo (não se enquadra numa justificação de universalidade e, portanto, incapaz de assumir a posição de lei)
- · Neutro (não se aplica ao contexto do UPB)
- · Pessoalmente negativo (mesmo que pessoalmente positivo porém envolvendo uma negação)
- · Esteticamente negativo (mesmo que esteticamente positivo porém envolvendo uma negação)
- · Errado/ruim* (mesmo que Certo/bom porém com a conotação de proscrição e portanto obrigatório)
- Vemos nessas sete categorias o englobamento de todas as possibilidades referente à análise de comportamentos em suas conotações estéticas e éticas. O UPB faz essa distinção estética e ética para estabelecer o limite entre o que é tido como lei e o que não pode subir à essa categoria. Efetivamente o UPB então serve não como um termo restrito à ética mas como um “termo guarda-chuva”, bem como Molyneux denota no livro:
- “No geral, nós usamos o termo estética para se referir a preferências não executáveis com violência — universais ou pessoais — enquanto ética ou moralidade se referem a preferências executáveis através de violência. É universalmente preferível (ou seja, obrigatório) usar método científico para validar teorias físicas, mas não podemos usar força para impor o método científico para aqueles que não o usam, uma vez que não usar o método científico não é uma ação violenta. Ações não violentas pela sua própria natureza são evitáveis. Se um físico parar de usar o método científico mas ao invés disso começar a usar cartas de tarô, ele não está violentamente impondo sua escolha em mim, e eu posso evitá-lo. Um estuprador, por outro lado, está violentamente impondo suas preferências sobre sua vítima.
- Embora nós primeiramente focamos o UPB no campo da ética, o UPB agora pode ser visto como um “termo guarda-chuva,” que inclui disciplinas como:
- · O método científico
- · Lógica
- · Empirismo
- · Debate
- · Linguagem
- · Ética
- Ética é o subconjunto do UPB que lida com comportamentos impostos, ou o uso da violência. Qualquer teoria que justifique ou negue o uso da violência é uma teoria moral, e está sujeita aos requisitos de consistência lógica e evidência empírica.”
- Podemos entender portanto que o UPB tem em cerne vários aspectos da ideia de comportamentos (e sempre lembrando que é o aspecto formal dos comportamentos, i.e. ação humana) e, em seu framework ético, se estabelece a junção dessa metodologia com a justificação racional para a exigência deôntica das normas expelidas pelo sistema UPB. Tratemos agora de um exemplo prático do UPB.
- *Vejamos aqui a intercambialidade dos termos certo e bom/errado e ruim devido à dissociação dessas terminologias do aspecto subjetivista que geralmente associamos com moral. Aqui, no UPB, os dois termos são usados com relação à eticidade, i.e. caracterização como lei, e são portanto intercambiáveis.
- Uma ética testada
- Um dos objetivos do UPB como um sistema basilar para a determinação de regras éticas é expelir normas compatíveis com os critérios usados que tenham em sua base o escopo da universalidade. O terceiro teste do livro é o teste a respeito do crime de roubo (lato sensu) e a imprescindível relação entre este e direitos de propriedade.
- A questão que o UPB suscita logo de cara com respeito à isso não é o método empiricamente determinável da obtenção de tais direitos, já que isto vai além das estipulações deste sistema (sendo este aspecto meramente esperado que siga em conformidade com o que for concebido por vias dos critérios); a questão é a universalidade ou não de tal proposta: a de existência ou não de direitos à propriedade. Um approach similar à Hoppe é tomado por Molyneux nessa parte do livro e, por vias do approach formalizado e pouco centrado em pragmática que eu busco neste artigo, acaba sendo necessário que descartemos tal approach para viabilizar a manutenção do UPB como um método autônomo no quis diz respeito ao reino do dever ser.
- Analisando bem o que foi proposto acima, nós claramente podemos conformar à universalidade direitos à propriedade e designar um ou mais critérios que possam estabelecer o link entre o objeto e o sujeito, sendo tais critérios empiricamente determináveis e com a necessidade de cumprirem conformidade à tudo que for pré-estabelecido previamente no sistema. No teste deste capítulo, temos uma análise mais voltada pra ideia lockeana de propriedade feita por Molyneux. Quando Molyneux relaciona as ações como uma extensão da personalidade do sujeito, ele claramente usa esse conceito lockeano de propriedade. É necessário mitigar esse approach, novamente, visando manter a formalidade do UPB. Isso não implica em deixar isso completamente de lado, mas isso categoriza um outro debate que pode evidenciar a possibilidade ou não de uma regra de propriedade absoluta ser ou não concebível e, se sim, suas consequências epistêmicas. É um debate em aberto que pretendo abordar para ampliar as consequências do UPB com as possíveis respostas dadas aqui.
- Voltando ao ponto inicial deste teste, através do UPB é possível estabelecer um exemplo de concepção para avaliar a universalidade da proposição ética desejada. Podemos suscitar o exemplo que Molyneux utiliza na sua formulação do teste de estupro para analisar que o fator consentimento, contingentemente um critério de conformidade ao direito estabelecido universalmente, provoca uma contradição na defesa da universalidade oposta: a de que todos tem o dever de cometer o ato de estuprar.
- Numa análise simplória, podemos estabelecer que a relação do Estado como empiricamente posto e, sendo assim, composto por indivíduos, faz uma diferenciação de sujeitos: enquanto agente do Estado, o sujeito está com exclusividade de direitos, violando a universalidade que permeia o UPB. Tal approach pode ser ampliado e discutido numa redução do caráter empírico do mesmo e buscando estabelecer a coerência do mesmo buscando sustentar uma hipótese de sua necessidade para o próprio dever ser. Outro tema e, semelhante ao discutido acima, é preciso ser ampliado e analisado tanto pragmaticamente como nos seus aspectos de concepção para que possamos visualizar o que isso implica na ética do UPB. A saber, tal ética evidentemente leva em sua forma a exclusão do conceito de Estado. Cabe aos críticos estabelecer o papel do mesmo nela, a possível compatibilidade do mesmo com ela e, a partir daí, termos um possível caminho à se trilhar para o debate desse aspecto (que certamente é central nessa ética).
- Uma ética conturbada
- Uma vez que dissecamos todo o sistema do UPB nos tópicos anteriores, agora entrarmos numa questão central e que discutirei de forma breve mas buscando suscitar duas linhas de debates que irão surgir a partir daqui e definir o futuro do UPB enquanto ética.
- A primeira linha é obviamente a linha de debate a respeito da questão do Estado nesta ética. Foi pincelada uma tentativa simplória de refutar o papel enquanto ente legítimo para este sistema mas, ao mesmo tempo, estabeleci que o Estado enquanto formal, isto é, enquanto uma concepção, tem a capacidade de se adequar à todo esse sistema e isso é algo que pretendo discutir no próximo artigo a respeito dessa tentativa de reformulação do UPB (que devidamente estabeleci em grounds kantianos).
- O outro aspecto que também irei discorrer à respeito no próximo artigo é como o UPB pode ser atacado enquanto uma oversimplification do viés kantiano sob o imperativo categórico e isso certamente é um risco para o projeto do UPB enquanto tentativa de estabelecer o anarcocapitalismo.
- A lição que tiro desse projeto é que a associação entre um sistema anárquico e uma ética deontológica é certamente difícil e requer imenso trabalho teórico para que se tente moldar um argumento eficaz nesse sentido. Os próximos artigos irão apontar possíveis falhas no UPB da forma que foi aqui estabelecido e se temos aqui finalmente uma ética anarcocapitalista defensável... Ou não.
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